Alckmin na Justiça Eleitoral e o viés político-partidário da Lava Jato

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Por , publicado em Jornal GGN – 

O caso de Alckmin é um exemplo claro de que a Lista de Janot só ajudou a criar uma falsa ideia de que “a lei vale para todos”, de que todos seriam processados e que o PT não estava sendo perseguido. Na prática, a maioria gritante das delações trata mesmo é de caixa 2 e seus alvos jamais saberão o que é sofrer uma cassação como Dilma, ou ser preso nas condições de Lula

Adriana Spaca/06.12.2016/Brazil Photo Press/Folhapress
Jornal GGN – A notícia de que o processo de Geraldo Alckmin (PSDB) por caixa 2 de R$ 10 milhões da Odebrecht saiu do Superior Tribunal de Justiça não para as mãos da Lava Jato em São Paulo, mas para a Justiça Eleitoral, joga um pouco mais de luz sobre como a operação – que tem o verdadeiro núcleo duro centrado em Curitiba – atuou para derrubar o PT do poder, ao passo em que garantiu que os tiros desferidos na oposição, principalmente no PSDB, não fossem fatais.
Vamos entender por partes:
1 – O QUE ACONTECE COM ALCKMIN AGORA
Alckmin foi delatado pela Odebrecht por supostamente ter usado o cunhado para receber R$ 10,5 milhões do departamento de propina da empreiteira para sua campanha. Não há relatos de que a doação por fora tenha ocorrido em troca de alguma contrapartida.
Neste cenário, é como se apenas petistas e antigos aliados dos governos Lula e Dilma tivessem algo a oferecer às empreiteiras em troca de caixa 2.
As investigações contra Alckmin só foram para o STJ porque ele tinha foro privilegiado.
Destoando do modus operandi da Lava Jato curitibana, o processo tocado pela Procuradoria Geral da República foi mantido sob sigilo.
Ao renunciar ao mandato para concorrer à presidência em outubro, Alckmin abriu mão do foro privilegiado e perdeu o direito de ser processado no STJ.
A Lava Jato em São Paulo, que almeja ter um pouquinho do poder de fogo que teve a turma de Curitiba, pediu com urgência para receber a ação contra Alckmin.
Mas a decisão da Vice-Procuradoria Geral da República em remeter à Justiça Eleitoral mostra que nunca foi intenção processar o tucano por crime comum.
Certo é que o processo por caixa 2 na Justiça Eleitoral é muito mais suave do que sofrer os desgastes da Lava Jato em primeira instância.
Na maioria dos casos, entra como “falsidade ideológica” e tem pena de até 5 anos de prisão. Pode também cair na “Lei do Colarinho Branco”, que é “manter ou movimentar recurso ou valor paralelamente à contabilidade exigida pela legislação”, ou na “Lei contra Crimes Tributários”. Nestes casos, a pena é de 2 a 5 anos e multa.
Reportagem da Folha mostrou, contudo, que nenhum político jamais foi preso por caixa 2. Os dados são do Tribunal Superior Eleitoral e indicam que a jurisprudência não está consolidada.
Os processados por corrupção passiva – recebimento de vantagem indevida, na forma de caixa 2 – podem ser condenados a até 12 anos de prisão.
2 – A LISTA DE JANOT E AS DELAÇÕES QUE NÃO VÊM AO CASO
A Lava Jato, embora tenha um núcleo duro em Curitiba, disposto a fazer o que for preciso para prender seus alvos, não tem um comando centralizado e seus desdobramentos tampouco podem ser controlados pelas instituições. O caráter difuso da operação não permite a afirmação de que houve um plano estratégico, seguido à risca desde o início, apenas para derrubar apenas o PT.
Mas que os espectadores não se enganem: o STJ ter enviado o caso de Alckmin para a Justiça Eleitoral tampouco tem a ver com a força-tarefa da Lava Jato sendo desafiada pelo Judiciário. Primeiro porque foi o próprio Ministério Público Federal que optou por este caminho. Segundo, porque o processo contra o ex-governador é fruto do combo de delações da Odebrecht em Brasília, conhecido como a “Lista de Janot” e que foi vendida como uma bomba contra políticos de todas as vertentes.
