Redação – Um governo que esconde as empresas que praticam o trabalho escravo. Este é o governo golpista de Temer. A chamada grande imprensa também não fez nenhum esforço em divulgar a omissão do governo Temer, que lutou “bravamente”, na Justiça para continuar a não divulgar a lista das empresas escravocratas. Pergunta: que país é este onde o governo e a sua mídia aliada fazem o possível para esconder quem escraviza?
Mas, neste caso, o Ministério Público, o do Trabalho, foi à luta e recuperou o direito de vermos quais as empresas foram autuadas com trabalho escravo.
Vejam aqui o texto sobre esta luta no site da Crivelli Advogados Associados:
Dando fim a uma disputa judicial que começou há três anos e se agravou nos últimos meses, o governo federal finalmente liberou na semana passada (23) a lista suja com os empregadores autuados por manterem trabalhadores em condição análoga à escravidão em suas empresas.
De 2011 até final do ano passado, foram encontradas 503 pessoas em situação de escravidão. O setor que mais incide neste tipo de irregularidade é o agrário, constando 45 fazendas no total. Além disso, houve incidência de trabalhadores em situação de escravidão nos setores da construção civil, da produção de carvão e extração de madeiras. Do total de empresas, 10 são da área de construção.
A veiculação da lista suja tem como efeitos práticos, por exemplo, o impedimento de crédito e empréstimo às empresas listadas pelo uso de trabalho escravo por parte dos bancos públicos, como medida a desencorajar a prática atualmente disseminada.
Entenda o caso
Faltavam nove dias para o final de 2014 quando ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski suspendeu a divulgação da “lista suja” que identifica todas as empresas que foram judicialmente indiciadas por manterem práticas trabalhistas de escravidão moderna. Em maio de 2016, a atual presidente do STF ministra Cármen Lúcia suspendeu a revogação. Mesmo com a suspensão, o Ministério do Trabalho não voltou a publicá-la.
Em nova pedido ao judiciário em janeiro deste ano, o juiz Rubens Curado Silveira, titular da 11ª Vara do Trabalho, concedeu liminar para obrigar o governo federal a publicar a lista novamente. A União mais uma vez recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho, que manteve a determinação.
O prazo para a divulgação se encerrava dia 7 de março. Foi quando Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu da liminar, tendo o pedido sido negado pelo presidente do Tribunal Regional do Trabalho de Brasília, desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, no dia 6. No mesmo dia, o governo recorreu ao presidente do TST, Ives Gandra, que aceitou os argumentos da AGU.
No dia 6 de março, após um pedido feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra Martins Filho, derrubou a liminar que obrigava o Ministério do Trabalho a divulgar o documento. De acordo com reportagem veiculada pelo El País no dia 12 de março, a AGU, que representa o Governo na Justiça, declarou que o objetivo da medida é “dar mais segurança jurídica para a política pública, reduzindo o número de questionamentos judiciais à publicação”.
Ao decidir, Ives Gandra disse que não cabe ao Judiciário exercer ingerência sobre a atuação do Ministério do Trabalho. “O nobre e justo fim de combate ao trabalho escravo não justifica atropelar o Estado Democrático de Direito, o devido processo legal, a presunção de inocência e o direito à ampla defesa”, alegou o ministro.
O Ministério Público do Trabalho recorreu da decisão e, no dia 14 de março, o ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, do TST, derrubou a liminar determinando ao Ministério do Trabalho que divulgasse o cadastro.
Lista suja
A lista suja, que começou a ser publicada pelo governo federal em 2003, é considerada um dos principais instrumentos de combate ao trabalho escravo no Brasil – e, segundo especialistas e instituições que combatem o problema no mundo (como a Organização Internacional do Trabalho), é um modelo a ser seguido por outros países.
Desde sua criação, empresas e bancos públicos puderam ter acesso a informações sobre as práticas trabalhistas de cada empresa e, assim, negar crédito, empréstimos e contratos a fazendeiros e empresários que usam trabalho análogo ao escravo.
A chamada escravidão moderna atinge mais de 45,8 milhões de pessoas no mundo, segundo a edição mais recente do Índice Global de Escravidão, publicada pela Fundação Walk Free, da Austrália, divulgada em junho de 2016.
De acordo com a BBC Brasil, a Walk Free estima serem 161,1 mil os trabalhadores em condições análogas à escravidão. Em 2014, eram 155,3 mil.
