02 de setembro, Dia Aldir Blanc; feriado do prefeito, sem querer querendo

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Mais um dia na coluna “A César o que é de Cícero”, do doutor em Literatura Cícero César Sotero Batista. Nesta data, César comemora um feriado meio malandro, mas lembra que hoje é aniversário do grande Aldir Blanc.

Não sei vocês, mas toda vez que leio um texto do César me dá vontade de beber uma cerveja geladinha. E foi o que eu fiz agora.




Bem que a Heineken poderia patrocinar este grande voyeur do cotidiano. Saúde César. abra uma aí também.

Salve Aldir Blanc!

“Caro Washington, hoje, dia dois de setembro, não haverá aula para a criançada que estuda nas escolas da Prefeitura do Rio de Janeiro. O prefeito deu um nome pomposo à data: Dia do Reencontro. E lascou um ponto facultativo, para a alegria geral de quem é professor e trabalha às sextas.

Para todos os efeitos, o decreto do Eduardo Paes tem como objetivo comemorar na cidade um ano do início da flexibilização das medidas restritivas adotadas por causa da pandemia de covid-19.

É certo que, nesta altura do campeonato, com professor já batendo pino, cheio das palpitações, um ponto facultativo dado não se olha os dentes. Aceita-se como a terceira margem, não do rio, mas do consignado (ou do consignado do Rio, para ser preciso e não perder a piada). As más línguas, sempre elas, entretanto, repararam que a data coincide com o retorno do Rock in Rio ao Rio de Janeiro!

Às vezes eu acho que tem gente que, sendo malandra demais, pode se atrapalhar. Mas tudo bem, quem sou eu no meio desse fuzuê todo? I wanna rock and roll all night!

Só que no dia dois de setembro celebra-se uma data importante: é o dia do nascimento do Aldir Blanc Mendes, do Aldir Blanc, letrista e cronista de muitos cariocas, senão de todos. Se Eduardo Paes nada disser sobre a data, perde uma boa oportunidade de ir ao encontro de seu suposto objetivo ao decretar o Dia do Reencontro.

Poderia ser um dia do carioca resgatar sua história homenageando justamente um compositor que tanto homenageou tantos dos nossos.

Estava certo, certíssimo, Dorival Caymmi quando disse que todo mundo era carioca, mas só Aldir Blanc era carioca mesmo. O Rio de Janeiro com que a gente sonha, meu caro Washington, ainda existe.

Soterrado pelos mandos e desmandos, por soberba, por submissão ao progresso, por deixar as coisas simplesmente ocorrerem como se tudo fosse fruto de uma topada e de um beliscão, pelas descaracterizações inclusive dos jeitos cariocas de ser. De Zé Cariocas para Zé Manés foi um pulo.


Aldir Blanc era uma enciclopédia musical. Sabia muito de música, como, aliás, todos da geração de ouro que, nascida na década de 1940, despontou ao longo das décadas de 1960 e 1970. Era para ele fazer os setenta e seis dele, pô!

Às vezes fico pensando no que diria se tivesse tido oportunidade de encontrá-lo pessoalmente. Será que ia me bater cacacagaganeira? Com certeza eu iria tentar levar a conversa para as crônicas, pois teria receio de não conhecer todas as canções que ele, Aldir Blanc, fez com tantos parceiros. Mencionaria a Vila Isabel, que é nosso chão comum, local ameno que se, a gente marcar, será um lugar a menos.

Seria bom conversar com ele sobre essas coisas que acontecem quando a gente entra em uma rua com sombra em Vila Isabel. Será que ele teria a mesma impressão que eu, que em alguns lugares da Vila o tempo já é de uma fotografia e só nos resta sentar no meio-fio e chorar um pouco antes ou depois do rebuçado e do Chicabon?

Talvez ele me chamasse, sem mais nem menos, de três-com-goma varapau, sem me dar chance de chamá-lo de Bidu, e me mandasse buscar uma meia dúzia no Bar da Maria, só pelo prazer de ter cerveja em casa, que ele mesmo não era mais de beber. Em tal aspecto, somos aliás parecidos. Causa-me grande alegria ver a geladeira cheia de cerveja.

Ainda tem a danada da Goiabeira Branca, mítica que nem ela. Eu também conheci uma em Maceió, ficava na casa do meu tio Antônio, irmão de meu pai. Só que na ocasião que a olhei para valer desinibido, mais ou menos como quando um homem olha para uma mulher como se a quisesse escanear todos os pormenores, eu não tinha levado livro nenhum. E subir em Goiabeira sem livro não era para mim.


Eu queria ter tido um tio que, enquanto me ensinava a pescar, cantasse antigas marchinhas de carnaval. Isso para mim é que é formação musical antes dos discos, antes de tudo. É quando a gente se pega assoviando aparentemente sem motivo nenhum.

Parodiando o mestre, mesmo que mal e porcamente, lá vem o poeta que todo mundo sabe que é meio maluco:

“E a gente vai anoitecendo na Tijuca…
Pra cada Centrão, sua tchuchuca….””

Sobre o autor

Radicado em Nilópolis, município do Rio de Janeiro, Cícero César Sotero Batista é doutor, mestre e especialista na área da literatura. É casado com Layla Warrak, com quem tem dois filhos, o Francisco e a Cecília, a quem se dedica em tempo integral e um pouco mais, se algum dos dois cair da/e cama.

Ou seja, Cícero César é professor, escritor e pai de dois, não exatamente nessa ordem. É autor do petisco Cartas para Francisco: uma cartografia dos afetos (Kazuá, 2019) e está preparando um livro sobre as letras e as crônicas que Aldir Blanc produziu na década de 1970.

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