Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado –
A paralisação dos caminhoneiros, independentemente da discussão se foi locaute ou greve de trabalhadores, trouxe definitivamente à luz algo que já estava se insinuando em vastas áreas da população: existe sim, infelizmente para o campo progressista, penetração significativa do apelo pela volta do autoritarismo militar.
Não é possível aferir se essa espantosa constatação é majoritária entre os brasileiros, e o mais provável é que não seja mesmo. Mas não dá mais para ignorar que ela é forte. Não se trata mais daquele tiozinho maluco que era folclorizado por nós nas manifestações de rua da direita. Ou de bando de descelebrados que acampavam na frente da Fiesp pedindo o golpe militar. O movimento dos caminhoneiros expôs que a porta do hospício foi aberta e a clientela não é pequena.
É inútil argumentar que as faixas pedindo intervenção militar eram padronizadas, o que sugeriria que as manifestações não eram espontâneas. Sim, houve isso também, mas em pequena escala.
Quem acompanhou com atenção vídeos e textos jornalísticos pôde notar que a imensa maioria dos retratados acreditava mesmo na imbecilidade que balbuciava. Dois nortes “argumentativos” estavam presentes: “chega de políticos ladrões” e “só os militares conseguem pôr ordem na casa”.
A primeira frase denota a óbvia negação da Política, situação em que o fascismo, mostra a História, voa em céu de brigadeiro (com a permissão do trocadilho infâme). A segunda é uma evidente ignorância histórica, que infelizmente prova o desconhecimento de muitos brasileiros sobre o que foi de fato a ditadura militar imposta em 1964.
Uma razoável tentativa de explicação para a amnésia do horror da ditadura talvez resida na nossa Lei de Anistia. Ao contrário de alguns de nossos vizinhos, o Brasil não puniu os autores de atrocidades, sequer levou-os a julgamento. Perto do que ocorreu na Argentina, por exemplo, demos quase um atestado de boa conduta a assassinos. Enfim, o estrago está feito e é hora de lidar com a dificuldade presente.
Como as esquerdas podem enfrentar um cenário esquisito de ano eleitoral em que a direita convencional por enquanto não tem candidato e germinam as ideias de extrema direita? Em primeiro lugar, passou da hora de suspender a guerrilha entre adeptos de PT, ciristas e a turma do PSOL.
Embora as direções das três correntes estejam fora do tiroteio, instalou-se um clima de quase guerra entre as esquerdas, esquecendo-se de que o adversário está do outro lado do rio. Essa batalha canibal é tudo o que a direita espera enquanto se organiza em torno de alguma candidatura. PT, PDT, PSOL e PC do B têm visões diferentes sobre o que propor ao País, sim, mas a política contra os pobres e de entrega do Brasil a estrangeiros está no outro campo.
Diante do avanço do primitivismo, é mais urgente ainda que se perceba que nenhuma força de esquerda conseguirá sozinha eleger o próximo presidente da República. Mais ainda, talvez seja necessário um rearranjo, a ser feito pelas cúpulas partidárias ou no voto progressista em 7 de outubro, ainda no primeiro turno.
Lula, infelizmente, será abatido pela tapetão, a não ser que uma imensa mobilização popular, da qual não há sinal, desperte as ruas. E o ex-presidente, em termos eleitorais, é maior do que a soma de todo s os partidos progressistas. Sem Lula na urna, é preciso pensar mais em estratégia e em não fechar portas no campo popular.
A eleição que se aproxima será disputada em conjuntura muito pior do que as anteriores para a área progressista. O maior líder popular do País está encarcerado, os pobres sofrem uma chacina social, a ignorância rola solta e o tempo de campanha será menor.
Para superar essa e outras adversidades, não cabem arrogância, soberba e, cada vez fica mais claro, plantar para o futuro. Se a direita permanecer no poder, agora legitimada pelo voto, não haverá amanhã para a maioria pobre do Brasil. Dá para afastar os primitivos, mas as esquerdas têm que recorrer a uma palavrinha simples: juízo..
Foto de Foto Marcelo Pinto A Plateia