A quem (ou a quê) seu filho “pertence”? Uma reflexão sobre os ataques nas escolas

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A pandemia acentuou o isolamento dos jovens, tornando-os presas fáceis dos grupos de ódio que manipulam o pertencimento na internet

Por Socialista Morena, compartilhado de Revista Fórum




Cena do filme A Onda, de 2008. Foto: divulgação
Cena do filme A Onda, de 2008. Foto: divulgação

CYNARA MENEZES

Quem não deseja “pertencer”? A necessidade de pertencimento é natural entre os seres humanos. Todo mundo quer pertencer a um grupo de amigos, de colegas de trabalho, à torcida de um time de futebol. Interesses em comum funcionam como a cola que vai uni-los. Para o bem e para o mal.

Assim como utiliza a indignação, outro sentimento positivo na população, para se promover, a extrema direita também tem se mostrado hábil em manipular o pertencimento. Como a pandemia acentuou o isolamento dos jovens, encerrados em seus quartos diante de eletrônicos até na hora da aula, muitos se tornaram presas fáceis de serem fisgadas por grupos de ódio na internet.

Não por acaso, todas as vezes que ocorrem massacres em escolas, aparecem os que culpam os videogames. Só que o uso excessivo dos videogames não é a causa e sim o sintoma: uma criança ou um adolescente que passa seus dias isolado, solitário, que se sente rejeitado, excluído, pelos colegas na escola, se torna vulnerável a ser atraído pelo discurso falacioso da extrema direita nas redes.

Haverá algum ataque a escolas no dia 20 de abril? Não sabemos. Mas há uma pergunta que considero fundamental, que cada pai e cada mãe precisam ser capazes de responder antes que seja tarde demais: a quem (ou a quê) seu filho pertence?

No experimento retratado no filme A Onda, de 2008, o adolescente Tim é a vítima ideal da cooptação por um grupo de ódio. Tímido, sem amigos, sem afeto dentro de casa, alvo de bullying dos garotos populares… A adesão entusiasmada de Tim à Onda é imediata. Encontrou ali uma razão de viver.https://916b431ebf9cb24ee18958fac22f067c.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html?n=0

Tim, que não se sentia parte da família nem da escola nem talvez do mundo, agora pertence a um grupo. Foi aceito. “Nós pensamos como você, junte-se a nós” é uma sentença sedutora demais para quem se sente incompreendido e só, sendo o homem um ser gregário por natureza; e é aí que mora o perigo.

A antropóloga Adriana Dias, que faleceu em janeiro deste ano, há tempos vinha alertando as autoridades sobre o crescimento de células neonazistas no Brasil. Ela monitorou estes grupos durante 20 anos e constatou um crescimento assustador deles durante a era Bolsonaro: o total de células neonazistas saltou de 72, em 2015, para 1.117 em 2022. A maior parte desse crescimento ocorreu a partir da campanha eleitoral de Bolsonaro em 2018: em 2019 eram 334 células.

Ostentamos a triste estatística de ser atualmente o país onde o extremismo de direita mais cresce no mundo. São Paulo, local onde ocorreu o ataque a faca protagonizado por um adolescente de 13 anos no mês passado, é, segundo o levantamento feito por Adriana Dias, o Estado com maior presença de grupos, chegando a um total de 137, dos quais 51 na capital. O adolescente que deixou uma professora morta e quatro feridos Thomazia Montoro já se envolvera em episódios violentos dentro da escola anterior e mesmo naquela, para onde tinha sido transferido havia apenas um mês.

Adriana detectou grupos extremistas para todo tipo de “candidatos” a pertencer: Hitlerista/Nazista, Negação do Holocausto, Ultranacionalista Branco, Radical Catolicismo, Fascismo, Supremacismo, Masculinismo, Supremacia Misógina, Neo-Paganismo racista… O sentimento de pertencimento é fundamental ao bolsonarismo. Só ele explica alguém deixar sua casa para passar o Natal acampado numa barraca na frente de um quartel.

O que nós, como pais, podemos fazer? Em primeiro lugar, estar extremamente atentos a nossos filhos adolescentes. Muitos pais pensam que a resposta está em vasculhar celulares e computadores dos filhos, quando os sinais estão do lado de fora da tela

Agora experimente se colocar no lugar de um adolescente que se sente rejeitado na escola, que vem de uma família desestruturada ou sem diálogo e que vive incomunicável em seu quarto. Imagine que ele conhece, em chats e aplicativos, alguém simpático e que lhe oferece amizade. Este indivíduo convida o adolescente para participar de um grupo com algum tema de interesse em comum. Este adolescente solitário e rejeitado se sentirá acolhido, ouvido, respeitado, lógico.

Não existem “lobos solitários”. O autor de massacres pode até agir sozinho, mas não está sozinho: encontrou sua “matilha” nos grupos de ódio da internet. E me parece evidente que existem adultos fazendo este trabalho de cooptação. É preciso que as autoridades cheguem a eles o quanto antes.

Mas o que nós, como pais, podemos fazer? Em primeiro lugar, estar extremamente atentos a nossos filhos adolescentes. Seu filho vive isolado ou está socializando, ainda que virtualmente, com os amigos que conhece na vida real, o que é mais do que desejável nesta idade? Seu filho aparenta estar feliz, contente? Seu filho está com dificuldades na escola, tirando notas baixas? Você consegue conversar com seu filho regularmente? Muitos pais pensam que a resposta está em vasculhar celulares e computadores dos filhos, quando os sinais estão bem visíveis, do lado de fora da tela.

Estamos todos angustiados, às vésperas de uma data que os grupos de ódio colocaram como uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças: haverá algum ataque a escolas no dia 20 de abril? Não sabemos. Mas há uma pergunta que considero fundamental, que cada pai e cada mãe precisam ser capazes de responder antes que seja tarde demais: a quem (ou a quê) seu filho pertence?  

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