Aos 75 anos, Paulinho da Viola estreia em redes sociais

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Da Folhapress, publicado em Bem Paraná – 

É uma estreia improvável para um senhor de 75 anos, em particular este senhor: neste domingo (12), seu aniversário, Paulinho da Viola vai passar a existir nas redes sociais, com a criação de seus perfis no Facebook e no Instagram.

Notoriamente tímido e avesso a qualquer tipo de cacofonia, o cantor e compositor ainda soa desconfiado em relação à empreitada. “Eu sou um cara do século 19, sou marceneiro, toco cavaquinho e violão, entende? Não tenho nada a ver com isso aí, isso é uma coisa de outro tempo.” Sua família, no entanto, o convenceu da importância de estar presente nessas redes que concentram quase 3 bilhões de pessoas atualmente. “A gente mostrou que é uma oportunidade de ter um canal direto com as pessoas interessadas no trabalho dele”, diz João Rebello, seu filho. “Há muita coisa que pode ser mostrada para o público. Claro, se ele quiser, se ele se sentir à vontade.” Não é só a exposição que incomoda o reservado Paulinho nas redes, mas o constante flá-flu ideológico (ainda mais para um vascaíno). “Posso ter razão, mas, se eu tiver que entrar numa discussão para explicar, é complicado.”

O sambista recebeu a Folha de S.Paulo em sua casa, na Barra da Tijuca, na terça (7). Não se furtou a falar sobre política, posicionando-se à esquerda, contra “esse capitalismo que tem uma concentração de renda cada vez maior num número menor de pessoas”.

PERGUNTA – Como o sr. foi convencido a entrar nas redes sociais?

PAULINHO DA VIOLA – Olha, quando começou essa coisa de informação digital, eu já brincava dizendo que não era para mim. Sou um cara do século 19, marceneiro, toco cavaquinho e violão, entende? Hoje em dia, o comportamento e os valores são outros, as pessoas se relacionam de uma maneira diferente. Já tenho muita coisa que não resolvo com o tempo que tenho, como é que vou entrar em mais uma coisa em que vejo todo mundo absorvido por aquilo?

P. – O sr. tem um computador?

PV – Tinha um em que me comunicava com outras pessoas, e-mails, tudo assim. Aí começam a mandar um monte de coisa, você tem de mergulhar naquilo e ficar, não pode fazer outra coisa. E eu gosto de conversar, para eu mandar um bilhete é muito complicado. Começo a escrever, aí paro, “não, essa palavra tá errada”, e não escrevo. Sempre fui uma pessoa muito reclusa também, prezo muito o silêncio, para conversar tem de ser um ambiente quieto, para a gente discutir alguma coisa, refletir sobre aquilo. Se estiver conversando um assunto e for interrompido, não sei mais do que estava falando.

P. – A estreia dos seus perfis on-line coincide com seu aniversário. Como o sr. está, aos 75?

PV – Sou muito consciente de certas coisas. Adorava futebol, era peladeiro, joguei na praia, no time da Portela, era uma delícia. Teve um momento, já tinha 50 e poucos anos, em que pensei “não quero mais ficar correndo atrás de bola”. Rapaz, me deu uma coisa, eu perdi completamente a vontade de jogar. Mas ainda vejo futebol, acompanho Copa, vejo meu time [Vasco] jogar. Eu gostava de fazer coisas mais pesadas na carpintaria, pegar peso, era algo que eu precisava, assim como tem gente que vai para academia malhar. Chega um ponto em que você não pode mais, vai pegar uma coisa e aquilo não sai do chão. Aí você diz “pô, peraí, não posso insistir”.

P. – Muitos artistas polarizam opiniões na internet por suas posições políticas. O sr. não é de se envolver em polêmicas.

PV – Tudo que você diz tem sempre gente que discorda. O problema é se você estiver disposto a entrar nisso. Confesso que eu não tenho essa energia. Posso ter razão, mas, se eu tiver que entrar numa discussão para explicar, é complicado. O que não quer dizer que eu não tenha minha opinião, e já a manifestei várias vezes.

P. – O sr. já declarou apoio a um candidato à Presidência?

PV – Quando o Roberto Freire foi candidato pelo PCB, em 1989, eu cheguei a dizer que ia levar a minha caneta Parker, que foi do meu pai, para votar nele. Participei de festas do partido e tudo. Mas comecei a me questionar sobre isso. Por que artista tem de dizer “olha, estou com não sei quem”? Não sei se isso é importante. A gente tem que tomar cuidado. Tenho revistas com depoimentos de várias pessoas influentes de esquerda quando o PCB foi legalizado. Você vê os depoimentos de época e o que as pessoas dizem agora. Não acompanham o que a história está ensinando. E discutir isso é muito difícil. É mais fácil sair para o pau.

P. – O sr. se mantém ideologicamente alinhado ao PCB?

PV – Não sei. Posso te dizer que sou um homem de esquerda. Tem algumas coisas que são de princípio. Quando você pensa e age num sentido em que fica claro que o seu trabalho está de acordo com a vontade de uma maioria, daqueles que você sabe que historicamente são os mais prejudicados. Quando você luta por questões que têm a ver com o chamado bem comum. Você pode ter um sujeito que tem soluções à direita para resolver questões das classes mais prejudicadas por todo esse processo desse capitalismo. Mas tem outras que acham que essa preocupação não deve existir, é o salve-se quem puder, o individualismo. A gente sabe que toda discussão em torno da distribuição dos bens comuns passa por uma outra arquitetura econômica e social. Não posso aceitar que a solução proposta por alguns para resolver problemas de violência seja matar.

P. – O sr. se refere ao Bolsonaro?

PV – Não, não estou falando o nome de ninguém. Nunca vi declaração [dele], seria uma leviandade se eu fosse falar de algo que não ouvi. Por outro lado, tem coisas com que você não pode concordar. Não acho que você tenha que fazer alianças por uma questão de poder. Não estou nem falando de questões econômicas, que eu não entendo.

P. – O sr. vai votar na próxima eleição?

PV – Pretendo votar. Vai ser uma eleição muito dura, porque quem assumir isso aí já sabe que vai pegar uma barra muito pesada. Acho que não vai aparecer um candidato capaz de unificar o país. Estamos vivendo uma fragmentação, uma confusão para a maioria sobre tudo isso que vem acontecendo: Lava Jato, gente presa, corrupção, denúncia contra o fulano, delação. Tem muita gente que está pensando só em si mesma, entendeu? Como é que a gente vai encarar isso? “Votando certo”. Tá certo, mas como? Vamos pensar, refletir mais. Tem muita gente falando. Todo mundo fala, parece que as pessoas estão viciadas em desabafar. E a práxis? A práxis é que é fogo. Teorias, a gente tem todas. Mas, basicamente, o que você tem hoje é um processo que favorece um número cada vez menor de pessoas em detrimento da grande maioria, no mundo inteiro. Isso não vai continuar assim.

MARCO AURÉLIO CANÔNICO RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) –

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