Absolvição de jovem do crime de injúria racial reforça impunidade. MP vai recorrer

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Qual a diferença de crime de racismo e injúria racial, e por que é tão difícil punir o racismo com rigor no Brasil? Doutor em Direito Constitucional explicou ao Portal CUT a diferença

Por Walber Pinto, editado por Rosely Rocha e compartilhado de CUT




O crime de racismo e injúria racial, apesar de serem parecidos e confundidos, possuem significados e penas bem distintos. Ao praticarem estes crimes, os autores não têm dimensão do mal que podem causar as vítimas, além de estarem desrespeitando a Constituição Federal que busca uma sociedade igualitária e democrática.

O recente caso de uma estudante de Administração e Empresas, da Universidade de São Paulo (USP), de 22 anos, acusada de injúria racial contra três seguranças negras no ano passado trouxe à tona novamente o debate sobre impunidade quando se trata de crimes de racismo no Brasil, mesmo com provas. Na semana passada, a jovem foi absolvida pela 3ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo das ofensas racistas.

Em sua decisão, o juiz Carlos Eduardo Lora Franco afirmou não haver dúvidas sobre as ofensas racistas praticadas, mas argumentou que a ré estava sob perturbação mental, já que havia consumido álcool e maconha, e que a condenação seria desproporcional. O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) recorreu da decisão e afirmou que a sentença transmite um recado de que pessoas ricas podem sair impunes porque frequentam espaços de privilégio.

O crime que ocorreu durante uma festa no estádio do Canindé em 24 de setembro de 2022, quando a jovem, alterada, passou a agredir outros participantes, gerou indignação nas redes sociais e trouxe novamente o debate: qual a diferença de crime de racismo e injúria racial, e por que ainda é tão difícil punir o racismo com rigor no Brasil?

Entenda a diferença

Em 2023, foi sancionada pelo presidente Lula a Lei nº 14.532/23 que equipara injúria racial ao crime de racismo e protege a liberdade religiosa. A lei prevê pena de dois a cinco anos para quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas. A pena será aumentada a metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas, além de pagamento de multa.

O caso recente da estudante da USP é um desses exemplos, no entanto, na grande maioria das vezes os noticiários passam informações equivocadas sobre os de crimes de racismo ou injúria racial, mas importante, ambos são diferentes, ressalta Adilson Moreira, doutor em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da Universidade de Harvard.

“A injúria racial é quando se ofende a honra subjetiva de um indivíduo, utilizando a raça, o xingamento racista para atingir a honra de alguém.

Já o crime de racismo, na legislação brasileira, é regulado pela Lei nº 7716, de 1984, que o tornou crime inafiançável. A injúria, crime contra a honra, é um tipo de crime regulado pelo Código Penal. É um tipo de crime que ofende ou é praticado contra uma coletividade de indivíduos. A pena prevista é a detenção de um a seis meses ou multa e, é possível o pagamento de fiança.

Adilson nos ajuda a entender esses dois conceitos e a falha na legislação brasileira quando se trata da questão racial. Ele nos cita dois exemplos.

“Um homem negro vai se candidatar a uma vaga de emprego e a pessoa que vai entrevistar diz: “Não vou te contratar porque você é negro ou negra”. Aqui, segundo ele, temos um crime de racismo. Mas, se nós estamos na rua e alguém chama uma pessoa negra de macaco, isso será um crime de injúria racial, de acordo com a legislação brasileira.

Casos têm crescido

O número de casos de injúria racial e crimes de racismo tem crescido a cada dia que passa, seja nas ruas, nos campos de futebol, nas escolas e principalmente nas redes sociais, que se tornou o maior ponto de encontro entre pessoas que compartilham interesses em comum, inclusive, agridem com palavras de baixo calão, ofendendo uma pessoa ou um grupo de pessoas, por sua cor, religião, orientação sexual e etc.

O professor aponta ainda que há um tratamento desvantajoso na justiça brasileira sempre que se trata de pessoas negras. 

Um dos motivos pelos quais a lei do racismo é ineficaz é que o nosso sistema judiciário é branco, 82% das pessoas que compõem o sistema judiciário brasileiro são pessoas brancas, heterossexuais e de classe alta- Adilson Moreira

A decisão da Justiça

O juiz do caso afirmou que o estado da ré não legitima qualquer conduta e que a ofensa não se justifica, mas são menos graves e menos ofensivas do que se fosse praticada por alguém que estivesse equilibrado.

A ré chegou a oferecer R$ 500 à segurança que teve a mão mordida, mas a vítima não aceitou.

Ainda no processo, consta que a ré foi diagnosticada com borderline, transtorno depressivo recorrente e transtornos mentais por uso de maconha. O laudo é de 23 de setembro de 2024.

Danilo Keiti Goto, promotor do Grupo Especial de Combate aos Crimes Raciais e de Intolerância (Gecradi), afirmou que as provas são claras e que, diante delas, a Promotoria entendeu que as imagens do local não eram necessárias.

Ele disse ainda que não foram apresentadas provas de que a ré foi vítima de agressão ou violência sexual.

“Na prática [a decisão], autoriza o racismo daquele que faz uso de qualquer substância. A prova nos autos é contundente no sentido de que, no momento dos fatos, a acusada não só se embriagou de forma voluntária como estava lúcida quando cometeu os crimes”, afirmou.

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