Por Washington Luiz Araújo, jornalista –
Foto por Roberto Parizotti
O comentário de que “uma mão suja a outra” foi feito por um amigo a respeito da postagem que fiz no Facebook dando conta de que a EBC – Empresa Brasil de Comunicação, uma entidade pública, passará a comprar conteúdo da Rede Globo de Televisão. Ou seja, em vez de investir em conteúdo próprio passará a ter a Globo como fornecedora de uma mercadoria que já vem viciada pelo lucro fácil. Será uma mera repetidora da emissora dos Marinhos, como se precisássemos de mais. Mas isso não é tudo. Muito aconteceu de maio para cá nas relações do governo com as empresas de comunicação, quando Temer se aboletou na cadeira de presidente, sem voto, com golpe.
Houve um aumento considerável de dinheiro público federal nas inserções publicitárias veiculadas por essas empresas. Por outro lado, uma blindagem escandalosa passou a acontecer em relação às notícias sobre o governo Temer. Antes havia blindagem das mazelas da então oposição, que engendrou o golpe, enquanto a compra de um palito de fósforo por parte dos governos Lula e Dilma era considerada suspeita.
A lupa em cima de qualquer ação do Partido dos Trabalhadores e dos movimentos sociais continua sendo imensa, mas o chamado PIG – Partido da Imprensa Golpista fecha os olhos e não repercute, por exemplo, denúncia da Odebrecht de que o Ministro das Relações Exteriores, José Serra, teria recebido da empresa R$ 23 milhões, equivalente hoje a R$ 34,5 milhões, como caixa dois na Suíça.
É de se pensar como funcionam hoje as reuniões de pauta desses veículos de comunicação. Pelo tanto de notícia que deveria ser dada e é escamoteado têm-se a impressão que, primeiro, discute-se o que vai para o lixo e, depois, o que sobra é veiculado, entre os muitos anúncios governamentais.
Sim, de vez em quando publicam alguma coisa contrária aos muitos interesses do governo que aí está. Conteúdo apresentado, em alguns casos, para vender uma imagem de isenção, jogo de cena (sim, eles tentam esses estratagemas). Na maioria das vezes, contudo, essas matérias “contra” são levadas a público de passagem, num lugar escondidinho ou numa fala rápida e sem comentários, para não dar muito na cara. Se já o fazem de forma envergonhada, imaginem se farão repercussão dessa notícia. Nem pensar.
E é assim com as ocupações escolares, com a invasão da polícia de Alckmin à escola do Movimento dos Sem Terra, com o caso dos cinco jovens assassinados na periferia de São Paulo, encontrados com os corpos trucidados e evidências de que, antes de terem sido mortos, foram “esculachados”, como disse um deles numa mensagem eletrônica pelo celular a uma amiga. Pouco se falou igualmente sobre os atores que tiveram a peça interrompida violentamente pela polícia, em Santos, com a prisão de dois integrantes, pelo simples fato de as “otoridades” não terem gostado do enredo da encenação.
A PEC da Morte, a 241, que passou pela Câmara com este número e agora vai para o Senado como 55, é divulgada e debatida, Mas de uma forma enganosa, falaciosa, criminosa. Falam dela como se fosse a salvação da lavoura, quando, na verdade, ela é sua queimada total. O corte de investimentos por 20 anos em Saúde e Educação, entre outras áreas sociais, é “vendido” como redução de gastos e estratégia responsável. Escondem, igualmente, os motivos que levaram milhares de jovens a ocuparem escolas em todo o Brasil. Um dos motivos é a própria PEC e também a ameaça de retirada das disciplinas de Filosofia, Sociologia, Artes e Educação Físicas do currículo do Ensino Médio. Quando tocam no assunto é só demonizar a garotada.
Para continuar em Educação, a chamada velha mídia sempre torceu o nariz para o Enem. – Exame Nacional do Ensino Médio, por ser um recurso de inclusão das classes sociais mais carentes na universidade pública. Qualquer falha sempre foi imputada aos governos Lula e Dilma. Agora, com a constatação de fraudes, ninguém critica o Ministério da Educação pelo vazamento do gabarito antes das provas. E dá-lhe lavagem cerebral.
Uma filtragem é feita nas reuniões de pauta para não melindrar o governo golpista e também para não colocar nenhuma “minhoca” na cabeça dos consumidores de notícia. Assim, uma mão vai sujando a outra, como disse o amigo. E, com essa sujeira, o que vai para o ralo é o combate à desigualdade social, ao preconceito, ao racismo e a democracia.
PS: Depois deste texto pronto e postado no Facebook, recebemos o comentário abaixo da grande jornalista e guerreira pela democracia Rose Nogueira, sobre a compra de conteúdo da Globo pela EBC:
“Sem contar que acaba com uma fonte de emprego em todo o Brasil para jornalistas, radialistas, técnicos, artistas, cenógrafos, roteiristas, iluminadores, diretores, editores, sonoplastas… todos meus queridos colegas. Ai, que dor!
Perde-se em cultura, criatividade, qualidade artística, quanta coisa boa e importante que poderia ser produzida. E mais: a Informação é um dos Direitos do Homem. E a Informação Pública é um dos deveres do Estado e está assegurada na Constituição. É um dos Direitos do Cidadão.