José Antonio Costeira Leite pelo Facebook –
“Dois amantes felizes não têm fim nem morte, nascem e morrem tanta vez enquanto vivem, são eternos como é a natureza”. Relembrando essa frase do poeta Neruda, que me soa hoje como expressão de uma vontade minha, quase infantil, não há como não pensar em meu velho pai, morto há mais de dez anos, e o destino da Portuguesa, clube que ele amava como a uma mulher. Amava tanto que nunca se cansou de tentar fazer-me “luso” nos anos 60, quando a magia de Pelé enfeitiçava o mundo.
Ainda assim, eu, ainda com sete anos, era levado pela mão dele ao Pacaembu ainda com sua concha acústica, às pelejas onde o esquadrão de Vila Belmiro enfrentava uma Portuguesa ainda inspirada por seu passado de time Bicampeã do Torneio Rio-São Paulo, em 1952 e 1955. Por ser tão pequenino, o velho me carregava nos ombros, junto ao alambrado, para que eu – acalentava ele – visse um improvável gol de sua Lusa, cuja defesa era quase invariavelmente batida pelas tabelas entre Pelé e Coutinho.
Na volta para casa, eu fingia acreditar em suas desculpas mirabolantes, que misturavam uma jornada de azar de seu time a uma arbitragem desonesta do juiz. Assim como um camponês que ainda acreditava na volta de Dom Sebastião, que enfim restauraria Portugal à sua glória, ele me acenava com um escrete que reviveria a Portuguesa dos anos 50. Num misto de admiração e pena, eu concordava com ele sem reconhecer ainda a identidade de um amor filial.
Na última chance de me ver reconduzido ao trono de Avis, na decisão do campeonato Paulista entre Santos e Portuguesa no Morumbi, em 1973, o vi chorar pela primeira vez quando o juiz Armando Marques deu ao time de Pelé o troféu de Campeão Paulista após cobrança de pênaltis. Mas no monótono caminho para casa, antes que ele iniciasse seu rosário de desculpas e promessas, Fiori Gigliotti anunciou no rádio que o título tinha sido dividido entre as duas equipes, pois o juiz dera fim prematuro à cobrança de pênaltis, quando ainda faltava uma última chance à Portuguesa.
Então, um choro infantil trouxe ao velho a certeza de que o passado glorioso voltaria, assim como um Dom Sebastião rubro verde, artilheiro. Nunca mais. Afora alguns raros lampejos, a Lusa permaneceu sempre uma promessa não cumprida que ele levou, ainda esperançoso, ao outro mundo para onde foi.
Os jornais noticiam mais uma derrota a Lusa, caída na sarjeta da Série D, agonizante. E hoje sou eu quem tenta resgatar para mim mesmo os devaneios do velho. A crise da Lusa é só uma má fase, percalço do caminho, buraco no gramado. Gol mal anulado pela vida.
Foto da capa retirada do site futeboldecampo.net