A intensificação surpreendente de manchas solares

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Por Ulisses Capozzoli, jornalista

Perto de atingir a intensidade máxima de explosões, em um período médio de 11 anos, desta vez com pico em 2024/2025, o Sol está extremamente ativo sem que se saiba a razão desse comportamento. A imagem composta mostra as manchas escuras na superfície solar, associadas às explosões ao longo dos últimos seis meses, com maior concentração em junho.




Observações históricas evidenciam que, à medida que o ciclo médio de explosões se aproxima da máxima intensidade, ocorre um deslocamento das manchas para o equador solar. Essas explosões estão intimamente associadas a poderosos campos magnéticos que atravessam o corpo solar e temporariamente inibem movimentos internos de ascensão/liberação de radiação/partículas de altas energias.

Na superfície do Sol esses bloqueios temporários formam pontos escuros com temperaturas mais baixas que seus entornos. Essas formações estão associadas ao que astrofísicos chamam de “ejeção de massa coronal”, enormes erupções de gás ionizado (carregado eletricamente) que se desprendem e voltam a mergulhar no corpo gasoso do Sol numa fascinante acrobacia estelar. Parte desse material forma o “vento solar”, no caso do Sol e “vento estelar”, em relação ao processo que ocorre em outras estrelas.

Na Terra, o vento solar é responsável pelas auroras polares. A aurora boreal, no norte, é mais conhecida por ser observada de localidades de ocupação humana mais próximas do polo magnético norte, mas também se manifesta junto ao polo magnético sul, na borda oriental da Antártida, com menor número de observadores potenciais.

À primeira vista, pode parecer um mecanismo complexo, mas na realidade é ainda mais fascinante se for levado em conta o papel desempenhado pelo campo magnético na Terra na interação com essas rajadas de altas energias que chegam do Sol, a 8 minutos luz de distância. A questão, neste caso, está relacionada ao fato de a Terra dispor de um núcleo metálico em movimento que funciona como um dínamo e produz um campo magnético.

E é essa estrutura que desvia a radiação para os polos, impedindo que atinjam diretamente o corpo da Terra. Períodos de atividade solar mais intensos podem danificar satélites em órbita, ameaçar astronautas no interior de naves/estações espaciais e mesmo derrubar redes de transmissão de energia em áreas mais afetadas.

Uma das implicações dessa sofisticada interação é a manutenção de uma atmosfera, sem o que a Terra, o único oásis de vida que conhecemos no céu, seria um corpo inerte, sem condições de abrigar a vida, além de inviabilizar a camada superficial de água líquida de rios, lagos e oceanos, que observados do espaço, faz a Terra parecer um fascinante e azulado aquário esférico que o primeiro astronauta, Yuri Gagarin descreveu emocionado de seu vôo pioneiro, em 1961: A Terra é azul”.

Para produzir um campo magnético, no entanto, a Terra deve estar geologicamente viva e algumas das consequências dessa condição são os sismos (tremores de terra) e atividade vulcânica produzidos por atividade geológica. Há quem defenda a ideia, em meio à comunidade científica, de que uma morte geológica em Marte desativou seu campo magnético e fez com que o vento solar varresse sua atmosfera como uma vassoura poderosa, que também teria secado seus mares, lagos e rios.

Recentemente foi detectada alguma atividade geológica marciana e a compreensão mais clara do que pode ter ocorrido lá ainda está longe de completa. De qualquer maneira, toda vez que ouvir um fanático religioso dizer que sismos e vulcanismos, que provocam destruição e morte, são um castigo divino por uma suposta arrogância humana saiba que se trata de uma completa falácia: apenas uma tentativa de reduzir a capacidade de reflexão humana para a complexidade/compreensão e sofisticação da vida que, como tudo no Cosmos, é um fluir, um processo interminável de transformação.

Se vivermos em um universo “bouncing” como pensa parte da comunidade cosmológica, o próprio universo se expande/contrai e torna a expandir e a se contrair em um movimento eterno e não temporário como propõe a versão mais simplificada do “Big Bang”, a explosão que teria dado origem ao Cosmos.

Já em 1613 Galileu registrou manchas solares e defendeu a ideia de que elas se deslocavam pela superfície solar como é possível, eventualmente, confirmar em fins de tarde e início de manhãs, com o sol baixo no horizonte, o que permite uma observação a olho nu (de qualquer forma, não tente de maneira alguma fazer essa experiência sob pena de queima da retina e consequente cegueira). O relato de Galileu foi mais um golpe na cosmologia aristotélica adotado pela igreja cristã que a assumiu e produziu horrores como a Inquisição, com práticas bárbaras de torturas contra os que não partilhavam dessa cosmovisão.

Um última consideração em relação a fenômenos que ocorrem em circunstâncias inacessíveis a olhos humanos, como o coração do Sol. Manchas solares tem sido relacionadas a efeitos climáticos (ausência de manchas podem estar relacionadas a uma variação para menos na radiação solar) e esse pode ter sido, por exemplo, o gatilho por trás de Revolução Francesa de 1789 que alterou profundamente o estilo de vida na Terra, ao menos no Ocidente.

A situação teria sido a seguinte: as condições sociais da época, na Europa, já eram críticas e a ausência de manchas solares, com variação de temperatura na Terra e portanto na quantidade de chuvas, teria piorado ainda mais a produção de alimentos que já era restrita.

Nenhuma magia, nenhum pensamento anticientífico, nenhuma concepção sobrenatural: apenas o encadeamento de processos que, em um momento crítico, pode disparar o gatilho de profundas transformações no que costumamos chamar de “realidade”.

Imagem: NASA/SDO/APOD.

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