O caso de Alckmin é um exemplo claro de que a Lista de Janot só ajudou a criar uma falsa ideia de que “a lei vale para todos”, de que todos seriam processados e que o PT não estava sendo perseguido. Na prática, a maioria gritante das delações trata mesmo é de caixa 2 e seus alvos jamais saberão o que é sofrer uma cassação como Dilma, ou ser preso nas condições de Lula.
É de se frisar, ainda, que junto com a Lista de Janot veio um esforço – por parte da mídia, do Ministério Público e até com eco no Supremo Tribunal Federal –  para “separar o joio do trigo”, justamente com a intenção de se lançar alguns botes ao mar e salvar a classe política ainda não alvejada como o PT.
“É muito diferente de eu pedir para uma empresa colocar R$ 10 milhões na minha campanha e eu me comprometer a ajudá-la com uma privatização. O Supremo considerou, inclusive, que mesmo no caixa 1 pode haver dinheiro vindo de corrupção. Deve-se analisar caso a caso”, afirmou o ex-juiz eleitoral Oscar Juvêncio Borges Neto nesta entrevista aqui.
Ao mesmo tempo em que a Odebrecht delatou em tom menos grave Alckmin e outros, episódios icônicos como o de Eike Batista tentando, sem sucesso, entregar aos procuradores uma lista com políticos do PSDB que receberam dinheiro “por fora”, não vieram ao caso.
A declaração de Delcídio do Amaral e Nestor Ceveró, detalhando corrupção na Petrobras na gestão FHC, também não veio ao caso.
As mesmas empreiteiras processadas pela Lava Jato tinham muito a falar sobre esquemas em diversos estados, mostrando que a Petrobras não era o único bem público dilapidado. Não veio ao caso.
O foco eram os governos Lula e Dilma, segundo definiu a República de Curitiba.
3 – FOCO NO PT
Ao restringir as investigações a governos do PT por conta, inicialmente, da Petrobras, a Lava Jato ajudou a criar o discurso que interessa a oposição: o PT roubou para se manter no poder, fraudou licitações, deu contrapartidas em troca do caixa 2. O PSDB e demais legendas receberam caixa 2 mas não teriam nada a oferecer em troca e, por isso, só praticaram crimes eleitorais.
O recorte feito pela Lava Jato possibilitou a separação do joio e do trigo. Mas também escancarou o viés político da operação.
Em uma das sentenças contra João Vaccari Neto, a Justiça chegou a reconhecer que o ex-tesoureiro do PT não estava sendo condenado por enriquecimento pessoal. Estava sendo condenado por arrecadar propina para campanhas do PT.
O que garantiu que o processo não fosse por crime eleitoral, como ocorre com Alckmin, é justamente a narrativa de contrapartidas envolvendo obras da Petrobras.
Emílio Odebrecht disse em delação que caixa 2 ou era feito para agradar a todos, ou não era feito para ninguém. Ninguém perguntou aos delatores de Alckmin o que a Odebrecht ganhou ou pretendia ganhar com os R$ 10,5 milhões? Em Curitiba, a prática seria de criar um power point para preencher lacunas desse tipo. O mérito desse núcleo da Lava Jato foi justamente ter feito com que um grupo político tivesse problemas sérios com a Justiça por conta de uma prática generalizada.
Na prática, enquanto Vaccari coleciona condenações impostas por Sergio Moro – algumas revertidas em segunda instância porque foram dadas com base em delações sem provas – os que serão investigados por crime eleitoral devem passar longe de pagar pelos crimes narrados. A não ser que o volume de processos decorrentes da Lista de Janot e, depois, da Lista de Fachin, ajudem a criar uma nova jurisprudência.
Isso tudo sem contar que, se em vários processos que envolvem figuras do PT, as delações mostraram carência de provas materiais, a mesma lógica deve valer para o outro lado.
Porque não tem crime comum, porque já prescreveu, porque as delações não têm provas. São várias as justificativas a desequilibrar a balança.
A fórmula de Curitiba conseguiu levar para a cadeia o presidente mais bem avaliado da história e a primeira mulher eleita para comandar o País. Os dois, derrubados por ações questionáveis até no mérito.
Os desdobramentos da crise podem até ter respingado em Alckmin, Aécio Neves, Michel Temer. Mas, como se vê até agora, sem o mesmo peso que teve para o PT.

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