As lições do 15 de março

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Por Miguel do Rosário, O Cafezinho – 

Farei críticas pesadas, mas lhes prometo não me transformar num coxinha radical de esquerda, que vê culpa do governo em tudo.

Primeiro porque a culpa é nossa, de alguma forma.




Segundo porque nosso poder de análise não penetra a raiz de todos os problemas.

Há elementos que nos escapam.

Mesmo assim, arriscarei algumas considerações sobre os erros políticos do governo.

O mais óbvio, o mais consensual, o mais chocante, é a comunicação.

Isso não é uma brincadeira, então me permitam subir o tom.

O governo Dilma não tem mais o direito de ser tão incompetente em matéria de comunicação.

A negligência no uso das redes sociais da presidenta e do blog do Planalto, o abandono do Café com a Presidenta e de qualquer estratégia inovadora de comunicação, vem se tornando um gravíssimo crime político, que atenta profundamente contra os interesses e a soberania do povo brasileiro.

Não é exagero.

O 15 de março prova que não é exagero.

Comunicação não é uma questão menor. Em se tratando de política, é uma questão central, e afeta diretamente todas as decisões políticas de um governo.

Talvez em outra circunstância, em outra época, em outro governo, em outro país, a questão da comunicação não fosse tão absolutamente central.

Aqui, é.

A aprovação da Dilma está em queda livre, e se, hoje, um pesquisador batesse às portas de um eleitor de Dilma e uma pessoa de esquerda, talvez também recebesse a resposta: ruim e péssimo.

A resposta do governo aos ataques políticos que vem sofrendo, desde antes das eleições, tem sido sempre a de demonstrar fraqueza e ceder.

Ontem, a reação do governo, de levar ministros para afirmar que combaterão a corrupção, foi, mais uma vez, pusilânime.

Os manifestantes não querem saber de medidas contra a corrupção. Eles querem o “fora Dilma” e o fim do governo.

O governo não vai encontrar respostas a dar a essas pessoas.

O governo tem de dar respostas ao seu eleitorado.

Tem de mudar a maneira de fazer comunicação, o que significa mudar a maneira de fazer política.

Dilma foi reeleita em outubro do ano passado com a promessa de que faria mudanças.

Não fez mudança nenhuma.

Ou, aliás, fez sim. Para pior.

O governo ficou mais calado, mais paralisado.

Ontem, conversando com um cientista político, um dos maiores do país, falávamos sobre um ponto negligenciado em nossas análises: a personalidade do presidente e seus efeitos sobre a conjuntura do governo.

Aí encontramos um problema grave: a personalidade de Dilma tornou-se um problema delicadíssimo que teremos de resolver.

Há lideranças que florescem em meios às crises. Há outras que afundam.

Qual seria o caso de Dilma? A julgar por seu constante desaparecimento, ela parece ser o último.

Como iremos resolver isso?

Quem terá coragem de se aproximar de Dilma e falar que ela precisa tomar providências para não deixar que sua personalidade se torne um estorvo para o governo?

Se não é possível mudar a personalidade da presidenta, poderíamos ao menos trabalhar para reduzir os danos.

A mídia e seus tentáculos estão apertando o torniquete.

Os promotores da Lava Jato e Sergio Moro assumiram alegremente a faceta institucional do golpe.

A mídia já conseguiu repetir exatamente o que fez em março de 1964. Botou gente na rua.

Haverá um primeiro de abril?

No próximo dia 12 de abril, haverá outra manifestação.

O governo reagirá como?

Chamará os ministros para dizer que instituirá a “pena de morte” para corruptos?

Irá cumprir a agenda fascista dos manifestantes?

Sim, sei que nem todos os manifestantes eram fascistas.

Mas a quantidade de faixas, cartazes e bandeiras fascistas era enorme, e eles conviviam alegremente no meio das passeatas.

Eram aceitos!

Se houvesse um golpe fascista, a maioria daqueles manifestantes aceitaria tranquilamente, desde que fosse para “tirar o PT” do poder.

Por quanto tempo o governo seguirá reagindo apenas com elogios covardes ao caráter “democrático” das manifestações?

A única maneira do governo reagir é apostando no seu eleitorado, no seu povo, porque a guerra não é exatamente contra o governo.

É uma guerra contra nós, contra a esquerda, contra os movimentos sociais, contra os sindicatos, contra os partidos, contra qualquer medida que possa afetar o bolso dos ricos.

