As 4 grandes “cartas” que a China tem para enfrentar Trump e os EUA

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Seria bom que alguém advertisse Trump que, na competição econômica mundial, as cartas mais fortes estão com a China, escreve o colunista Marcelo Zero

Por Marcelo Zero, compartilhado de Brasil 247




Como todos sabem, a China, já há algum tempo, vem se tornando a economia mais competitiva do mundo e ocupando espaços geoeconômicos antes reservados exclusivamente aos EUA e a alguns aliados, como a Europa e o Japão.

Mas quais os “pontos fortes”, quais as vantagens comparativas que a China desenvolveu ou tem para se tornar tão competitiva e desafiar os EUA, a antiga hiperpotência inconteste?Play Video

Em artigo publicado, em agosto de 2024, na Harvard Business Review, intitulado The 4 Key Strengths of China’s Economy — and What They Mean for Multinational Companies (Os 4 principais pontos fortes da economia chinesa — e o que eles significam para as empresas multinacionais), seus autores, Mitch Presnick and James B. Estes, professores especializados em economia chines, listam quatro grandes pontos fortes da China que a fazem destacar-se, no cenário mundialEsses 4 pontos são1. Seu ecossistema de inovação2. Seus investimentos no Sul Global; 3. Seus mercados ultracompetitivos e 4. Seus 1,4 bilhão de consumidores.Com respeito ao seu ecossistema de inovação, os autores destacam que se trata de um sistema único no mundo, o qual combina forte coordenação estatal, “de cima para baixo”, com grande empreendedorismo, de “baixo para cima”.

Dessa forma “as startups que se alinham às indústrias de crescimento do futuro escolhidas pelo governo podem prosperar por meio de políticas, regulamentações e investimentos centralizados em pesquisas científicas”.

Ainda de acordo com os citados autores, a “abordagem de inovação de toda a nação gera recursos estatais quase ilimitados”. O crescimento dos investimentos em inovação na China é, de longe, o maior do mundo, tendo alcançado, entre 1995 e 2021, a impressionantes 3.299%, um patamar muito superior, por exemplo, ao crescimento de 277% nos Estados Unidos, no mesmo período.

A China é, atualmente, o mais importante centro global de pesquisa científica avançada.

Essa proeminência chinesa é especialmente significativa nas tecnologias mais relevantes para a economia do futuro, como as relativas à geração de energia limpas e renováveis, às telecomunicações, à informática e a robótica.

Segundo os autores do artigo, “a China agora responde por mais de 80% da capacidade de produção global em 11 tecnologias essenciais, incluindo painéis solares e componentes de baterias de íon-lítio. Além disso, a China domina a cadeia de suprimentos de terras raras, representando 70% da extração global de minério de terras raras e 90% do processamento de minério de terras raras”. A China está simplesmente muito à frente nesses setores, tem custos de produção muito reduzidos e “praticamente não adianta as empresas ocidentais tentarem competir contra as chinesas. No atinente aos investimentos da China no Sul Global, Mitch Presnick and James B. Estes argumentam que a “força da China nos mercados emergentes está remodelando a dinâmica global dos negócios. Tradicionalmente, as multinacionais ocidentais se concentraram em mercados maduros com produtos de alta engenharia a preços altos, enquanto a China conquistou mercados em crescimento.

Mercados onde está, frisamos nós, a maior parte da população mundial.

A China se destaca justamente por ser capaz de adaptar soluções inovadoras e acessíveis às necessidades locais, algo que países e empresas ocidentais são incapazes de fazerAlém disso, tanto as empresas quanto o governo chinês atuam nesses mercados sem exigir quaisquer contrapartidas políticas ou macroeconômicas

O artigo destaca. como exemplo bastante significativo, a autuação de empresas chinesas de smartphones, lideradas pela Xiaomi e Huawei. Até 2021, as empresas chinesas já haviam capturado 76% do mercado de smartphones da Índia e mais de 60% do mercado africano.

No que tange a veículos elétricos, os fabricantes chineses já dominam a América Latina, mantendo uma impressionante participação de mercado de 86%.

