Por LN Lucas Negrisoli *, publicado no Portal EM –
Denúncias dos casos de racismo foram feitas nas redes sociais e, de acordo com estudantes, situações como essa são recorrentes
“Olha o meu rosto, você acha mesmo que eu vou ser presa?”. Essa frase teria sido dita por uma aluna de direito da PUC-Rio ao ser confrontada junto a outros colegas por estudantes da UERJ que apontaram atitudes racistas durante uma partida dos Jogos Jurídicos, evento que reuniu diversas universidades cariocas para competições esportivas, de 31 de maio a 3 de junho. De acordo com um dos estudantes que presenciou a cena, alunos da PUC-Rio saíram do ginásio em que acontecia um dos jogos e imitaram macacos para provocar alunos de direito da UERJ. Em outra situação, um estudante jogou cascas de banana contra um atleta negro da Universidade Católica de Petrópolis (UCP). Um terceiro caso, em que uma jogadora da Universidade Federal Fluminense (UFF) foi chamada de “macaca” durante a partida final de handebol feminino, também foi relatado. “Diante do racismo, evidentemente os alunos da UERJ ficaram revoltados. Nisso, uma menina da PUC-Rio vira para a gente e diz: ‘Olha o meu rosto, você acha mesmo que eu vou ser presa?’”, afirmou o aluno. “Muito triste e revoltante o que está acontecendo”, relatou outro aluno no Twitter.
“Os jogos jurídicos universitários nunca foram um espaço confortável para pessoas negras”, afirmou em nota a campanha Jogos sem Racismo, que desde 2017 luta contra episódios como este no evento. De acordo com o texto, na madrugada deste domingo (3), eles informaram a reunião oficial da Liga Jurídica Estadual, responsável por organizar os Jogos Jurídicos, para “manifestar novamente nossa indignação com os violentos crimes de racismo ocorridos durante o evento”. A nota diz, também, que no sábado (2) eles já haviam comparecido à reunião e pediram uma posição da organização sobre os eventos de racismo que vinham acontecendo. “Diante de um crime, a Liga havia punido a Atlética da PUC-Rio apenas com o compromisso de elaboração de uma breve nota, o pagamento de uma multa irrisória de R$ 500 e a suspensão da torcida em um jogo sem expressividade alguma”, explica a nota.
Depois disso, a organização dos Jogos Jurídicos decretou que, como punição para os casos de racismo, não haverá faculdade vencedora neste ano. A aluna do quinto período de direito da UERJ, Mariana Carlou, que faz parte da campanha Jogos Sem Racismo, afirma que situações assim são comuns no evento. “O racismo sempre aconteceu nos jogos. No ano passado, vimos uma real necessidade de criar a campanha para lutar contra esses episódios”, explica. De acordo com ela, o alcance das denúncias nas redes sociais foi uma surpresa. “Lutamos contra isso há tempos e não vemos muitos resultados positivos. Esses jogos, apesar de tudo, vieram com uma surpresa boa: a PUC-Rio realmente foi punida. Muitas vezes isso passa batido”, afirma. “Realmente espero que a PUC ajude a gente a identificar essas pessoas para que as pessoas que foram vítimas desses atos tenham a oportunidade de processá-las por injúria racial”, aponta.
O aluno da UFRJ, Gabriel Trancozo, foi um das pessoas que denunciou os casos de racismo nas redes sociais. De acordo com ele, que apesar de não ter participado do evento teve contato com os incidentes, o assunto foi largamente comentado na universidade. “Nesse fim de semana, esses casos de racismo foram os mais comentados entre os alunos da universidade dentro dos grupos e acabou ganhando a internet toda no geral”, relata. “O estudante negro dentro de uma instituição de ensino superior ainda é obrigado a passar por esse tipo de coisa, tanto explicitamente (como no caso dos estudantes da PUC-Rio) quanto de forma mais implícita, às vezes”, lamenta. Para o estudante, é preocupante que tais situações aconteçam no berço do poder judiciário brasileiro. “O mais grave de toda essa história é que daqui a um tempo os envolvidos nesse caso de racismo serão os profissionais encarregados de tocarem a Justiça brasileira. E é bastante desanimador como negro observar que os possíveis futuros desembargadores, juízes e promotores ainda carregam essa mentalidade”, termina. Saiba mais: A construção histórica do racismo no Brasil
Em nota, a PUC-Rio declarou que tomou conhecimento das denúncias e que a Vice-Reitoria para Assuntos Comunitários junto ao Departamento de Direito da universidade construirá uma comissão disciplinar para averiguar as informações. De acordo com a universidade, caso confirmada a veracidade dos depoimentos, haverá a “individualização das responsabilidades de membros do corpo discente”. A PUC-Rio informou que a comissão terá um prazo de 15 dias para elaborar o relatório.
* Estagiário sob supervisão da sub-editora Ellen Cristie