Por Reimont Otoni, compartilhado de Brasil 247 –
A Câmara Municipal derrubou, nesta quarta-feira, 11/03, o veto de prefeito Marcelo Crivella ao projeto de lei que apresentei, em parceria com o Tarcísio Motta, que dá o nome de Largo do Alfredinho a um trecho da Av. N. S. de Copacabana, na esquina de Almirante Gonçalves.
Católico, comunista, suburbano, Alfredinho é Alfredo Jacinto Melo, inventor do bar Bip-Bip, talvez o único do Rio que junta música, cultura, política, boemia e projetos sociais.
Não sou um frequentador típico do Bip. Não sou boêmio e aguento pouco mais de dois copos de cerveja. Enquanto o Alfredinho estava começando a noite, eu já ia no melhor dos sonos. Mas gosto muito das rodas de música, do samba e do choro. Sempre admirei esse papel que o Bip cumpre na defesa da Cultura brasileira.
O que me aproximou do Alfredinho foram outras razões. Sempre tivemos muito em comum, apesar de rotinas bem diferentes. Os dois somos católicos, da linha da teologia da Libertação, próximos do Papa Francisco, de Leonardo Boff. Sempre admiramos figuras como D. Paulo Evaristo Arns, D. Pedro Casaldaglia, D. Helder Câmara, D. Adriano Hipólito. A crença religiosa sempre foi muito forte nele, junto com os ideais socialistas, o que também nos aproximou.
Nos conhecemos em 2012, por causa da Feira Noturna de Copacabana, então ameaçada de remoção. Eu estava no meu primeiro mandato como vereador e uma das minhas bandeiras era, como continua sendo, a defesa do comércio ambulante. Alfredinho era um dos principais apoiadores do pessoal da feira.
Também batalhamos juntos em defesa da população em situação de rua, também uma bandeira do nosso mandato, que assina a Lei da Política Municipal para a População em Situação de Rua. Lei, aliás, que o prefeito não cumpre.
Então, era muita coisa em comum.
Participei de vários atos e debates políticos no Bip-Bip. O último, ainda com o Alfredinho vivo, foi uma semana antes da morte dele, no dia 23 de fevereiro de 2019. Fui entregar para o Bip-Bip um azulejo do Lenço das Mães da Praça de Maio, movimento que há 40 anos luta para descobrir o paradeiro dos desaparecidos da ditadura argentina, incluindo crianças. A ideia do projeto é espalhar pelo mundo 30 mil azulejos artesanais, mesmo número de desaparecidos.
Ganhei o primeiro que chegou ao Brasil, mas decidi entregar ao Bip-Bip, para que ficasse em um lugar muito simbólico nas lutas pela Democracia, contra as ditaduras. Junto com o jornalista Diego Gallardo e a advogada Valeria Monetta, os dois argentinos, levei o azulejo que hoje ocupa um lugar na rica parede do Bip-Bip. Alfredinho estava bem, talvez um pouco mais calado, mas feliz.
Quando ele morreu, eu estava visitando minha mãe, em Conceição do Mato Dentro; soube por telefone. Cheguei a tempo de participar da missa de 7º dia, que foi muito comovente, com uma juventude emocionada cantando para ele.
Aí, em abril, teve a Jornada Lula Livre em todo o Brasil. Cada mandato petista tinha a tarefa de fazer um ato público. Não tive dúvida, tinha que ser no Bip. Alfredinho tinha que estar dentro, de qualquer maneira. A gente não podia fazer diferente. Foi maravilhoso. Bip-Bip lotado, música, discurso e um coro inesquecível de Lula Livre. Cada um sendo um pouco o Alfredo.
Ele tinha esse papel agregador, ele era a alma do Bip-Bip, era o Bip-Bip. Mas é curioso perceber que conseguiu transferir esse espírito para todas as pessoas que estavam em torno dele, como o Matias. O Bip-Bip mudou, mas continua igualzinho, está vivo.
A criação do Largo do Alfredinho é uma justa homenagem a esse homem justo, bom, carioca exemplar, que, sem dizer uma única palavra em qualquer outra língua que não fosse o português, compreendia e era compreendido por gentes de todos os cantos do planeta, visitantes estrangeiros do Bip, que continuam indo ao bar se encantar com a música e com o afeto presente em cada canto daquele lugar.
Viva Alfredinho!
Viva o Bip-Bip!
Viva a Cultura brasileira.