Por Flávio Leandro, cantor e compositor

No Portugal do século XIII, ofender um nobre custava 500 dinheiros ao infrator. Se tornasse a ofender, aí seriam “outros quinhentos”, uma expressão oportuna para este momento triste de nosso país. Numa democracia, mesmo em frangalhos como a nossa, o povo é a nobreza, e esta nobreza, todo santo dia, é ofendida por este governo da morte, seja falando a verdade, ou mentindo, seu passatempo favorito. E nós é que pagamos alto…muito alto. Acabamos de receber uma fatura lamentável, dolorosa: 500 milhares de vidas perdidas.

Para quem ainda não consegue enxergar o tamanho do estrago, imagine que Florianópolis tem 500 mil habitantes. Estamos riscando de nosso mapa, uma capital inteirinha.

Eu falo de números pra ver se sensibilizo esta gente insana, mas na minha cabeça só vejo sonhos, milhares de sonhos perdidos. E vejo dor, muita dor, nos sonhos de quem fica.

E sinto nojo dos falsos pastores jogando seus rebanhos neste calabouço, dos falsos médicos pregando seus diplomas no sangue destas paredes, dos falsos jornalistas dando socos no estômago da verdade, das mentes macabras implantando mentiras nos cérebros que passeiam descuidados pelas redes sociais. Sinto nojo deste ódio supremacista que brotou ferozmente neste solo de paz.

Sinto dó do meu país, das pessoas que perderam seus entes queridos, dos profissionais de saúde que agarrados à ciência doaram seus corpos a este sacrifício desumano, e salvaram, e salvam, muitas vidas…Sinto dó dos buchos cheios de fome, do São João, cheio de nada.

Queria estar abraçando meu povo neste mês junino, num palco bem bonito, vestido de chita e com uma espiga de milho gigante, ao centro. Um milhão, bem grande!

Mas enquanto ainda não é possível, vou digerindo este amargo meio milhão que macula tristemente o brilho de nossa história. E aí, vamos esperar, calados, mais “outros quinhentos”?