Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado –
Não é novidade, mas ganha corpo a articulação que tenta viabilizar a candidatura de Guilherme Boulos à Presidência da República em 2018, provavelmente em frente encabeçada pelo PSOL e aglutinando dissidentes de partidos de esquerda, incluindo-se aí uma parcela de por enquanto petistas ou ex-petistas. Para manter-se no terreno da correção, é necessário deixar claro que o próprio Boulos até agora em nenhum momento confirmou a pretensão, mas é evidente que a hipótese está colocada.
Óbvio que a ideia nasce, embora não unicamente, pela possibilidade real de a Justiça impedir a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Candidato fosse, o ex-presidente da República impediria qualquer sonho eleitoral de outras correntes de esquerda. O que importa aqui é discutir legitimidade e objetivos de uma possível candidatura do líder dos sem-teto.
É absolutamente legítimo que qualquer corrente das esquerdas lance candidaturas. E seria assim mesmo se Lula concorresse. Não existe uma única esquerda no mundo e o Brasil não seria exceção. E Boulos tem indiscutíveis compromissos com o campo popular, mantém-se firme na luta contra a perseguição da Justiça a Lula e combate sem trégua o governo Temer. Ponto.
A partir de agora, entraremos no campo da realidade e das intenções de parte dos que sonham com a candidatura de Boulos.
Existe um claro interesse de setores relevantes dos que reivindicam a tal “nova esquerda” de enterrar politicamente Lula. Acham, de maneira míope, que assim conseguirão herdar uma terra arrasada e a partir daí obter a inserção popular que é, sabemos, quase um monopólio de Lula, mais até do que do PT.
A eventual postulação dos que se reuniriam em torno de Boulos tem que dizer a que vem, se vier de fato. Não vale, por exemplo, chegar com historinha para boi dormir que aponte alguma viabilidade eleitoral nela. Não há. Nenhuma.
Basta lembrar a trajetória e o resultado eleitoral da respeitabilíssima Luiza Erundina no pleito paulistano de 2016. Querida no campo popular, chegou a inspirar um artigo vexatório, viu-se depois de conferidas as urnas, de blogueiro jornalista próximo ao PT que em determinado momento da campanha enxergou na concorrente do PSOL a possibilidade de chegar ao segundo turno. A brava Erundina, sabemos, terminou com os tradicionais 3% da ultra esquerda. Faltou, entre outras coisas, partido para sustentar na rua a biografia digna.
Boulos pode, pelo menos, travar o debate político com a direita troglodita de Bolsonaro ou alguma outra mais tradicional do ramo? Condições intelectuais, sim. Mas não terá a capilaridade e a militância que o petismo/lulismo ainda têm. Quem conhece um pouco de história eleitoral recente sabe que, se absolutamente tudo der certo, mas absolutamente tudo mesmo para a campanha da ultra, o aval não passará de 4% ou 5%. Fora isso, é ensacar fumaça.
Portanto, é claro que uma postulação como a que está sendo ensaiada só tem sentido se for para tentar apresentar ao eleitorado uma opção que quer refundar as bases da tal nova esquerda, até hoje pródiga apenas nas academias. E mesmo aí tem problemas, como o desafio impossível que é superar os obstáculos criados para o surgimento de forças progressistas, a começar pelo criminoso cerco de mídia e de dinheiro. Sem contar um certo paradoxo de setores que não nutrem respeito algum pela via institucional (com certa razão depois do golpe) apostarem fichas naquilo que desprezam.
Cheia de indefinições e insondável em parte, a eventual candidatura Boulos não desobriga, porém, até ao contrário, o PT, como corrente ainda hegemônica nas esquerdas, a tentar construir uma alternativa diante da quase certeza do tapetão contra Lula.
Uma candidatura do PT, qualquer que seja, tem que ser clara. Vai se aliar a setores que governaram com ele e depois o golpearam? A conciliação será o caminho apontado mais uma vez, pois afinal teria sido ela a porta que possibilitou a maior inclusão social da História?
Não, não é fácil a vida das esquerdas. Boulos tem o direito de disputar, se assim o quiser, mas alguns de seus apoiadores devem ser honestos e não esconder que querem, talvez principalmente, aniquilar o PT. E o partido de Lula tem também a obrigação, confirmada ou não a trapaça que tire o ex-presidente da urna, de ser claro na campanha e dizer que o que está no programa será cumprido no governo.
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