Amazônia precisa de quase dois milhões de painéis solares para luz chegar a todos

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Região ainda tem 990 mil pessoas sem acesso a energia elétrica; estudo do Iema mostra desafios para instalação de sistemas e gestão de resíduos eletrônicos

Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto Colabora




NA foto: Residência alimentada com energia de painéis solares: Amazônia vai precisar de até 12 milhões de equipamentos – módulos fotovoltaicos e baterias – para levar luz a toda a população da região (Foto: Divulgação)

O Brasil precisa instalar, pelo menos, 1,7 milhão de painéis solares para levar luz a toda a Amazônia, onde, atualmente, 990 mil pessoas vivem sem acesso à energia elétrica. O cálculo está no estudo “Sistemas Fotovoltaicos na Amazônia Legal: avaliação e proposição de políticas públicas de universalização de energia elétrica e logística reversa”, lançado pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), nesta quinta-feira, (04/05). Além da quantidade de equipamentos – módulos fotovoltaicos e baterias – para o alcance das metas de universalização do Programa Mais Luz para a Amazônia (MLA), lançado em 2020, o trabalho também estimou os resíduos a serem produzidos por esses sistemas de energia.

O MLA indica a necessidade de levar energia elétrica a 219.221 unidades consumidoras – residências, principalmente, mas também escola e postos de saúde –, desconectadas do Sistema Interligado Nacional (SIN), que distribui energia para a maior parte do país. “A justa garantia de acesso à eletricidade para comunidades remotas da Amazônia, dependendo da velocidade a ser dada ao processo, exigirá um fornecimento contínuo e estável de componentes para sistemas de geração (painéis, baterias, etc.) e os serviços associados”, afirmou André Luis Ferreira, diretor-presidente do Iema, em encontro com jornalistas que antecedeu o lançamento do estudo.

De acordo com o relatório do Iema, seria necessário o emprego de quase três milhões de equipamentos – exatamente 1.753.770 painéis solares e quase 800 mil baterias – ao longo da vida útil dos sistemas, no caso do cenário de atendimento com Sistema Individual de Geração de Energia Elétrica com Fonte Intermitente (SIGFI) de 45 kWh/mês, que é o sistema atualmente planejado pelo MLA. A estimativa do Iema aponta para 12 milhões de equipamentos – 6,5 milhões de módulos fotovoltaicos e 5,5 milhões de baterias – caso a opção seja pelo atendimento com SIGFI de 180 kWh/mês com bateria de chumbo-ácido, o que garantiria uma disponibilidade maior de energia.

O programa Mais Luz para a Amazônia (MLA) prevê o acesso à energia elétrica da região da Amazônia Legal unicamente por fontes renováveis de geração de eletricidade – a opção foi a energia solar, mais fácil de ser implantada através de pequenas unidades. “Essa obrigatoriedade é uma decisão coerente, já que se busca realizar o acesso à energia elétrica de forma sustentável na região, sobretudo por atender às unidades consumidoras excluídas do serviço público de acesso. Assim, a implementação da tecnologia solar fotovoltaica como possível alternativa é bastante adequada”, aponta o estudo do Iema.

Para os envolvidos no trabalho, garantir o efetivo gerenciamento da instalação e retirada de resíduos dessas regiões remotas é um desafio que requer uma cadeia estruturada. Hoje em dia, mais de 90% dos principais equipamentos dos sistemas fotovoltaicos são importados e a indústria existente está concentrada nas Regiões Sudeste e Sul do país.

