Dados do GSI sobre agenda de Bolsonaro no dia 30 de outubro de 2022 têm potencial de colocar o ex-presidente no centro da trama que motivou a investigação contra o ex-diretor da PRF
Por Ivan Longo, compartilhado da Revista Fórum
A prisão do ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silvinei Vasques, nesta quarta-feira (9), foi deflagrada no âmbito de uma investigação que, a depender de seus desdobramentos, tem potencial para também levar à cadeia o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Vasques é investigado por interferência no segundo turno das eleições de 2022. Isso porque, em 30 de outubro de 2022, dia do segundo turno das eleições, a PRF realizou bloqueios de “fiscalização”, principalmente em cidades do Nordeste, que teriam por objetivo impedir que eleitores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegassem aos locais de votação.
Dados do Ministério da Justiça apontam que ocorreram muito mais bloqueios da PRF no Nordeste que em qualquer outra região do país, e que tal operação teria sido deflagrada a partir de um estudo sobre os locais em que Lula teve mais votos no primeiro turno.
Informações do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) divulgadas nesta quarta-feira pelo portal UOL mostram que Jair Bolsonaro pode estar diretamente envolvido na trama golpista liderada por Silvinei Vasques. Segundo o órgão, naquele dia 30 de outubro, a poucas horas para o fechamento das urnas e momentos após as operações de bloqueio da PRF, o ex-diretor da PRF se reuniu com o ex-presidente no Palácio da Alvorada, em Brasília.
De acordo com o GSI, Vasques chegou à residência do então presidente às 16h31, acompanhado do então ministro da Justiça, que chegou a ser preso por conivência e omissão com os atos golpistas de 8 de janeiro, Anderson Torres. Cabe lembrar que a PRF é uma instituição subordinada ao Ministério da Justiça.
Vasques e Torres permaneceram no Alvorada com Bolsonaro naquele dia 30 de outubro até 17h30. Apesar do conteúdo da reunião entre o ex-diretor da PRF e ex-ministro com o ex-presidente não ter sido ainda revelado, a PF segue com as investigações sobre interferência no segundo turno das eleições e, caso se confirme que o tema foi tratado com Bolsonaro na ocasião, o ex-mandatário pode ter o mesmo destino que seus ex-subordinados: a cadeia.
À Fórum, o advogado criminalista Adriano Alves, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Política (ABRADEP), afirmou que a prisão de Silvinei Vasques era “inevitável”.
“A prisão era inevitável, tendo em vista o conjunto das evidências juntadas nos autos e por fatos notórios que levam ao possível envolvimento do investigado com crimes políticos”, avalia.
Com relação a Jair Bolsonaro, o advogado não descarta que o ex-presidente também possa ser alvo de um pedido de prisão preventiva, a depender do avanço das investigações.
“Em que pese a repercussão que possa ter essa afirmação, no rigor da Lei e do Estado Democrático de Direito, todos os envolvidos e condenados nos crimes eleitorais ou políticos, podem ter a condenação em regime fechado, até mesmo o ex-presidente Jair Bolsonaro”, pontua Adriano Alves.
O advogado diz, ainda, que a investigação que pesa contra Silvinei Vasques pode ser unida ao inquérito que apura os atos golpistas de 8 de janeiro – pelo qual Bolsonaro, inclusive, é investigado como suposto autor intelectual.
“Precisamos lembrar que os crimes políticos, onde se encaixam os atos golpistas, preveem penas mais elevadas. Qualquer prova produzida neste inquérito pode ser usada para fundamentar eventual investigação em outros procedimentos ou processos judiciais”, explica.
Bolsonaro tramou golpe no Planalto com Vasques e Torres, diz deputado
O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, revelou nesta quarta-feira (9) em entrevista ao portal UOL ter informações de que o ex-presidente Jair Bolsonaro participou ao lado do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres e do ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, da articulação golpista.
Teixeira afirmou que, durante a transição de governo, uma pessoa que frequentava o Palácio do Planalto disse a ele que a articulação golpista foi combinada em comum acordo com Bolsonaro, Torres e Silvinei Vasques.
“Eles todos participaram de reuniões. Isso me foi relatado e eu acho que as investigações vão conduzir nessa direção. Isso eu tô revelando agora, faz parte da representação que tem, sobretudo, como objetivo atuar sobre aquele dia (o 8 de janeiro)”, disse.
“A minha expectativa é que Bolsonaro seja preso, porque o relato dessa pessoa que confirmou a informação que a Gleisi (Hoffmann) já tinha é que Bolsonaro participou dessa discussão”, afirmou o ministro.
Teixeira relata que essas reuniões teriam ocorrido ainda antes do segundo turno das eleições de 2022. Nelas, Bolsonaro, Torres e Vasques teriam articulado os bloqueios da PRF que levaram o ex-diretor da instituição à prisão.
“Conduta ilícita e gravíssima”
Ao autorizar a prisão preventiva de Silvinei Vasques, o ministro Alexandre de Moraes aponta, em despacho, que o ex-diretor da PRF incorreu em “conduta ilícita e gravíssima” ao determinar “policiamento direcionado” visando “dificultar ou mesmo impedir eleitores de votar”.
“A conduta do investigado, narrada pela Polícia Federal, revela-se ilícita e gravíssima pois são apontados elementos indicativos do uso irregular da máquina pública com objetivo de interferir no processo eleitoral, via direcionamento tendencioso de recursos humanos e materiais com o intuito de dificultar o trânsito de eleitores”, escreve Moraes em um trecho da decisão.
“Conforme relatado pela Polícia Federal, no dia do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, SILVINEI VASQUES, então ocupando o cargo de Diretor-Geral da Polícia Rodoviária Federal, teria emitido ordens ilegais a seus subordinados, visando a dificultar ou até impedir o livre trânsito eleitores, nas regiões em que o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva havia obtido votação mais expressiva no primeiro turno, conforme apurado pela ferramenta de inteligência artificial”, prossegue o ministro.
Logo na sequência, Moraes reproduz trecho de relatório da investigação da Polícia Federal que indica “possível uso da máquina pública, notadamente da Polícia Rodoviária Federal, com participação direta de servidores da Polícia Federal, ainda que à época cedidos ao Ministério da Justiça, com o possível intuito de interferir no Processo Eleitoral (direcionamento tendencioso de recursos humanos e materiais com o intuito de dificultar o trânsito de eleitores), além do que uma servidora da Polícia Federal teria procurado terceiro com o intuito de ‘formatar seu celular’, o que, em se comprovando as informações acima, pode caracterizar a alteração do estado de coisa, qual seja o conteúdo do aparelho, visando eximir-se de responsabilidade”.
Moraes autorizou a prisão de Silvinei Vasques pois, segundo a Polícia Federal, sua liberdade estaria atrapalhando as investigações, visto que servidores da instituição teriam mentido em depoimento por temerem o ex-diretor da PRF.
“A Polícia Federal, inclusive, aponta a ocorrência de prejuízo à instrução criminal, em virtude dessa situação de SILVINEI VASQUES, por pelo menos uma vez, relativamente a NARALÚCIA LEITE DIAS (então Chefe do Serviço de Análise de Inteligência da PRF) e ADIEL PEREIRA ALCÂNTARA (então Coordenador de Análise de Inteligência da PRF), que aparentemente faltaram com a verdade ao prestar depoimento, conforme já relatado, indicando a presença de temor reverencial em relação à pessoa de SILVINEI VASQUES, a comprovar que, em liberdade, teria poder de influenciar no depoimento de eventuais testemunhas”, pontua o ministro do STF.