A vida em primeiro lugar: com aumento de casos, Buenos Aires fecha tudo outra vez

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Por Martín Fernández Lorenzo, compartilhado de Socialista Morena – 

Flexibilização do isolamento social em maio fez Covid-19 disparar na região metropolitana da capital argentina

DESINFECÇÃO DE PARQUE EM PALERMO, BUENOS AIRES. FOTO: DIVULGAÇÃO Martín Fernández Lorenzo 

Em 12 de maio, quando se decidiu relaxar a quarentena na CABA (Cidade Autônoma de Buenos Aires), a Argentina tinha 6.563 casos de coronavírus e o número de mortes era de 319. Naquele momento, 4.522 do total de casos do país estavam na cidade de Buenos Aires e parte da província. No período de flexibilização de 45 dias, a capital saltou de 2.286 para 23.713 casos, e a província de Buenos Aires, de 2.236 para 26.337 casos, representando 90,5% dos 64.530 casos registrados no país, graças em boa medida à incompreensão das classes mais altas com o isolamento social.




Depois que os casos dispararam, o presidente Alberto Fernández, o governador da província, Axel Kicillof, e o chefe do governo de Buenos Aires, Horacio Rodriguez Larreta, de oposição, anunciaram o retorno à quarentena rigorosa na Área Metropolitana de Buenos Aires (Cidade de Buenos Aires e 40 municípios da província) a partir desta quarta-feira, 1º de julho. A região concentra 40% da população da Argentina.

O outro epicentro é a província do Chaco, com 1.831 casos, mas com uma circulação de pessoas muito menor, já que o Chaco tem pouco mais de 10 habitantes por km², enquanto Buenos Aires tem 15.000. Em 20 províncias do país, 95% das empresas estão operando, portanto claramente o principal problema para o enfrentamento do coronavírus na Argentina é a região metropolitana da capital, onde 54% dos leitos de UTI estão ocupados.

Foi o chefe de governo Larreta que, no dia 9 de maio, promoveu uma flexibilização na cidade com mais casos no país e com maior circulação, e que foi aprovada pelo governo nacional. A queda de braço entre o governador da província, o kirchnerista Kiciloff, e o chefe de governo de Buenos Aires, o macrista Larreta, tem sido muito dura.

Embora este último desejasse ampliar a flexibilização, o governador tentou voltar atrás no começo de junho, pois a circulação entre a cidade e a província é muito alta e, portanto, foi determinante pra espalhar o contágio entre Buenos Aires e a província. Ou seja, se as coisas piorarem, o custo político da decisão arrastará Fernández por permitir a prolongada flexibilização de Larreta, que joga para ambos os lados, colocando em risco uma gestão contra o coronavirus que é considerada como uma das mais bem-sucedidas do planeta, segundo a revista Time.

O comportamento dos cidadãos da capital durante a flexibilização não foi nada responsável. Quando anunciaram o relaxamento, as pessoas saíram desesperadamente para se exercitar nas ruas de Buenos Aires, sem respeitar nenhum dos protocolos sanitários

Vale ressaltar o comportamento dos cidadãos da capital na flexibilização, que não foi nada responsável, pois quando o relaxamento foi anunciado, as pessoas saíram desesperadamente para se exercitar nas ruas de Buenos Aires, sem respeitar nenhum dos protocolos sanitários. Este tipo de atitude, somado às marchas anti-quarentena, em que as pessoas negam ou minimizam o vírus, foram determinantes para levar o governo a fechar tudo outra vez.

Neste meio tempo, o papel da imprensa comercial argentina e da oposição tem sido vexaminoso, parecendo desejar que o país tenha mais mortes para poder assim culpar o governo de Alberto Fernández, com o argumento de que a quarentena foi inútil.

Quem desceu mais baixo até agora foi a jornalista Silvia Mercado, que no twitter sugeriu que o isolamento faria mais sentido se houvesse 20 mil mortos. Jornalistas conservadores, como Baby Etchecopar, que chamou Cristina Kirchner de “câncer”, ou Cristina Pérez, que desempenhou um papel lamentável ao querer ensinar Direito ao professor de Direito Fernández, se tornaram cenas comuns no cotidiano da televisão argentina.

Esses comunicadores macristas pressionavam para que a quarentena terminasse em 20 de junho, quando impulsionaram um massivo e inédito “banderazo” contra o projeto de expropriação da empresa Vicentin, uma das principais empresas de cereais do país. Uma imagem mais do que triste, ver como centenas de trabalhadores e suas famílias foram expostos ao contágio em defesa dos empresários bilionários que fraudaram o Estado em 300 milhões de dólares, com os créditos irregulares para a Vicentin outorgados pelo governo de Macri.

O falso dilema da quebra da economia é constantemente usado para atacar o presidente, quando, na realidade, a queda do PIB argentino estimada pelo FMI é de -9,9%, sendo menor que a da Itália (-12,8), Espanha (-12,8) ou Reino Unido (-10,2), e semelhante à do Brasil, que acrescenta aos -9,1% de queda o trágico saldo de 55 mil mortes. “Se a Argentina seguisse o mesmo ritmo que o Brasil, hoje teríamos 10 mil mortes”, disse Fernández.

Em um debate organizado pela Universidade de Buenos Aires com Lula, o chefe de Estado argentino enviou uma mensagem ao atual presidente brasileiro: “Querido Lula, você não sabe como sentimos falta de que você não seja o presidente do Brasil. O vínculo seria outro, a possibilidade de trabalharmos em nosso continente seria outra”. Ele também acrescentou que o único que tem compromisso com a América Latina hoje é o mexicano López Obrador, deixando bem clara a rejeição a Sebastián Piñera, Bolsonaro, Lenín Moreno etc.

Com o retorno à quarentena estrita, tentando não transbordar a situação, o clima na cidade de Buenos Aires é tenso, pois é a oposição que possui o aparato de mídia de massa para incentivar as pessoas a violar o isolamento, através da disseminação de barbaridades anacrônicas como “a instalação do comunismo” ou do “autoritarismo” no país. Todo esse ataque da mídia aumentou ferozmente quando Alberto Fernández anunciou um projeto para cobrar um imposto único sobre as grandes fortunas, que até o momento não se concretizou.

O que está pela frente não será fácil, dada a oposição à quarentena por parte de muitos portenhos, determinados a pôr em risco suas vidas e as vidas de terceiros para tentar voltar à uma normalidade hoje inexistente.

Por outro lado, quem está passando suas horas mais obscuras é o ex-presidente Macri, abalado por um escândalo de espionagem sem precedentes, onde já ficou comprovado que, durante seu governo, a AFI (Agência Federal de Inteligência) seguia e espionava com escutas ilegais opositores como Cristina Kirchner e até aliados como Larreta, presos políticos, jornalistas e os diálogos que os bispos mantinham com o papa Francisco, algo que não ocorria no país desde o retorno da democracia, em 1983.

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