A transição energética justa passa pela inclusão energética tanto em centros urbanos periféricos quanto em áreas ambientalmente sensíveis, como a Amazônia. O abastecimento à população ainda sem acesso a esse serviço deve vir necessariamente acompanhado de políticas públicas capazes de integrar os desafios de recursos e governança para evitar que o problema atual da falta de luz não seja substituído por outro problema de acúmulo de resíduos no futuro

Ricardo BaiteloGerente de projetos do Iema

Ainda é reduzido o número de empresas integradoras na Região Norte e faltam informações sobre os sistemas off-grid (não conectados à rede da distribuidora de energia elétrica) instalados e em operação no Brasil. “Dados e informações consolidados são essenciais para qualquer política pública. A falta desses dificulta a medição, o monitoramento e o seu planejamento e execução efetiva como metas, alocação de recursos e mecanismos de gestão para garantir a sustentabilidade de longo prazo. É o caso dos programas de eletrificação, que exigem um ciclo completo de atendimento, desde a identificação e localização das pessoas sem acesso à energia elétrica até a destinação dos resíduos gerados”, explica Vinicius Silva, um dos autores do estudo.

O trabalho do Iema aponta que há dois grandes desafios a serem superados para levar o acesso à energia a toda a Amazônia: o planejamento e a execução da instalação de milhares de sistemas off-grid em áreas remotas, distribuídas em um vasto território com pouca infraestrutura logística de transporte e comunicação; e o planejamento e execução da retirada e reciclagem dos resíduos a serem gerados (módulos fotovoltaicos, baterias e componentes) em escala e de forma distribuída. “O futuro descomissionamento (desativação) e reposição desses sistemas deve ser feito de forma adequada, a fim de evitar riscos ambientais em áreas sensíveis. São desafios que exigem maior envolvimento por parte dos fabricantes de equipamentos, das distribuidoras de energia elétrica e dos órgãos públicos”, disse André Luis Ferreira

Estudo do Iema mostra desafios na instalação de equipamento e gestão de resíduos (Arte: Iema)
Estudo do Iema mostra desafios na instalação de equipamento e gestão de resíduos (Arte: Iema)

Gestão de resíduos

O estudo do Iema também analisou o tratamento dos resíduos a partir da instalação dos equipamentos de energia solar para atender o Mais Luz na Amazônia. No final da vida útil dos sistemas instalados, seriam produzidas entre 71 mil e 237 mil toneladas de resíduos. Os módulos fotovoltaicos têm vida útil semelhante – cerca de 30 anos – mas o volume de resíduos gerados pelos sistemas individuais de geração de energia elétrica variam por conta das babterias. Apenas o SIGFI 180, com baterias de chumbo-ácido que duram cerca de três anos, geraria cerca de 7 mil toneladas/ano de resíduo, o que corresponde a quase o dobro dos resíduos eletrônicos coletados no Brasil em 2021. Já os SIGFI 45 – com bateria de íon-lítio, que duram até 15 anos, corresponderiam a 2 mil toneladas.

Em sistemas isolados da rede de energia elétrica, as baterias são necessárias para estocar a energia solar para uso em momentos posteriores. No estudo, foram avaliados dois tipos: chumbo-ácido, já empregada pelo mercado e com preço acessível; e íon-lítio, mais eficiente, porém exige maior cuidado ao manusear e ainda falta ser adequadamente regulamentada pela política de resíduos sólidos brasileira.

O estudo aponta que, embora a maioria dos componentes dos sistemas fotovoltaicos seja reciclável, a logística reversa para eles é praticamente inexistente na Amazônia Legal: apenas 58 dos 808 municípios contam com o serviço. “A transição energética justa passa pela inclusão energética tanto em centros urbanos periféricos quanto em áreas ambientalmente sensíveis, como a Amazônia. O abastecimento à população ainda sem acesso a esse serviço deve vir necessariamente acompanhado de políticas públicas capazes de integrar os desafios de recursos e governança para evitar que o problema atual da falta de luz não seja substituído por outro problema de acúmulo de resíduos no futuro”, afirmou Ricardo Baitelo, gerente de projetos do Iema.

No encontro com os jornalistas, o diretor-presidente do Iema lembrou ainda que o Mais Luz para a Amazônia é um programa social, destinado a garantir o acesso à energia elétrica para aqueles que ainda não têm esse direito básico. “Há outro desafio que é garantir infraestrutura, inclusive energética, para o desenvolvimento da região, para atender ao modelo com programas com base no conceito de floresta em pé. Isso também exige articulação dos governos e das empresas de energia”, afirmou André Luís Ferreira.

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