A “cordialidade” na transição democrática gerou uma força nefasta

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Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, Bem Blogado

Desgraçadamente, atestamos até hoje que aquela “saída conciliadora” da Lei da Anistia gerou um problema imenso para a Democracia no Brasil.




A decisão do presidente Lula de não incentivar atos de condenação pelo sexagésimo aniversário do golpe militar em 64 causou muita polêmica na esquerda. Aqui não vai se entrar diretamente no mérito da determinação do presidente da República, que é quem tem mais informações sobre o caso. Mas é preciso reconhecer a delicadeza da questão e ir atrás da origem do problema. Registre-se também que Lula não permitiu a louvação do golpe, como os militares fizeram nos últimos anos.

O Brasil, muito infelizmente, teve uma saída negociada da ditadura, diferente do que ocorreu em Argentina e Chile, principalmente no primeiro país. Lá, os milicos responsáveis pela barbaridade de 30 mil mortes de opositores foram condenados pela Justiça e muitos morreram de velhice no cárcere, caso, por exemplo, do sanguinário presidente general Jorge Rafael Vilela.

Aqui, criou-se, lá atrás, a “Lei da Anistia”, que equiparou vítimas do terrorismo de Estado com seus algozes. Torturadores infames e assassinos covardes saíram da ditadura livres e condecorados. Uma vergonha na História brasileira.

A “cordialidade” na transição democrática brasileira cobra o seu preço até hoje. Por exemplo, Bolsonaro e Milei, embora com alguns matizes diferentes, são essencialmente fascistas. No entanto, a punição aos milicos argentinos provocou um, pode-se dizer hoje, definitivo afastamento dos fardados da cena política.

Milei, embora tenha como vice uma filha de militar super reacionária, em nenhum momento da disputa contra o peronismo acenou com o fantasma dos quartéis, ao contrário do que “nossos” fascistas fizeram contra Lula.

A opinião pública argentina abomina a possibilidade.

No Brasil, criou-se até interpretação do famigerado artigo 142 da Constituição*, que no entender de velhacos fascistas do Direito permitiria que as Forças Armadas, em momentos de “crise”, se transformasse em “Poder Moderador”. Ou seja, os caras de pau acham até que é possível maquiar um golpe militar.

Desde a redemocratização, os milicos brasileiros, contaminados por um anticomunismo ignorante do  século passado, são tratados com desmesurada cortesia. Na reforma de Previdência, por exemplo, foram contemplados com privilégios indecentes enquanto os trabalhadores civis tiveram direitos ceifados.

Situações surreais, como o pagamento de vultosas  pensões vitalícias a falsas solteiras filhas de milicos, persistem, ao mesmo tempo em que trabalhadoras civis penam para receber o mínimo a que têm direito.

Na Política, o escárnio recente da intromissão em assuntos que não lhe dizem respeito atingiram o cume com os posts do general Villas Boas, o Papa do fascismo fardado, ameaçando o Supremo Tribunal Federal para que não permitisse a candidatura presidencial de Lula em 2018.

Sem contar, o tragicômico desfile de tanques que soltaram fumaça nas ruas de Brasília a troco de outra ameaça à Democracia durante o governo genocida.

A doutrinação de extrema-direita nas Forças Armadas brasileiras é fato velho e, na verdade, não se enxerga no horizonte nenhuma mudança. Chegamos ao ponto de um setor da grande mídia louvar o “legalismo” do ministro do Exército ao não embarcar no golpe articulado por Bolsonaro, como se cumprir a Constituição fosse qualidade e não obrigação.

Os que adulam o “legalismo” esquecem, servilmente, que o mesmo então ministro permitiu e até protegeu os milhares de fascistas que se concentraram durante semanas diante de instalações militares no País.

Os militares brasileiros têm páginas e páginas de desserviço ao País. Na pandemia, quem pode ignorar as centenas de milhares de mortes de compatriotas causadas pela ocupação tétrica do Ministério da Saúde por uma besta como o general Pazzuelo e outros estrelados muares? Que se pode esperar de uma “liderança” limítrofe como Augusto Heleno?

São esses elementos com mentalidade de 1920 que retratam o pensamento político das Forças Armadas.

Lula não é infalível e sua decisão sobre o 31 de março pode ser discutida, desde que com seriedade. Mas a questão de fundo não é essa.

Desgraçadamente, atestamos até hoje que aquela “saída conciliadora” da Lei da Anistia gerou um problema imenso para a Democracia no Brasil. Ao garantir a não punição para torturadores e assassinos, asseguramos, infelizmente, uma espécie de habeas-corpus para que imbecis continuem atuando como imbecis.

*Logo depois de Carlos Eduardo alves enviar este texto para o Bem Blogado, o STF formou maioria contra o reivindicado “poder moderador” dos militares.

Veja:

https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2024-04/stf-tem-maioria-de-votos-contra-poder-moderador-das-forcas-armadas

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