Advogados que criticaram Zanin por ter enfrentado juízes são covardes

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Por Djefferson Amadeus, Mestre em Direito e Hermenêutica Filosófica, publicado em Justificando – 

Este é um dos textos mais duros que já escrevi. Por isso o título também poderia ser: advocacia pusilânime. Ou advocacia subserviente. E ainda: é o fim da advocacia quando um juiz critica a defesa e advogados aplaudem-no. Escrevo totalmente inspirado em Étienne De La Boétie; em especial na sua obra A Servidão Voluntária.

Pois muito bem.

Decepcionado – assim fiquei quando li que advogados criticaram Zanin por ter enfrentado Moro. Mas ó, bom deus! O que é isso? Que nome damos a esse fenômeno que se alastrou pelo direito de se bajular e adular juízes? Que vício é esse ou, como diria Étienne De La Boétie: “- Que infeliz vício é esse?[1]




Excelentíssimo, grandioso, magnânimo, nobre, nobríssimo, digníssimo, ilustríssimo, preclaro, emérito… Juiz. Assim se referem, aos juízes, os advogados que criticaram Zanin. Daí suas principais características serem seus rostos risonhos e corações sempre apreensivos.

Antigamente, conforme lembra-nos La Boétie, os tiranos distribuíam um quarto de alqueire de trigo, uma taça de vinho e logo se ouviam (lamentáveis) brados: “Viva o rei”![2] Hoje, os juízes dizem: “aguardai; talvez eu despache com você!”, e logo se vê um sorriso no rosto dos advogados que criticaram Zanin, seguido de um brado: “Viva o Juiz”.

Isso explica porque o juiz Rogério Cunha – de maneira totalmente desrespeitosa – se sentiu autorizado a criticar o advogado de Lula, em seu Facebook, com a seguinte frase: “O resultado de hoje provou para o advogado de Lula que testa oleosa é muito diferente de mente brilhante.” E, ao ser criticado por um Advogado, que dizia ser a sua conduta inadequada a um juiz, ele respondeu: “Só deveria dizer o mesmo para os 45 advogados que curtiram a postagem.”

É de se perguntar, então, ao ver todos esses advogados elogiando a postura deste juiz, – mesmo com pescoço a jugo, pois não tardará a chegada do dia em que terão um de seus clientes julgado por ele – por que se prestam a defender juízes que menosprezam advogados?

O que leva um advogado a aplaudir o Desembargador Gebran Neto, quando, no julgamento de Lula, afirmou que utilizou a pas nullité sans grief como critério orientador de seus votos? Ora essa, uma teoria que certamente levará qualquer acusado à condenação é aplaudida por muitos advogados… criminalistas. Por quê?

Deixais prenderem o mais inocente de seus clientes; esperardes por horas que o juiz o recebesse para um despacho, o qual não aconteceu; não reconhecera a mais cabal das nulidades; condenara seu cliente sem nenhuma prova; e toda essa degeneração, esse infortúnio, essa ruína vem daquele cujo poder foi concedido por vós mesmos, advogados!?

Quando advogados insistem em bajular e adular juízes cujo melhor tratamento que este lhes oferecem é a humilhação, como explicar isso?

Há várias respostas. Para fins deste texto, interessa-me apenas duas. A primeira delas nos é dada por Étienne De La Boétie: a Servidão voluntária, isto é: “o segredo, a força da dominação consiste no desejo – em cada um, seja qual for o escalão que ocupe na hierarquia – de identificar-se com o tirano, tornando-se o senhor de um outro.”[3](Jacinto Coutinho)

Dizendo de outra maneira: o oprimido aceita ser oprimido porque espera oprimir; daí ele gozar com o opressor porque sonha em ocupar um posto no qual possa, de algum modo, oprimir também. Em suma: os advogados que criticaram Zanin nunca tiveram o sonho de exercer a advocacia. São, pois, frustrados, dado que, por acreditarem que a função do juiz é fazer segurança pública, sonham em ocupar aquele cargo. Servem ao tirano porque são tiranetes.

