Por Nelson Barbosa, escritor
Assisti a grande parte da cerimônia de abertura das Olimpíadas de Tóquio e tive duas impressões que, não sei, talvez possam ser confirmadas.
A primeira foi que essas cerimônias resvalam muito para a pieguice, tentando sempre exaltar valores de certo modo obsoletos na atualidade, como a ideia de nação ou mesmo a de “fraternidade” ou universalidade dos “povos”.
Cada vez mais vemos a fome, a miséria, a usurpação, o domínio do mais rico sobre o mais pobre… e nem mesmo a ideia da grandeza do esporte parece mais superar essa sensação de que tudo é uma grande encenação.
Isso tudo parece ter passado uma impressão de déjá-vu, ou pior, de falsidade daqueles rituais todos, já desgastados ou mesmo desacreditados, talvez.
A segunda impressão me levou àquela questão levantada por Walter Benjamin sobre o silêncio absoluto dos que voltaram da Primeira Guerra, como signo da descrença do homem na sua própria capacidade de superar a realidade, sobretudo após essa realidade ter ultrapassado em muito a própria verossimilhança, mostrando que o pior sempre pode acontecer, por mais que as expectativas sejam de positividade.
Isso não parece tão despropositado para o homem que somos hoje neste século e neste mundo pandêmico em que vemos a morte arrasar nossos próximos muito mais do que uma tragédia como uma guerra ou um acidente de grandes proporções pode acarretar.
Lembrei que aquele “homem” que viu os horrores da Guerra vinha de um tempo que se acredita ter sido o mais feliz da humanidade, o da Belle Époque. E talvez até por isso mesmo a realidade que ultrapassou a verossimilhança pôde causar tanto desencantamento como o silêncio absoluto, a mudez, talvez a descrença.
Enfim, posso estar equivocado, claro, mas aquele espetáculo da abertura me sugeriu essas duas sensações: a de que acabamos como civilização e não sabemos ainda se e como vamos nos reinventar ou ser capaz de.
Senti isso como homem universal, mas especialmente como brasileiro, por todas as razões redobradas dessa realidade explícita que é a nossa.
Imagem do post: pintura de Gassed.