O governo só tem duas opções: enfrentar ou enfrentar.

Enfrentar não é ser agressivo, não é apostar na venezuelização.

Enfrentar é apostar na política e na democracia.

O governo, sozinho, não poderá enfrentar a mídia e o rebanho que ela conseguiu produzir.

O governo tem de mobilizar, democraticamente, as suas tropas.

Para isso, porém, terá de ousar.

Mas não adianta fazê-lo sem estratégia, sem inteligência.

Antes de qualquer coisa, é preciso montar um gabinete de crise, com a presença da fina flor da inteligência política do país, trabalhando 24 horas por dia, com muita rapidez, respondendo online, com sentido de urgência, a todos os ataques, monitorando o próprio campo, indo também para a ofensiva.

Vou dar um exemplo.

Ontem, no calor da emoção sobre as notícias acerca da agressividade fascista das manifestações, o líder do governo na Câmara, o deputado José Guimarães, entrou no twitter para defender o imposto sobre as grandes fortunas.

Ótimo.

Me parece evidente que Guimarães reagia ao entendimento de que as forças governistas tem de atacar pela esquerda.

Entretanto, esse tipo de postura é exatamente o que a direita deseja, para atiçar o preconceito ideológico e criar uma onda que estoura facilmente na Câmara dos Deputados, levando o governo a perder qualquer votação, sobretudo uma que afete as elites.

A classe média, ciosa de seu pequeno ou médio patrimônio, ficará desesperada e agressiva ao imaginar que o governo quer avançar sobre ele.

Então, esclareçam a classe média! Não a deixem ser enganada pela mídia!

O governo e suas forças no parlamento e na sociedade tem de reagir pela esquerda sim, mas com inteligência.

É preciso trazer a informação sobre como funciona a tributação nos países desenvolvidos, países onde a classe média é hegemônica.

Se chegássemos perto, por exemplo, do imposto sobre a herança vigente nos Estados Unidos teríamos um grande avanço.

Seria muito mais difícil, para a direita, taxar de “comunista” uma das leis mais antigas da terra do Tio Sam.

Façamos comparações com países europeus, Japão, Coréia do Sul.

A mesma coisa vale para a democratização da mídia.

Esse é um debate para o qual o governo precisa contratar os melhores cérebros para convencer a opinião pública de sua necessidade.

Em primeiro lugar, é preciso conquistar para si o título de defensor da liberdade de expressão.

A tocha da liberdade não pode ficar em mãos de uma mídia construída sobre o cadáver da nossa liberdade.

A simbologia da luta pela democracia na mídia tem de ser inteiramente embebida em símbolos de liberdade.

A liberdade só existe com a lei.

Sem lei, não há liberdade, mas apenas a lei do mais forte, a selvageria.

O termo “regulação” é simbolicamente pobre e contraproducente.

É como chegar numa garota e, ao invés de dizer que ama, o sujeito dizer que seus “feronômios estremeceram”.

Não será difícil explicar à opinião pública que, em nenhum país do mundo democrático, existe uma mídia tão concentrada, e como isso pode afeta a liberdade do próprio sistema político.

Comparem com outros países!

Mostrem que nossa mídia nasceu na ditadura! Que ela ganhou dinheiro com a censura, que legitimou o autoritarismo, que escondeu a tortura.

Recentemente, foi revelado que Roberto Marinho, além de figura central no golpe de 64, articulou pessoalmente para que não houvesse as eleições prometidas aos democratas que apoiaram a derrubada do governo. Marinho articulou pelo endurecimento do regime, pela consolidação do totalitarismo. E ganhou muito, muito, dinheiro com isso!

Mostrem, pelo amor de Deus, que a Globo foi construída com dinheiro da CIA e dos EUA!

Por acaso é proibido, ao governo, falar o que os livros de história e documentos oficiais do próprio governo americano confirmam?

Diante de tanta gente pedindo a volta da ditadura, e com todas essas faixas presentes nas manifestações, a Dilma não virá a público para falar sobre história?

Se não houver um plano para reconstruir a imagem de Dilma, se não houver uma revolução na comunicação oficial, se não forem pensadas um conjunto de iniciativas políticas e econômicas que mobilizem os setores sociais que podem defender a democracia e o governo eleito, caminharemos aceleradamente na direção do abismo.

Um abismo que engolfará nossos filhos, nossa democracia, nosso futuro.

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