Em relação às telecomunicações, a Huawei fornece cerca de 70% da infraestrutura de rede 4G da África.

Claro que esse domínio chinês no Sul Global é alimentado pela Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI), cujos investimentos estão na casa de trilhões de dólares. Enquanto os EUA se isolam e se protegem, a China se expande nos mercados que mais crescem e que exibem maior potencial.Quanto aos mercados ultracompetitivos da China, menciona-se, no artigo, que “as empresas que sobrevivem às dificuldades de vida ou morte dos mercados da China — muitas vezes descritas como a “Arena dos Gladiadores” — geralmente emergem como campeãs globais. Pense-se nos casos da CATL (baterias), BYD (baterias e veículos elétricos), Tongwei (energia solar), Goldwin (energia eólica) ou Huawei (tecnologia da informação e comunicação)”

Quando Beijing decide desenvolver uma nova indústria, os governos regionais se esforçam para oferecer subsídios de monta e muitos outros programas de apoio. Dessa maneira, centenas de novas empresas acabam surgindo e competindo entre si. É um processo bastante eficaz, que muitas vezes começa com a atração de empresas estrangeiras, as quais são geralmente superadas, depois.

Por exemplo, a produção de carros elétricos na China teve grande impulso inicial quando a Tesla foi convidada para entrar naquele mercado, em 2014. Na verdade, Beijing investiu na chegada de Tesla ao país justamente para desencadear uma concorrência mais acirrada no mercado chinês de veículos elétricos. Mas, à medida que a Tesla ampliou as operações, fabricantes locais como NIO, Xpeng e BYD, apoiados pelo Estado chinês, começaram a produzir veículos elétricos de alta qualidade a preços mais competitivos, desafiando a posição de mercado da Tesla.

Em 6 anos, cerca de 500 empresas chinesas de veículos elétricos surgiram, mas após uma competição acirrada, apenas 100 permaneceram, em 2023. Dessas, a BYD já superou amplamente a Tesla como o maior fabricante de veículos elétricos do mundo em número total de carros vendidos, em 2023. No Brasil, por exemplo, tem BYD, mas não tem Tesla.

Com respeito aos seus 1,4 bilhão de consumidores, a China oferece um mercado de escala incomparável, de muito maior potencial que o mercado de 330 milhões de habitantes dos EUA.

A grande base de consumidores da China, apoiada por uma classe média em rápida expansão e pelo aumento da renda disponível, impulsionou uma demanda substancial por compras internas, desde carros elétricos carregados de tecnologia até os mais recentes produtos de luxo.

A China já não depende tanto das exportações. Em 2005, o percentual das exportações no PIB chinês era de 36%, mas alterações de política econômica da China, com forte investimento no mercado interno e na eliminação da pobreza já reduziram tal participação para cerca de 19%, em 2023.

Conforme os autores do artigo, conservadores, “embora seja muito cedo para dizer se o sistema híbrido de “capitalismo de estado” da China superará os modelos ocidentais, ele tem pontos fortes inegáveis. A China lidera em 53 dos 64 campos tecnológicos críticos, de acordo com o Australian Strategic Policy Institute. Esse sucesso se baseia em planejamento e controle centralizados, mas também apresenta uma concorrência implacável, que produz vencedores globais capazes de competir em preço e qualidade tanto nas economias desenvolvidas quanto nas emergentes. Nenhum outro país pode igualar a escala de mercado da China ou o entusiasmo dos seus consumidores por tecnologia.”

Os “camponeses” da China são extremamente avançados. Isso só não é percebido por muitos estadunidenses, especialmente trumpistas, que exibem uma vergonhosa ignorância sobre a China e o resto do mundo.

No patético encontro entre Zelensky e Trump, na Casa Branca, Trump, de forma bastante grosseira, disse a Zelensky que ele não “tinha cartas”.

Seria bom que alguém advertisse Trump que, na competição econômica mundial, as cartas mais fortes estão com a China. Seria desejável também que alguém o informasse que seu tarifaço, seu protecionismo irracional e seu isolacionismo enfraquecem sua “mão”.

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