Por María Martím do El País, publicado em Geledes –
Conhecida após a chacina da Candelária, Yvonne Bezzerra de Mello não precisaria trabalhar para viver, mas dedica sua vida ao ensino das crianças mais pobres
Na semana passada, Yvonne Bezerra de Mello saía do banheiro de um shopping de um bairro nobre do Rio de Janeiro quando alguém cutucou seu ombro. “Pois não?”, disse ela ao se virar. Ao seu lado havia uma mulher com cara de poucos amigos: “Você não tem vergonha do que faz, educar bandido para ficar matando a gente na porta do shopping?”
Há muita gente que não gosta de Yvonne. É chamada de louca. Não entendem o que ela faz e a hostilizam na rua, onde passou anos alfabetizando crianças sem rumo. A raiva por ela vem de longe. Yvonne, hoje com 70 anos, perdeu seu anonimato em 1993 após a chacina da Candelária, quando três policiais militares assassinaram a tiros oito crianças de rua na porta da famosa igreja do centro do Rio. Ela, que na época dava aula para 250 meninos sem lar, foi a primeira pessoa que as crianças chamaram. A primeira a ver os oito corpos massacrados. A primeira a chamar a atenção sobre a barbárie.
Depois do massacre, Yvonne foi inclusive sequestrada. Por policiais, conta ela. “Puseram um fuzil na minha cabeça, diziam que iam me matar… Queriam evitar que eu testemunhasse. Mas não me mataram e testemunhei, claro que testemunhei [os três policiais foram condenados– hoje dois estão livres e um foragido]. Eu sabia o que acontecia ali todos os dias”, relata Yvonne, 24 anos depois do episódio.