A matemática do golpe ou uma cunha na Democracia

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Por João Tavares, jornalista – 

Deputados e Deputadas nus em nossas salas. Isso foi o que se viu no domingo, quando 367 indecentes senhores e senhoras disseram ‘sim’ para abreviar o mandato de uma Presidenta democraticamente eleita com 98 milhões de votos (43,5 mi no primeiro turno e 54,5 mi no segundo). O circo de horrores encheu os golpistas de testosterona, óbvio, mas também desnudou a farsa de uma votação onde o ódio, a indigência mental, a obscuridade intelectual e a má fé se juntaram num macabro ritual comandado por Cunha e articulado nas barbas do governo pelo conspirador Temer.




O golpe de ontem, que ainda precisará ser referendado pelo Senado e pelo STF, foi uma trama anunciada. A configuração da maioria revelada ontem para rasgar a Constituição teve inestimável ajuda de uma imprensa imperial e familiar e contou com a letargia de um Judiciário emparedado pela ‘voz das ruas’. Mas o fundamental é que o golpe começou a ser urdido com a eleição de Eduardo Cunha para a Presidência da Câmara.

Se a política é como as nuvens, a matemática ‘ainda’ é uma ciência exata. Digo ‘ainda’ pois não duvidaria de Cunha propor a revogação do teorema de Pitágoras ou a alteração da ordem do nosso sistema numérico e ter dezenas de deputados dizendo que ‘pelo meu filho, pela minha família, pelo Brasil e por Deus’ eu voto ‘sim’.
Antes de ter seus pilares revogados socorro-me da matemática para mostrar uma incrível coincidência numérica (e uma reveladora desfaçatez política) nos números da votação de ontem e os da eleição de Cunha à Presidência da Câmara em fevereiro de 2015.

Naquela eleição Eduardo Cunha teve 267 votos (o suficiente para vencer a disputa em primeiro turno); Arlindo Chinaglia (PT) obteve 136; Júlio Delgado (PSB/PSDB e congêneres, 100); e Chico Alencar (PSOL), 8 votos,
Se você somar Cunha e Julio se chega aos exatos 367 dados ao ‘sim’ ontem. E somando-se Chinaglia e Alencar teremos 144 que é a soma dos votos ‘não’ com as abstenções. Isso demonstra que a correlação de forças na Câmara dos Deputados manteve-se idêntica neste período.

O Governo, durante todo este tempo, é quem acreditou em moreiras, padilhas, michéis e demais pastores de estranhas catedrais, deu-lhes cargos, carros oficiais, tapetes vermelhos e no momento oportuno eles deram uma sonora banana para a democracia e para a governabilidade e embarcaram na insensata nau golpista.

Os números coincidentes entre as duas votações jogam uma pá de cal nos inocentes que acreditam que parte da Câmara agiu acovardada com medo das ‘fiespianas’ manifestações de rua ou da ‘globolobotomizada’ ação dos defensores do golpe nas redes sociais. Ledo engano. São os mesmos em posicionamento e voto desde que tomaram posse até o fatídico domingo.

De novo, apenas, a revelação de um grupo de parlamentares pusilânimes, com limitada capacidade intelectual e superlativa venalidade no trato do interesse público. Democracia? Constituição? Soberania? Que é isso? “Minha mãe, meu pai, meu vô’! Esses são imprescindíveis.

E durma-se com um barulho desses e com a precisão matemática que colocou uma cunha em nossa jovem democracia.

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