A dualidade em Pelé, meu herói, aos 80 anos

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Por Anselmo Ferreira, jornalista
E Pelé disse: “love, love, love”, cantou Caetano Veloso. Mas, nem sempre a vida de Pelé foi só de paz e amor, especialmente, neste momento em que o vemos envelhecido e em cadeira de rodas.
Pelé nasceu negro, cresceu pobre e sem estudos. Essas três características somadas já seriam suficientes para que uma parcela de brasileiros preconceituosos, torçam contra o Pelé atleta, um dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos no mundo e contra o Pelé gente, o Edson Arantes
do Nascimento.
Insira-se nessa ira, a paixão que muitos brasileiros têm pelo próprio clube como torcedores e o espírito de competição fomentado na mídia, onde cada
qual acha o seu time o melhor, combinando com o fato desta mesma mídia decidir chama-lo de Rei e o fazer sustentar esse “título” pela sua vida afora.
Deste modo, essa mesma imprensa que assiste o Pelé atleta, do Santos FC e da
Seleção Brasileira, a prosperar e ganhar cada vez mais notoriedade, começa a
explorar o Pelé gente e as suas idiossincrasias intuindo-o a portar-se como um rei também no intelectual e a discorrer sobre temas, como a política e a sociedade brasileira.
Aí, então, o Pelé gente e o Pelé atleta indissociável, tenta explicar o que ele não sabe, pois é uma pessoa simples de conhecimento voltado às suas chuteiras e é achincalhado e destratado por esta mesma mídia.
O seu “entende”, que ele aplica na sua linguagem, torna-se uma piada em programas de humor e sua trajetória como atleta – ganhador de três mundiais
de futebol pela seleção e dois pelo Santos -, é ignorada e esquecem ser ele um exemplo de sucesso para tantos outros jovens pobres, vindos depois, como forma de incentivar as demais gerações de jogadores e jogadoras.
Também acho lamentável o Pelé gente não ter reconhecido a sua filha. Mas, o “pisar na bola”, acontece na vida de todos. Certamente ele deve ter se arrependido disso.
Quando criança pobre que fui, tomei contato com ele pelo rádio e jornais da época, como a Gazeta Esportiva, que meu pai corintiano, levava para casa.
Logo, o time do Santos me despertaria emoções inesquecíveis até hoje. Lembro
até do dia do milésimo gol e quando ele se referiu às crianças pobres brasileiras. Se o seu discurso foi ensaiado ou não, me tocou naquele momento, porque eu tinha sido uma delas sem eira e nem beira e estava chegando na adolescência
Parabéns Pelé atleta, meu herói, que a vida continue a contemplar a sua história única que criou e que é respeitada em todo o mundo.
Ao Pelé gente, que seus 80 anos sejam de paz e harmonia e de reconciliação consigo próprio, afinal, ninguém é rei de nada e a travessia da vida nos impõem abdicar de cetro e coroa e tomar
contato com a humildade, a realidade e as novas narrativas impostas pela existência de cada um. Bola para frente.
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