Geral
Com o recente boom das cervejas especiais, artesanais ou importadas, e a maior difusão da cultura cervejeira, surgiu por aí um novo personagem: o cervochato, correspondente ao enochato, na área de vinhos, aquele capaz de ter sempre uma explicação ou comentário deslumbrado sobre os novos conhecimentos que adquire.
Conheço bem a figura, pois, logo que comecei a descobrir as maravilhas das bebidas produzidas com técnica e ingredientes de qualidade, quase me tornei um deles, apesar das boas intenções (e quem não, um dia?).
Lembro-me que, certa vez, fui num encontro de amigos levando algumas garrafas de cervejas artesanais e as coloquei na roda, não sem antes desfilar, orgulhoso, meus recentes conhecimentos sobre cevada, lúpulo, leveduras, estilos, com direito a dissertação sobre a história dessa bebida.
Eles me ouviram pacientemente, provaram o que ofereci com educado e discreto assentimento (e uma indisfarçável careta) e mudaram de assunto logo depois, não sem antes pedir ao garçom as suas tradicionais Bohemia, Skol e Brahma.
Foi uma boa lição, pois aprendi a guardar minha cervochatice para a plateia certa. Tudo tem seu tempo, lugar e necessidade, já dizia minha sábia avó.
O site americano Beer & Whiskey Brothers listou algumas dos mais recorrentes sintomas de cervochatice:
- Recusar uma cerveja caso ela não seja servida no copo correto.
- Somente degustar uma cerveja pela primeira vez sozinho e num quarto escuro.
- Não servir as cervejas que os seus amigos trazem e sim apenas aquelas da sua (superior) seleção.
- Corrigir o garçom, sempre.
- Achar que a trapista belga Chimay se tornou “popular demais” para o seu paladar superior.
- Não falar alemão mas fazer questão de mostrar que sabe pronunciar corretamente a palavra Reinheitsgebot (Lei da Pureza da Cerveja).
- Sugerir marcas e estilos de cerveja a outros clientes no supermercado, sem eles pedirem. E, pior, criticar os rótulos que estão nos carrinhos de compras deles.
- Numa festa, jamais beber cervejas “populares”.
- Acreditar que nenhuma outra pessoa bebe cerveja do jeito certo.
Mas tudo tem outro lado, felizmente. O cervochato, apesar dos pesares, tem o seu lugar e ajuda na difusão da cultura cervejeira, levando a consumidores ainda não “beerevangelizados” informações novas, úteis e que contribuam para apurar seu paladar.
É uma questão de equilíbrio ser um cervochato do bem ou do mal, pois, como se diz por aí, tudo que é demais, sobra. Ou entorna, no caso. Mas, ao final, o importante é respeitar a paciência dos amigos para não perdê-los.
wilson renato pereira jornalista/psicólogo/psicanalista e especialista em cerveja, sem ser chato