Cria-se, assim, uma rede de interesses que a torna muito mais complexa do que a polarização opressor/oprimido.[4] “A tirania atravessa a sociedade de ponta a ponta”[5]Por isso, “a servidão é escolha e, naturalmente, escolha voluntária.”[6]

Perdoem-me a dureza nas palavras, mas, quando vejo advogados adularem juízes com o intuito de tirar alguma “vantagem”, tal coma a de ter uma nulidade reconhecida, mesmo quando o ato é flagrantemente ilegal, causa-me dó a sua tolice, porque, como bem observou Étienne De La Boétie:

Esses miseráveis admiram deslumbrados a radiância de seu poder. Cegados por essa claridade, aproximam-se, sem perceber que se lançam à chama que inevitavelmente os consumirá.[7]

Por isso, o advogado que busca o respeito de um juiz pela bajulação – e não pela leitura de livros e a prática da advocacia – outra coisa não faz senão jogar para escanteio a sua dignidade, contribuindo para a sua humilhação e, consequentemente, a total destruição do direito.

Agora, por fim, apresento-lhes a resposta à segunda pergunta, qual seja – por que advogados aplaudem juízes autoritários que desrespeitam direitos fundamentais? Ora, a resposta é simples: ignorância. Pois, tendo aberto poucos livros durante toda a sua vida, não percebem o mal que há em desconsiderar a Constituição e o direito. Por isso tem razão Éttiene De La Boétieu quando afirma que: “não sentimos falta daquilo que nunca tivemos”.[8]

Nesse sentido, os advogados que criticaram Zanin não sentem falta da Constituição porque saíram da faculdade sem conhecê-la. Por isso, se o chamado hearsay testimony é a testemunha do ‘ouvi dizer, os advogados que criticaram Zanin são uma espécie de hearsay lawyer, porque só ouviram dizer sobre a Constituição.’

Ou seja: não viram e tampouco tiveram contato direto com ela, senão que sabem através de alguém, que, provavelmente, era um professor de cursinho preparatório para concursos públicos.

Eis por que tenho dito:

Advogado que se preze é como o fogo; não sobrevive sem lenha. Sua lenha são os livros.

Por isso, ao retirar-lhe os livros, ele não tem mais o que consumir e consome a si mesmo, perdendo a força e deixando de ser fogo e, consequentemente, advogado.

Só isso justifica a postura dos advogados que criticaram Zanin por ele ter enfrentado Moro. Afinal: por estarem mais preocupados em agradar os juízes do que defender o direito e a Constituição, abriram mão do exercício da defesa e, por conseguinte, deixaram de ser advogados – se é que um dia o foram.

Numa palavra final: respeito é fundamental em todas as profissões. Mas ele não se confunde com pusilanimidade. Foi que o grande Advogado Alberto Zacharias Toron demonstrou ao colocar o Ministério Público no seu devido lugar, quando um Membro desta Instituição criticara o direito ao silêncio.

Por isso, àqueles que criticaram Cristiano Zanin, Juarez Cirino, José Batochio e Nélio Machado por terem enfrentado Moro, bem como Alberto Toron por ter enfrentado o Ministério Público e a mim, jovem advogado, por ter feito este texto, fica aqui a minha mensagem:

Que espécie de advogado seja eu, não vo-lo poderia dizer. Mas, seja lá como for, uma qualidade, ao menos, posso abonar a mim mesmo: a de não ser covarde como vós.

Djefferson Amadeus é mestre em Direito e Hermenêutica Filosófica (UNESA-RJ), bolsista Capes, pós-graduado em filosofia (PUC-RJ), Ciências Criminais (Uerj) e Processo Penal (ABDCONST).


[1] DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 36.

[2] DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 61.

[3] DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 94.

[4] KARNAL, Leandro. Prefácio. In: DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 12.

[5] J COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Direito e Psicanálise. Interlocuções a partir da Literatura. Florianópolis. Empório do Direito, 2016, p. 94.

[6] KARNAL, Leandro. Prefácio. In: DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 13.

[7] DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 77.

[8] DE LA BOÉTIE, Etienne. Discurso da Servidão voluntária. Trad. Evelyn Tesche. Introdução: Paul Bonnefon. Edipro, 2017. p. 54.

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