Bolsonaro sabe que seu discurso de ódio pode provocar nova tragédia, que aumentaria a erosão eleitoral e seria uma facada fatal em seus planos de se manter no poder e evitar uma possível prisão. E não há Adélio que dê jeito.
Por Plinio Teodoro, compartilhado da Revista Fórum
O assassinato do guarda municipal petista Marcelo Arruda pelo policial bolsonarista Jorge José Guaranho que teve como consequência a adesão da cantora Anitta à campanha de Lula (PT) pode provocar um estrago bem maior na campanha de Jair Bolsonaro (PL) que os recentes escândalos do governo com os pastores no MEC e a cultura de assédio sexual na Caixa.
A violência do apoiador, que apenas respondeu ao chamado “dog whistle” – o apito de cachorro na linguagem política – de Jair Bolsonaro, enfureceu o presidente, que se vê aprisionado em seu próprio discurso de tensionar ainda mais o ambiente eleitoral incitando o discurso de ódio na horda mais radical que o apoia.
O plano de Bolsonaro, até então, era incendiar apoiadores, enquanto angaria apoio de outra horda, da cúpula militar, para poder propagar ódio – inclusive e principalmente no 7 de Setembro – ameaçando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Assim, levaria a eleição ao segundo turno, quando poderia construir a tese golpista sobre fraude nas urnas eletrônicas.
No entanto, o extremismo de Guaranho, que invadiu uma festa temática do PT e assassinou um guarda municipal por ódio político, fez com que Bolsonaro voltasse atrás e fosse às redes condenar a “violência contra opositores”, discurso que está mais do que colado nele.
A mídia liberal – dada a “equilibrar” a cobertura – teve que descer do muro e, aos poucos, mostrar quem realmente “polariza” a disputa presidencial.
Nas redes, Bolsonaro e seu clã tiraram Celso Daniel e Adélio da cartola para tentar equiparar o caso e minimizar o estrago em meio aos apoiadores, que não encontraram discurso para justificar o crime de ódio. Alas menos radicais, ligadas à defesa do neoliberalismo foram levadas até mesmo a se questionarem.
No Centrão, a avaliação é que as desculpas de Bolsonaro não sairão da bolha, impossibilitando qualquer chance de angariar os votos necessários para levar a disputa ao segundo turno.
A “bomba” Anitta
Não bastasse o estrago feito por Jorge José Guaranho, a declaração de apoio a Lula feita pela cantora Anitta, que tem quase 120 milhões de seguidores nas redes – sendo mais de 17 milhões somente no Twitter, palco política da internet -, deixou o clã presidencial ainda mais em polvorosa.
Coordenador do gabinete do ódio nas redes, Carlos Bolsonaro tratou logo de vasculhar vídeos da cantora – já tão surrada entre bolsonaristas – para tentar desqualificá-la. Em vão.
Levantamento do DataFórum mostra que a decisão tomada por Anitta em razão do assassinato de Marcelo Arruda estourou a bolha e atingiu 61% das menções no universo político/cultural pesquisado pela ferramenta exclusiva da Fórum para monitorar o Twitter.
O cenário deve ser projetado nas próximas pesquisas de intenção de votos. A menos de 3 meses das eleições e diante de um cenário econômico que tende a se agravar mesmo com a proposta kamikaze de distribuir dinheiro, um novo deslize nas pesquisas pode ser fatal para os planos de Bolsonaro.
Uma vitória acachapante de Lula no primeiro turno sepultaria, de vez por todas, a possibilidade de um golpe para se manter no poder – e longe da cadeia.
Em seus primeiros passos, Bolsonaro mostra que tende a elevar o discurso de ódio e volta a subir o tom contra ministros do TSE, além de Lula. No entanto, sabe que uma nova tragédia – possível – pode dar uma facada fatal em seus planos. E, desta vez, não terá Adélio que o salve de uma derrota.