Por Jeferson Miola, compartilhado de Brasil 247 –
Juntos, os partidos de esquerda [PCdoB, PSOL e PT] e centro-esquerda [PDT e PSB] têm 132 do total de 513 deputados/as da Câmara.
O campo político da direita e extrema-direita tem a folgada maioria parlamentar de 381 parlamentares – um poder mais que suficiente para eleger a presidência da Câmara em fevereiro de 2021, que exige 257 votos.
Este campo, porém, está dividido entre o candidato do Bolsonaro e dos militares, deputado Arthur Lira/PP, e a candidatura do bloco articulado pelo atual presidente Rodrigo Maia/DEM.
Por enquanto, o candidato do Bolsonaro larga na frente com 204 apoios, contra 159 do bloco articulado por Maia.
É fato que o campo da esquerda/centro-esquerda não tem força eleitoral para, sozinho, eleger o/a presidente da Câmara; mas nenhuma das 2 facções conservadoras têm chances de conquistar a presidência sem votos progressistas e de esquerda.
Essa realidade de incertezas enseja toda sorte de traições, deslealdades e oportunismos típicos do cretinismo parlamentar – em todos os espectros ideológicos, diga-se de passagem.
É neste marco conjuntural – [1] de divisão do bloco parlamentar da oligarquia dominante, [2] do risco de Bolsonaro conseguir instalar uma “espécie de Augusto Aras” na presidência da Câmara, e [3] do peso relativamente limitado da oposição de esquerda – que deve ser analisada a tática do campo de esquerda/centro-esquerda neste processo.
Acima de qualquer dúvida, é preciso reconhecer que Arthur Lira na presidência da Câmara reforça consideravelmente a ameaça de escalada ditatorial e do autoritarismo; favorece o avanço ultra-reacionário, do fanatismo religioso e do extremismo fascista. Na Câmara, Lira funcionaria para Bolsonaro como Aras funciona para ele na PGR, como Noronha no STJ, como Mussi no TSE e como Ramagem na ABIN.
Em que pese durante sua gestão Maia ter autocraticamente engavetado quase 60 pedidos de impeachment do Bolsonaro e ter sido o artífice da aprovação da agenda bolsonarista ultraliberal de destruição da soberania nacional e dos direitos dos trabalhadores para viabilizar o mais devastador processo de pilhagem e saqueio das riquezas do país, Maia e sua facção não serviram ativamente como motor para a escalada fascista.
Em texto de dezembro de 1931, escrito no contexto do ascenso inexorável de Hitler ao poder, Leon Trotsky defendeu o entendimento de que, para deter o avanço nazista, “Pode-se fazer acordos com o próprio diabo, com sua avó e até mesmo Noske e Grzesinsky [dirigentes do partido social-democrata], com a única condição de não atar-se as mãos”, ou seja, com a condição de não subordinar-se politicamente à classe dominante.
Para Trotsky, a esquerda não deveria ter “Nenhuma plataforma comum com a social-democracia ou os líderes dos sindicatos alemães, nenhuma publicação, nenhuma bandeira, nenhum sinal comum!”.
Na opinião do revolucionário russo, na relação com a burguesia alemã, os socialistas e comunistas deveriam “Marchar separados, [mas] golpear juntos! Pôr-se de acordo apenas em como golpear, em quem golpear e quando golpear!” o nazismo.
À luz desta perspectiva, a tática adotada pelo campo político de esquerda/centro-esquerda [ainda pendente de posicionamento oficial do PSOL] representa a escolha adequada para este momento histórico nacional.
Conforme explicou a presidente do PT Gleisi Hoffmann, a esquerda tem “muitas divergências, muitos embates, principalmente na agenda econômica” com Maia e a direita.
A aliança pontual para a eleição da Câmara, neste sentido, não apaga estas profundas diferenças; é apenas um dispositivo de luta para impedir a eleição de um preposto do Bolsonaro para deter sua escalada nas instituições e, assim, proteger o pouco que ainda resta de democracia no Brasil.
A esquerda/centro-esquerda integra o bloco preservando inteiramente sua identidade política e programática. Não ficou com as “mãos atadas” aos candidatos defendidos por Maia, os deputados Aguinaldo Ribeiro/PP e Baleia Rossi/MDB. E isso se traduz na candidatura própria com que a esquerda/centro-esquerda se apresentará no 1º turno da eleição, e que será definida em consenso entre PCdoB, PDT, PSB, PSOL e PT.
Neste período histórico de derrota dos interesses nacionais, populares e democráticos; de correlação de forças desfavorável e de ofensiva fascista-militar no Brasil, a maior prioridade das forças populares, de esquerda, democráticas e progressistas é impedir o aprofundamento do totalitarismo e da barbárie.
Romper os elos da cadeia de poder e de domínio do Bolsonaro, neste sentido, é uma urgência que se impõe. Aliar-se “até com o diabo” para derrotar o fascismo, desde que sem “atar-se as mãos”, é a chave tática da esquerda para a eleição da presidência da Câmara.