“Curiosamente, a Folha não deu grande destaque à petição final de Deltan Dallagnol contra Lula, nem no site, nem na versão impressa. No Estadão, nem chamada de capa teve. No Globo, o destaque foi um pouco maior, mas nada que se compare ao circo habitual diante de tudo que atinja o ex-presidente.
Talvez seja porque a peça acusatória é tão indigente que, para a perseguição a Lula, seja melhor escondê-la. O Ministério Público reconhece expressamente sua incapacidade probatória e pede “elasticidade à admissão das provas da acusação”. O negócio é tão descabido que, no documento, solicitam a redução das penas de todos os que acusaram Lula.
Na ausência de provas, o esforço do MPF seria colecionar indícios que construíssem uma narrativa coerente da corrupção supostamente comandada por Lula. Mas é difícil alcançar tal narrativa quando a corrupção não tem ganho material; no caso, quando já ficou demonstrado que o ex-presidente não é dono do tal triplex. Lula seria um caso único na história da humanidade, alguém que ganha propina sem se beneficiar dela: um corrupto altruísta.
Contrasta, com narrativa tão frouxa, a precisão da pena a ser aplicada a Lula. Além de preso, ele deve devolver os R$ 87.624.971,26 (oitenta e sete milhões, seiscentos e vinte e quatro mil, novecentos e setenta e um reais e vinte e seis centavos) que teria recebido de forma indevida da OAS. A bola de cristal de Dallagnol deve estar bem turbinada, para, sem qualquer documento que comprove, com base apenas em convicções e indícios vagos, ser capaz de calcular na casa dos centavos as propinas recebidas.
Na página 3, porém, a Folha ostenta um artigo de Deltan Dallagnol, não sobre o parecer contra Lula, mas para uma exaltação genérica à Lava Jato. Tem algo de errado nos concursos públicos, se o ingresso no MPF é tão concorrido e ainda assim passa gente desse naipe. Dallagnol empilha lugares-comuns e pretensas frases de efeito, sem conseguir construir nenhum percurso argumentativo. Eu diria que parece uma redação de um estudante dos últimos anos do ensino fundamental, mas isso ofenderia a brava gurizada que tem mostrado, na luta pela educação, uma inteligência e um senso crítico que passam longe do pavão de Pato Branco.
Como vexame pouco é bobagem, no meio do texto Dallagnol atribui a Maquiavel, com aspas e tudo, uma versão modificada de uma frase que é provavelmente de Artur Bernardes e que Getúlio Vargas gostava de citar. Ele deve ter estudado história do pensamento político na mesma turma de seus colegas do MP paulista, aqueles que criaram a parceria de Marx e Hegel.”