Ativistas denunciam hipocrisia de Lulu Santos após cantar música sobre liberdade e natureza em aquário no Pantanal (MS)

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O vídeo foi gravado no Bioparque Pantanal que explora cerca de 400 espécies de animais em cativeiro, incluindo diversos peixes, jacarés e arraias

Por Júlia Zanluchi, compartilhado de ANDA Jornalismo




O cantor Lulu Santos postou em seu Instagram um vídeo de sua visita ao Bioparque Pantanal, um aquário em Campo Grande (MS), e recebeu muitas críticas de seguidores.

No vídeo ele canta uma música de sua autoria chamada Sereia, que fala sobre os mares, rios e horizonte, símbolos de liberdade que não representam os animais vivendo em cativeiro no aquário. O cantor ainda compartilhou que teve uma forte conexão com uma das arraias, que foi batizada com seu nome.


Além dos comentários negativos de seguidores na postagem do Instagram, ativistas também criticaram a hipocrisia de Lulu Santos ao cantar uma música sobre a natureza dentro de um aquário. “Fiquei estarrecida ao assistir o Lulu louvar, em canto, os reflexos das águas de um cativeiro onde milhares de animais amargam vidas confinadas. É como fazer uma ode à natureza num ‘Chopis Centis’, como diriam os Mamonas Assassinas”, disse Paula Brugger, bióloga, doutora em Sociedade e Meio Ambiente, professora universitária, escritora, ambientalista e ativista em defesa dos direitos animais.

“Como assim: das verdadeiras ondas do mar, plenas de magia e da pujança da natureza, às ondulações das águas de um aquário, ambientes artificiais onde se aprisionam animais para o deleite humano? Do universo natural às jaulas, a trajetória é de decadência ética, artística, lúdica, e até política. Sinal dos tempos nos quais ‘tudo muda’, infelizmente para pior: ecossistemas inteiros são devastados para dar lugar à mineração, a campos de soja, a pastagens… Nesses processos, povos originários e animais selvagens – tutores e verdadeiros proprietários desses mundos – são aniquilados para que o artifício humano da sociedade industrial prospere, auferindo bons lucros a poucos”, pontuou Brugger. “‘Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia?’ Espero que não; espero que sim: que tudo possa ser, de novo, de um jeito que já foi um dia. E, nesse universo de esperança e luta, a arte pode e deve ter um compromisso com uma mudança para melhor.”

Os aquários são prisões, embora aleguem frequentemente que têm objetivos educacionais e de proteção. A realidade é que a vida em cativeiro impõe sofrimentos imensuráveis a espécies que, na natureza, vivem em vastos e complexos ecossistemas.

“Zoos, bioparques e aquários propiciam declínio populacional e surgimento de subespécies com a criação in vitro. Escravizando o animal e o afastando da possibilidade de convivência em habitat natural. Além disso, evidencia a fragilidade do caráter conservacionista”, declarou Anderson França, jornalista e diretor Projeto Gatos do Parque.

O Bioparque Pantanal mantém cerca de 400 espécies de animais em cativeiro, incluindo diversos peixes, jacarés e arraias. Esses animais possuem necessidades comportamentais específicas, como a liberdade, a caça e interações sociais com outros indivíduo de sua espécie. “Essa é a cruel realidade do Bioparque que já funciona há dois anos. E o pior da história, é uma obra governamental, enquanto a cada ano que passa não se breca o avanço da destruição de um dos ecossistemas mais importantes do mundo, o Pantanal”, acrescentou Anderson França.

Em cativeiro, eles são confinados a espaços incrivelmente pequenos comparados aos seus habitats naturais, o que gera estresse, tédio e comportamentos neuróticos. Não é raro ver animais exibindo estereotipias, como nadar em círculos repetidamente ou bater a cabeça contra as paredes dos tanques.

Quando celebridades, como o Lulu Santos, atrelam sua imagem a grandes aquários que mantêm animais aprisionados, elas cometem um ato de irresponsabilidade que tem amplas repercussões. Ao apoiar esses estabelecimentos, os famosos não apenas legitimam uma prática cruel, mas também influenciam negativamente a percepção pública sobre a proteção e os direitos animais.

“Um absurdo ver uma propaganda descarada de um aquário gigante ao lado do Pantanal com o nome de Bioparque. Aquários e zoológicos com esse discurso hipócrita de educação ambiental normalizando cativeiros, prisões de animais. Os aquários dão os números de vidas que aprisionam mas não informam quantas toneladas de animais mortos recolhem. Na era da informação a ignorância é escolha, por isso é assustador o rumo que os Sapiens seguem, insistindo nos erros como se tudo estivesse dando certo”, afirmou Adriana Greco, ativista animalista.

Com sua enorme influência, o cantor poderia chamar atenção para os milhares de animais que estão morrendo nos incêndios florestais que estão acontecendo no próprio Pantanal. Em vez disso, ele transmite a mensagem de que é aceitável manter animais em cativeiro para entretenimento humano, perpetuando a normalização da exploração animal, dificultando os esforços de conscientização sobre a necessidade de proteger os habitats naturais desses seres e de respeitar suas vidas.

“Fascinante. Um cantor famoso, aclamado pelo público, ecoando a própria voz numa melodia que fala de amor, debaixo de uma aura de mistério gerada por um oceano cenográfico. Mas o fascínio, o fascínio cega. O pantanal queima, as árvores se transformam em carvão para churrasco, os rios secam, os peixes estão morrendo, assim como todos os outros animais”, diz com indignação Luanda Francine, coordenadora do grupo de Pesquisa em Ética e Direitos dos Animais do Diversitas – USP. “Impera o modelo de uma humanidade autocentrada que pesa em bloco no mundo, sempre se considerando no palco, no papel principal, atribuindo aos animais e todos os outros seres naturais o lugar de mero cenário de suas fascinantes representações. Mas por trás do véu de esplendor, vê-se um cenário deprimente. O mesmo sistema que condena jacarés ao fogo, aprisiona outros para deleite do entretenimento e expurgação da culpa, sob os termos de ‘proteção’.

Peixes e outros animais aquáticos que viajam quilómetros, são encarcerados sob luzes artificiais, árvores artificiais, cores artificiais. O artifício é poder criar um mundo fake, controlável e que gere lucro ao gosto do agronegócio e das corporações consumidoras do planeta, cada vez mais roubado, para o canto de esplendor, de uma humanidade narcisista e gananciosa. O Lulu Santos, como qualquer artista e figura pública, é responsável pelo seu poder de influência e deu agora seu quinhão de contribuição politicamente alienante perante isso tudo que está acontecendo”, completou Luanda.

Apesar do cantor ter limitado os comentários da postagem no Instagram, muitos seguidores criticaram o vídeo. “Que horizonte, Lulu? Que ondas? Esses coitados estão presos e explorados num aquário. Que triste”, disse um internauta. “Toda vida merece liberdade…”

Outra usuária trouxe a situação do Pantanal como pauta. “É uma pena que, ao destruir o Pantanal, o ser humano opta por aprisionar uma amostra do bioma e condenar os animais a prisão perpétua, ao invés de preservar a natureza em vida livre… Liberdade nesse mundo atual é pra poucos”, escreveu.

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