Por Marina Duarte de Souza, compartilhado de Brasil de Fato –
Trabalhadores perderam direitos e tiveram remuneração cortada na pandemia; Federação denuncia falta de diálogo
Nesta terça-feira (18), começou a greve das trabalhadoras e trabalhadores dos Correios de todo o país.
A categoria, considerada essencial durante a pandemia da covid-19, denuncia a ausência de negociação por parte da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e do governo federal, que retirou ou reduziu, de forma unilateral, 70 dos 79 pontos do acordo coletivo, após obter liminar na justiça.
Entenda: Trabalhadores dos Correios entram em greve a partir desta terça (18)
Para a Federação dos Trabalhadores em Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Fentect), as medidas de redução no custo com funcionários e o enxugamento da empresa visam facilitar o processo de privatização dos Correios, anunciado pelo governo Bolsonaro desde o ano passado.
Além disso, as equipes reclamam de negligência na proteção da saúde dos funcionários com falta de Equipamentos de Proteção Individual, guichês de proteção no atendimento. Segundo a entidade, quase 100 trabalhadores já morreram de covid-19.
“A gente tem um acordo de 79 clausuras, eles propõem deixar nove e regulamentada apenas manuais dos Correios, não é nem por legislação. Não dá para confiar nos Correios, nem na direção que não dialoga com ninguém. É um reflexo do governo Bolsonaro, você não tem ação social de diálogo com a classe trabalhadora e, por consequência disso, nós vamos fazer greve”, explica o secretário-geral da Fentect, José Rivaldo da Silva.
Votada em assembleias virtuais nesta segunda-feira (17), de acordo com a federação, a paralisação conta com adesão em todos os estados e nas 36 unidades sindicais, que representam os trabalhadores.
O Brasil de Fato preparou uma lista com o que está em jogo na greve dos Correios, na visão dos trabalhadores:
Retirada de direitos
A Fentect reclama a perda de direitos conquistados durante 30 anos de luta dos trabalhadores.
Estão entre os pontos em que houve cortes: o tempo de licença-maternidade de 180 dias para 120 dias; o pagamento de adicional noturno e de horas extras; a indenização por morte; o auxílio para filhos com necessidades especiais e o auxílio-creche.
Além disso, a empresa não apresentou proposta de reajuste anual para a data-base da categoria.
Plano de saúde
Um dos principais impactos financeiros para os trabalhadores é o aumento no desconto do plano de saúde na folha de pagamento. A ECT passou a adotar a fórmula 50/50 e excluiu os benefícios para pais dos funcionários. Anteriormente, a empresa pagava 70%. Segundo a Fentect, muitos não terão como arcar o benefício e ficarão sem o plano de saúde durante a pandemia.
Baixa remuneração
Trabalhadores e trabalhadores dos Correios recebem em média um salário de R$ 1,8 mil. A revogação do acordo coletivo, deixou a categoria sem benefícios que complementam a remuneração-base, impactando significativamente na remuneração.
Conforme demonstração financeira dos Correios, a menor remuneração paga pela empresa caiu para R$ 1.363 em 2019, ante R$ 1.647 no ano anterior. A queda foi de 17%.
A maior, da presidência, mantém-se em R$ 52.619 – 38,6 vezes mais. Já diretores da ECT recebem R$ 45.847.
Lucro
Embora, a administração federal argumente que o corte de direitos dos trabalhadores ocorre em decorrência da “crise financeira ocasionada pela pandemia”, os Correios registram maior volume de rendimentos devido ao crescimento de entregas durante a quarentena.
Segundo a Fentect, a estimativa de lucro deste ano é de R$ 800 milhões até o final do ano.
No ano passado, a ECT teve receita líquida de R$ 18,356 bilhões. E registrou lucro líquido de R$ 102,121 milhões. A empresa fechou 2019 com 99.443 funcionários, ante 105.349 no ano anterior (-5,61%).
Do total de receitas, 22,1% vem de serviços de Sedex e 21,3%, do PAC. Havia 11.124 unidades de atendimento, sendo 6.071 agências próprias e 5.053 terceirizadas.
Risco à saúde
De acordo com os sindicatos, o fornecimento pelos Correios de álcool em gel, máscaras para os funcionários e produtos para desinfecção de pacotes e agências só ocorreu após ações judiciais dos sindicatos. Ainda há falta de EPIs.
Há um déficit também na instalação dos painéis de acrílico nos balcões dos Correios, há 11 mil pontos de atendimento no país, segundo a empresa, apenas 5 mil painéis foram instalados.
Dois pesos, duas medidas
Outro argumento da Fentect contra a falta de recursos colocada pelo governo federal é a contratação de militares para ocuparem cargos nos Correios e criação de novas assessorias especiais.
De acordo com a organização, já são mais de 10 militares em cargos estratégicos da direção dos Correios e suas subsidiárias ganhando salários de R$ 30 a R$ 46 mil.
Outros direitos retirados:
– vale-cultura;
– anuênios;
– adicional de atividade de distribuição e coleta (AADC);
– adicional de atividade de tratamento (AAT);
– adicional de atividade de guichê (AAG);
– altera a data do dia do pagamento;
– pagamento de 70% a mais da hora normal quando há hora extra trabalhada, a legislação prevê 100%;
– pagamento de 70% das férias;
– aumento no compartilhamento do vale-refeição;
– fim da entrega matutina;
– garantia de pagamento durante afastamento pelo INSS;
– vale nas férias;
– vale nos afastamentos por licença médica;
– para motoristas, é o fim da cláusula sobre acidente de trânsito;
– garantias do empregado estudante;
– licença adoção;
– acesso às dependências pelo sindicato;
– atestado de acompanhamento;
– itens de proteção na baixa umidade;
– reabilitação profissional;
– adicional noturno;
– repouso no domingo;
– jornada de 40hs;
– pagamento de 15% aos sábados.
Outro lado
A assessoria de imprensa dos Correiros informou em nota ao Brasil de Fato que não afirmou se priorizou os direitos dos trabalhadores nas negociações com as entidades sindicais, mas sim que desde o início tem como “objetivo primordial cuidar da saúde financeira da empresa, a fim de retomar seu poder de investimento e sua estabilidade, para se proteger da crise financeira ocasionada pela pandemia”.
O texto ainda afirma que a ordem de contenção de despesas por parte do governo federal é de R$ 600 milhões anuais.“Respaldados por orientação da Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST), bem como por diretrizes do Ministério da Economia, os Correios se veem obrigados a zelar pelo reequilíbrio do caixa financeiro da empresa. Em parte, isso significa repensar a concessão de benefícios que extrapolem a prática de mercado e a legislação vigente”, diz a nota.
Em relação a proteção a saúde dos funcionários e população, a empresa pública afirmou que disponibilizou os EPIs, suspendeu a assinatura do destinatário na entrega de objetos postais, instalou painéis de acrílico em mais de 5 mil guichês de atendimento e nos centros operacionais, e promoveu a reorganização das estações de trabalho, para manter o distanciamento recomendado.
O número de guichês ainda fica aquém da realidade. Os Correios têm cerca de 11 mil pontos de atendimento em mais de 5.500 municípios brasileiros.
Sobre cargos para assessores especiais a estatal não negou e apenas informou que “trata-se de inciativa da Postal Saúde, que tem administração própria, com representantes dos Correios no Conselho Deliberativo”. O órgão não se pronunciou sobre a privatização da estatal.
Com informações Rede Brasil Atual
Edição: Rodrigo Chagas