Publicado no Brasil 247 –
Gabriela Monteiro relatou no Facebook constrangimento em sala de aula ao ouvir de duas professoras piadas e comentários racistas sobre seu cabelo afro: “Havia chegado em sala de aula com meus cabelos soltos, e a professora estava dando orientação para uma aluna, parou o que estava fazendo, e me fez a seguinte pergunta: ‘Qual seu signo, Leão?”
Estudante do curso de Design de Moda da PUC-Rio, Gabriela Monteiro relatou no Facebook constrangimento em sala de aula ao ouvir de duas professoras piadas e comentários racistas sobre cabelo afro. Ela também registrou queixa na 12ª DP (Copacabana).
Leia o post de Gabriela Monteiro:
Sobre o Racismo nosso de Todo Dia
ps: esssa foto é só pra deixar claro que continuarei botando meu cabelo pra cima SEMPREEEEE!
fotografia: Renato Galvão
Sabe aquele nó na garganta, aquela angústia que vc sente lá no fundo, e a falta de certeza sobre qual o melhor caminho pra escolher?
Então eu tenho me sentido assim desde o final de dezembro, qnd pela primeira vez eu soube que repeti uma matéria na Puc-Rj, faculdade que estudo Design de Moda.
Essa matéria foi Projeto de Design de Moda, que tem dois professores responsáveis pela a aula simultaneamente, nesse caso foram Ana Luiza Morales e Tatiana Rybalowski . No início do ano letivo passei por 3 situações ( protagonizado pelas próprias professoras) de preconceito velado, que para mim é o pior, pois acaba sendo encarado como piada/brincadeira, e com certa naturalidade por quem o pratica e por grande parte das pessoas, a sutileza das palavras de cunho preconceituoso acaba soando de forma natural e se entranha com certa normalidade em nosso cotidiano.
Em geral sou a única negra nas aulas de Design de Moda, (afinal, como isso ainda é possível já que grande parte da população é negra?) mas até o semestre passado eu não havia tido qlqr problema de relacionamento na universidade por conta disso, muito pelo contrário, foi na Puc que compreendi que assumir minhas característica de mulher negra, não era um problema.
Situação 1- Até que em uma das aulas de Projeto, tendo cerca de 25 alunas em sala, a professora (que tbm é coordenadora do curso de Moda) Ana Luiza, resolveu dividir com a turma uma de suas experiências de ir ao cinema. Ela comentou perante TODA TURMA, como uma mulher que estava usando o cabelo afro parecido com o meu, segundo a própria professora, era inconveniente por ir ao cinema com seu cabelo em sua forma natural, pois ao sentar na poltrona em sua frente, o cabelo da mulher era um empecilho para visualizar a tela do cinema. Em um primeiro momento não percebi a gravidade da declaração até minhas colegas de turma comentarem comigo o quão absurdo aquilo. Fiquei sem reação, e o desconforto de estar em sala de aula passou a ser uma realidade.
Situação 2- Algumas semanas depois Ana Luiza voltou com o mesmo comentário perante a turma toda, se voltado para mim, ela disse que mais uma vez outra menina, com o cabelo similar ao meu havia se sentado em sua frente novamente, e dessa vez o inconveniente era tanto que a professora teve que mudar de poltrona para visualizar melhor a tela de cinema. Neste momento,não acreditei que ela estava repetindo a mesma história de forma tão natural, retruquei dizendo que o fato de ter cada vez mais mulheres de cabelo afro era uma coisa maravilhosa, já que em nossa sociedade existe uma ditadura da “chapinha”, e o que aconteceu com ela era sinal de que as mulheres de cabelo crespo estão se libertando dessa ditadura.
Situação 3- O momento que passei a me sentir ainda mais deslocada, desconfortável e retraída em sala de aula foi depois de uma pergunta maldosa e preconceituosa feita pela professora Tatiana, em frente de toda turma. Eu havia chegado em sala de aula com meus cabelos soltos, e a professora estava dando orientação para uma aluna, parou o q estava fazendo e me fez a seguinte pergunta : “Qual seu signo, Leão ?” e deu um risinho sínico.
Fiquei tão chocada que não tive reação a essa pergunta preconceituosa.
Durante todo o semestre não me senti confortável e á vontade para ir para as aulas com a Ana Luiza e Tatiana, ou pra pedir qualquer orientação para desenvolver meu trabalho, mas eu estava presente nas aulas dos outros professores que colaboram pra essa matéria. O que me prejudicou claramente, talvez eu não devesse ter deixado, mas infelizmente essas situações me afetaram, e resultaram na repetência.
O nó, e a angustia que me referi no início do texto é por conta da decisão de tomar uma atitude, não apenas ficar reclamando pro vento, mas buscar meus direitos juridicamente! Primeiro refleti sobre as possíveis retalhações que posso sofrer na própria universidade, já que não existem outras opões de professores para essa matéria, depois veio a dificuldade de encontrar um advogado que estivesse disposto a me orientar, e por último o constrangimento de registrar o caso na delegacia, que definitivamente não está preparada para receber pessoas que sofrem preconceito, eu e minha mãe fomos tratadas de forma grosseira, com descaso por parte do policial que me recebeu.
A questão é, não são apenas palavras, é todo o contexto, enquanto eu sou a única negra em uma sala de aula, e ainda surgirem comentários por parte de professores de que a minhas características físicas são inconvenientes, tenho certeza que está tudo errado!
Enquanto uma professora, que não tenho a menor intimidade, achar tranquilo me comparar com um Leão pq está associando meu cabelo a juba do animal, continuo achando que está tudo errado, e não posso fugir dessa luta!
Afinal porque será que existe tanta intolerância em relação a figura do negro, mesmo anos após o fim da escravidão por que ainda incomodamos tanto????
Além desses 3 momentos vividos por mim na universidade, em todos os lugares que vou sinto constantemente os olhares de desprezo e incomodo de algumas pessoas quando me veem.
O que ainda me espanta é saber que a Puc, que defende em seu discurso a diversidade de etnias e religiões, tem em seu corpo de funcionários professoras que agem de forma retrograda e preconceituosa. Sendo um instituição respeitada internacionalmente, acho que a universidade deve zelar para que os seus funcionários ao menos respeitem a diversidade que o ambiente universitário proporciona.
A verdade é que o que está me movendo é um grito está entalado em minha garganta a tempo, TODOS DEVEM TER OS MESMO DIREITOS GARANTIDOS e isso não deve ser alcançado com mais dificuldades pra uns do que pra outros, chega de eu ser a única enquanto eu sei que existem milhares de meninas e meninos que poderiam estar aproveitando das mesmas oportunidades que eu! E atenção, esse não é um problema apenas dos negros é um problema de todos nos que vivemos nessa sociedade, ou vcs acham que o motivo de tanta violência é qual, acham realmente que td bandido acha maneiro ser bandido, ou é simplesmente falta de oportunidade e condições de ter uma vida digna????
Por isso resolvi me expor e ver no que dá! O ano letivo irá recomeça na próxima semana, o sentimento de angustia se transforma em sensação de estar fazendo a coisa certa mesmo eu estando apreensiva!!”