Seria melhor se nossos diligentes bilionários abandonassem o conceito do aluno como mão-de-obra formada em linhas de montagem
Por Luis Nassif, compartilhado de seu Blog
No discurso de posse de Luís Roberto Barroso, na presidência do Supremo Tribunal Federal, o decano Gilmar Mendes lembrou um episódio histórico.
A derrota de Napoleão em Waterloo se deveu à atuação do seu general Grouchy, analisada em livro de Stephen Zweig. Grouchy se atrasou indo atrás de tropas polonesas e deixou Napoleão desguarnecido, ante a investida do duque de Wellington, apoiado em tropas mais numerosas.
Gilmar anotou que, em plena guerra contra o golpismo de Bolsonaro, as instituições se perdem em disputas secundárias, enfraquecendo a grande frente da democracia. Provavelmente se referia ao papel do Senado, e de seu presidente Rodrigo Pacheco, criando um conflito desnecessário com o Supremo em torno do “marco temporal” das terras indígenas.
De fato, enquanto Lula não conseguir formular um discurso interno eficiente, um projeto de país inclusivo, não conseguirá transformar em resultados políticos a ampla frente em defesa da democracia.
Aliás, é inacreditável como existem generais Grochys em todas as frentes. Ainda não se entendeu que o que salvou o país do golpe Bolsonaro-militares foi a descentralização federativa, foi o fato das universidades, a educação, as prefeituras e governos de Estado terem conseguido fazer contrapontos ao avanço bolsonaro-militar.
Digo isso a respeito da ONG criada por bilionários – o polêmico Jorge Paulo Lemann à frente – para “ajudar” o Ministério da Educação e Cultura a administrar R$ 10 bilhões destinados à digitalização das escolas. A meta é disponibilizar 2 gb diários por aluno. Tudo isso sem um projeto pedagógico.
A intenção é claramente ideológica: acabar com a orientação dos professores e uniformizar o ensino de acordo com um cérebro central em Brasília. Aliás, a mesma estratégia negocial-ideológica do Secretário da Educação de São Paulo.
Ora, projeto pedagógico adequado não é apenas colocar o Google à disposição das crianças, mas ensinar maneiras de raciocinar e de usar as informações. É hora de abandonar essa ideia do ganho de escala na educação, se a intenção não for meramente ideológica.
Um projeto pedagógico consistente deveria prever:
1. Educação digital: ensinando os alunos sobre os perigos da Internet e como se proteger. Isso inclui orientações sobre como identificar conteúdo inadequado, como verificar a veracidade das informações e como lidar com situações de cyberbullying.
2. Filtros de conteúdo: Esses filtros podem ser configurados para bloquear sites com conteúdo pornográfico, violento ou ofensivo, garantindo um ambiente mais seguro para os estudantes.
3. Políticas de segurança: É necessário estabelecer políticas de segurança claras nas escolas, que abordem o uso responsável da Internet e estabeleçam diretrizes para a proteção dos alunos. Isso pode incluir restrições ao uso de dispositivos pessoais durante as aulas, regras sobre o compartilhamento de informações pessoais e ações a serem tomadas em caso de incidentes de cyberbullying.
4. Promoção da literacia digital: ou seja, desenvolver habilidades para usar a tecnologia de forma segura e eficaz. Isso inclui ensinar os alunos a avaliar criticamente as informações encontradas online, a proteger sua privacidade e a utilizar ferramentas de segurança, como senhas fortes e autenticação de dois fatores.
5. Parceria com os pais: as escolas devem fornecer orientações aos pais sobre como proteger seus filhos online, como monitorar o uso da Internet e como identificar sinais de problemas, como vício em tecnologia ou cyberbullying.
6. Apoio psicológico: é importante oferecer apoio psicológico aos alunos que enfrentam situações de cyberbullying ou que desenvolvem vício em tecnologia. Isso pode incluir a disponibilidade de profissionais de saúde mental nas escolas e a promoção de programas de conscientização sobre saúde mental e bem-estar.
Não se trata apenas disso. Imagine-se se Bolsonaro tivesse um sistema educacional centralizado, como pretendem os nossos brilhantes bilionários.
Decisões centralizadas – especialmente na educação – sempre levam a grandes desastres. Aliás, o próprio Ellon Musk, que tentou montar uma fábrica sem operários, percebeu que não poderia dispensar o elemento humano. O que não dizer do mais humano dos trabalhos, que é a educação? Na gestão Temer, conseguiu se matar um projeto moderno – o de trrabalhar a educação de forma integrada entre as matérias – devido à falta de capacidade de gestão do Ministério da Educação e de Maria Helena Guimarães – pretendendo enfiar modelos fechados garganta abaixo dos professores.
Aliás, o movimento de Lemann tem todos os indicativos de um pacto com Ellon Musk, o empresário mais rico do planeta. Uma Internet nas condições previstas por Lemann só poderia ser atendida pelo sistema de satélites do trilionário.
Seria mais confortável para o país se nossos diligentes bilionários abandonassem o conceito do aluno como mão-de-obra formada em linhas de montagem e se cercasse minimamente de bons pedagogos para dar uma utilidade real à sua atuação.