“Divulgar este cadastro é uma política de Estado, e não de governo. As políticas de combate ao trabalho escravo começaram no governo FHC e (foram) continuadas nos governos Lula e Dilma. Ela não depende de contornos ideológicos e partidários. Se esta for uma decisão com cunhos ideológicos, não pode prevalecer”, afirmou Cavalcanti.
Novas regras
A suspensão da lista foi autorizada por Lewandowski ao responder a uma ação da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), organização que reúne algumas das principais empreiteiras do país.
De acordo com reportagem da BBC Brasil em 2015, entre as construtoras que fazem parte da associação estão Andrade Gutierrez, Moura Dubeux e Odebrecht, denunciada pelo Ministério Público do Trabalho por uso de trabalho escravo.
No processo, a Abrainc argumentou sobre a legalidade da exposição das empresas condenadas e dizia que a portaria do Ministério do Trabalho deixava de garantir o direito à ampla defesa dos empregadores.
Desde então, a Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), órgão do ministério, vem tentando reativar a publicação. Em março de 2015, uma portaria tentava “driblar” a decisão do STF, baseando-se na Lei de Acesso à Informação para divulgar os nomes.
Mesmo assim, a ministra Cármem Lúcia, que estava encarregada da decisão final sobre o tema, considerou que a liminar de Lewandowski continuava a impedir a divulgação.
Em maio, pouco antes de deixar o governo, a presidente Dilma Rousseff assinou uma nova portaria sobre a lista, determinando que o documento passaria a ter duas relações diferentes de empregadores, que seriam publicadas de uma só vez.
“É como se fossem duas listas em uma”, explica Tiago Cavalcanti. De um lado estarão empregadores que foram condenados e admitiram o erro, comprometendo-se a corrigir sua cadeia produtiva. De outra, os que não o fizeram.
“Quando a empresa é autuada pelo flagrante de trabalho escravo, começa um processo, a empresa recorre e esse processo é julgado pelos ministérios do Trabalho e da Justiça. Quando há uma decisão e a empresa é condenada, o nome dela vai para a lista”, diz o procurador.
“Mas, se durante esse processo, o empregador assinar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) e fizer acordos no âmbito da Justiça do Trabalho, o nome dele vai para outra lista, porque se ele comprometeu perante a justiça a corrigir os problemas.”
Após a nova resolução, a ministra do STF determinou a perda de objeto da ação da Abrainc, afirmando que os problemas apontados pelo órgão haviam sido resolvidos com as novas normas.
Bancada Ruralista
Para os especialistas entrevistados pela BBC Brasil, a pressão da bancada ruralista e de congressistas ligados ao empresariado pode ser um dos fatores que explicaria o atraso da lista.
Segundo o Código Penal Brasileiro, o trabalho análogo ao escravo é caracterizado por quatro elementos, que podem ser comprovados juntos ou isoladamente: condições degradantes de trabalho, que coloquem em risco a saúde e a vida do trabalhador; jornada exaustiva, em que o trabalhador é submetido a esforço excessivo ou sobrecarga; trabalho forçado, em que a pessoa é mantida no serviço através de fraudes, isolamento geográfico ou ameaça e violência e servidão por dívida, em que a pessoa é forçada ilegalmente a contrair uma dívida e trabalhar para pagá-la.
Mas pelo menos três projetos de lei, em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado, querem retirar os termos “jornada exaustiva” e “condições degradantes de trabalho” desta definição.
Um deles, PL 3842/2012, foi aprovado na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento Desenvolvimento Rural em abril e aguarda votação no plenário da Câmara.
O deputado Moreira Mendes (PSD-RO), autor do projeto, defende que as duas expressões são “muito amplas”.
“O fiscal pode dizer que tomar água num copo que não seja descartável, como já têm casos, pode ser considerado trabalho degradante e, consequentemente, trabalho escravo. Esse tipo de abuso é que nós não podemos permitir”, afirmou à Agência Câmara.
Em abril, a ONU manifestou preocupação com a revisão da legislação brasileira sobre a escravidão moderna e recomendou a rejeição das propostas, além da reativação da lista dos empregadores condenados.
“Temos consciência de que temos um Congresso que quer rever o conceito de trabalho análogo à escravidão para retroceder e tirar direitos. Só a pressão da sociedade pode impedir isso”, disse à BBC Brasil Caio Magri, presidente do Instituto Pacto Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Inpacto).
Veja abaixo a lista completa:
http://trabalho.gov.br/component/content/article?id=4428