“Lula está no governo, mas os preços continuam insuportáveis.” Em fevereiro de 2023, decorridos apenas trinta e poucos dias do atual mandato presidencial de Lula, ao ouvir no supermercado reclamações como essa, escrevi um artigo com o titulo “O recado que vem das prateleiras dos supermercados”.
Por Bepe Damasco, compartilhado de seu Blog
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil
No texto, depois de citar exemplos de gêneros considerados de primeira necessidade pela população que permaneciam especialmente caros depois do governo Bolsonaro, sempre ressalvando o pouquíssimo tempo de governo, citei algumas propostas de estudiosos do assunto para enfrentar a carestia dos alimentos:
“A volta dos estoques reguladores, o investimento maciço em agricultura familiar, o aumento do volume de crédito para os produtores e a decisão política de não destinar a maior parte da produção para a exportação, em detrimento do mercado interno, são apenas algumas ações apontadas por especialistas como capazes de conter a carestia.”
Passado um ano e nove meses, as perguntas são: algumas dessas medidas foram adotadas? E se a resposta for afirmativa, por que não surtiram os efeitos desejados?
Se é verdade que alguns preços, como o da carne, pararam de subir, ou tiveram uma pequena queda, também é inegável que o nível de desaceleração ainda não foi capaz de provocar na dona de casa a sensação de que a vida está mais barata, que sobrou algum dinheiro no bolso após as compras.
O desemprego vem despencando, a massa salarial é a maior em 10 anos e a inflação, embora tenha sofrido um repique sazonal devido à estiagem prolongada e às queimadas, está controlada.
Mas, a aprovação do governo segue estagnada nas pesquisas, mesmo o Lula 3 sendo, na minha visão, o melhor dos três governos do presidente, levando-se em conta o tempo de mandato e o número de realizações.
O PT faz bem em aprofundar o debate, depois do resultado eleitoral ruim nas eleições municipais, sobre os problemas na comunicação do governo e do partido, o descompasso entre o discurso do PT e novo mercado de trabalho, a atuação periclitante nas redes sociais e a ofensiva da extrema-direita no Brasil e no mundo.
Contudo, sem uma política voltada para o barateamento da comida, a eleição de 2026 se tornará ainda mais difícil do que já se vislumbra. Cairia bem uma iniciativa do presidente da República de pautar o debate sobre a carestia, assim como faz, aliás de forma brilhante, na questão dos juros. Expressar a preocupação do governo e demonstrar solidariedade com os que sentem na pele os preços altos já seria um passo importante.
Os empresários dizem que a pandemia do coronavírus desorganizou fortemente a cadeia produtiva e fez os preços dispararem. Só que muitos produtos mudaram estratosfericamente de patamar de preço e nunca mais recuaram. Não estariam os grandes produtores auferindo margens de lucro excessivas?
O que está acontecendo nas eleições para a presidência dos Estados Unidos pode servir como um exemplo a não ser seguido. Lá, os democratas encontram dificuldades para comunicar seus resultados econômicos muito em razão dos preços, que seguem nas alturas, afetando o humor e a definição de voto das pessoas.
No Brasil, ou o governo prioriza politicamente o enfrentamento desse problema, ou a extrema-direita virá ainda mais forte em 2026.
Descartando o congelamento, pois está provado que não dá certo e costuma levar ao desabastecimento, estou convencido de que é possível focar em três tipos de alimentos de forte apelo popular, tipo feijão, arroz e carne, e usar todos os instrumentos possíveis de governo para barateá-los.
Mas barateá-los para valer, coisa capaz de fazer a diferença, e não apenas uns centavinhos a menos.