Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado –
Não cabe aqui discutir ou comentar o que aconteceu no Tribunal de Porto Alegre. O desfecho era óbvio desde sempre e a indignação ficará guardada igualmente para sempre. A Política, porém, exige o olhar para a frente, os próximos passos. Ranger os dentes ou chorar são maneiras legítimas e humanas de expressar revolta, mas não resolverão nem os problemas do ex-presidente Lula e nem os das esquerdas.
Para começar, não há tempo para perder com discussões estéreis tipo responsabilizar os advogados de Lula pelo resultado da farsa gaúcha. Nenhum jurista, por mais consagrado que seja, evitaria o jogo de cartas evidentemente marcadas. Ademais, Lula é maior de idade, conhece os caminhos e preferiu se cercar de defensores de sua cota pessoal de confiança. O jogo não trafegou e nem trafegará daqui para frente dentro do campo jurídico.
O que fazer, então? A pergunta de um velho revolucionário russo não tem resposta fácil e acabada. Seguramente, Lula e a direção do PT também não têm os caminhos claros. Mente quem disser deter a fórmula. E não vale também apelar para o discurso fácil, embora compreensível, da “desobediência civil”. Sejamos fraternalmente sinceros: se a insubordinação tivesse força, Dilma não teria sido vítima de golpe, Lula condenado e nem a criminosa reforma trabalhista estaria em vigor. Sim e lamentavelmente, eles passaram até agora.
É preciso deixar claro o grande drama que vive hoje o conjunto de forças democráticas que enxerga em Lula o direito de ser candidato. Para isso, é preciso ler com atenção a estratificação das últimas pesquisas eleitorais. O voto que sustenta a liderança do petista vem basicamente do conjunto de cidades nordestinas.
É no pequeno município da Bahia, do Ceará e dos outros Estados da região que vem a fidelidade, quase devoção a Lula. É a gente pobre, miserável, que sentiu em suas vidas os efeitos de políticas sociais inclusivas. Mas esse povo lamentavelmente não está organizado politicamente. É o lulista, não o petista. Existe uma talvez intransponível barreira para reuni-lo. É a maioria que não tem voz e nem asfalto para manifestações.
Onde existe asfalto e morro, Lula e o PT contam com a militância organizada, sindical ou não. Mas essa rua do Sul/Sudeste tem sido lamentavelmente pequena talvez. No dia da farsa de Porto Alegre, com exceção das magníficas jornadas dos adeptos engajados na capital gaúcha, onde mais, além de São Paulo, houve uma massa expressiva protestando contra a barbárie?
É possível falar em desobediência civil quando em uma cidade do porte e relevância do Rio de Janeiro apenas valorosos 400 combatentes participam de um ato de repúdio aos juízes das cartas marcadas? Sinceramente, não.
No ato da Praça da República, em SP. Lula fez um discurso magnífico, político sem se vitimizar, embora tivesse todos os motivos para tal. Mostrou que o Lula acuado não se entrega, apontou a sequência lógica da espiral fascista em curso e garantiu que resistirá. Desempenhou o papel de líder nato que é e continuará sendo em qualquer desdobramento do caso. E nós, o que faremos?
É preciso combater a visão de que quem reconhece a dificuldade atual é um derrotista. Não e não. Não vender fumaça ensacada como os gritos vazios de desobediência civil não significa ficar de braços cruzados. Se existissem as tais condições objetivas que os comunas falavam, quem nas esquerdas seria contra a insurreição contra um governo corrupto, criminoso no trato com a maioria pobre e que conta com o aval de um Judiciário que escancara sua opção de classe?
No momento, abandonar a luta pelo direito de liberdade e de candidatura do ex-presidente da República seria uma covardia, primeiro, e uma deslealdade com ele. Não é hora ainda de falar de plano B, C, apoio a outras postulações progressistas etc. Se lá na frente for necessário, que se faça naquele instante. Por ora, não.
E, se for possível, vale uma tentativa de construção de pontos em comum entre todas as forças democráticas para atuação na luta diária ou mesmo na eleitoral. Falar em candidatura alternativa agora será enterrar a tradição de luta das esquerdas. Está difícil sim, mas nunca foi fácil para nós. E sempre sobrevivemos.
Foto: Ricardo Stuckert