Audiência de custódia analisa a legalidade de 200 mil prisões feitas nos últimos dois anos

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Publicado em Justificando

Em dois anos, as audiências de custódia analisaram ao menos 200,8 mil detenções no país. Desde fevereiro de 2015, a maioria dos casos (54,4%) resultou em prisão preventiva e os demais em liberdade (45,6%), segundo dados acumulados até fevereiro. Os resultados ajudaram a baixar o número de presos provisórios, detidos sem julgamento.

Prevista em tratados internacionais firmados pelo Brasil, a audiência de custódia ocorre com a apresentação do preso ao juiz até 24 horas após a detenção, quando o magistrado opta entre manter a prisão em flagrante, aplicar medida alternativa ou conceder liberdade. Para isto, o juiz avalia a legalidade, a necessidade e a adequação da continuidade da prisão.

Foto: Gil Ferreira/Agência CNJ

Todas as capitais já aplicam a audiência, procedimento que começa a ser adotado no interior do país, conforme determinado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

As audiências de custódia feitas até agora registram, também, uma média de 4,8% de casos com queixa de violência durante a detenção e de 10,9% de indicações para serviços sociais.

Do ponto de vista institucional, a audiência tem sido um sucesso. Houve a perfeita implantação, apesar de lacunas a serem resolvidas”, afirma Hugo Leonardo, vice-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), organização parceira do CNJ no projeto.

Para ele, é preciso assegurar que as apresentações ocorram aos finais de semana e feriados, sempre em pessoa. Houve queda no total de presos provisórios após a adoção das audiências, conforme o mais recente balanço do CNJ. Hoje, cerca de um terço da população carcerária é de internos à espera de decisão. “Ainda é um número elevadíssimo. Mesmo com um filtro mais racional, nas audiências, vigora entre os magistrados uma mentalidade punitivista”, diz Leonardo.

Nos dois anos, o projeto venceu resistências dentro do próprio setor público. “Qualquer ator do sistema judicial percebe que o instituto é indispensável. Basta notar as deficiências dos nossos órgãos de investigação. Quantos mais filtros de checagens, menos equívocos criminais teremos e menos cidadãos sofrerão na mão de maus profissionais”, defende o advogado criminal.

Formação de juízes

Tida como novidade no meio jurídico, a audiência de custódia levou os órgãos de formação de juízes a atualizar o currículo em todo o país. Apenas no ano passado, 320 juízes concluíram curso a distância de execução penal que inclui o tema, promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), órgão oficial de treinamento.

Simulações das audiências de custódia, por sua vez, foram incluídas no curso de formação inicial de juízes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (Nordeste). “Como é uma nova dinâmica, simular pode ser o mais proveitoso para os colegas”, disse o juiz Bruno Teixeira, titular da 2ª Vara Federal, coordenador da capacitação de prática penal, concluída no mês passado.

Para a encenação, cada aluno assume um papel: réu, juiz, escrivão, promotor, defesa e agente de polícia. “Queremos trazer uma dinâmica pedagógica à audiência. Mostrar aos colegas como é estar em outras funções, para discutir o ambiente da audiência como um todo. Orientamos que não haja qualquer caricatura ou brincadeira. A intenção é se aproximar ao máximo da verdade”, diz Teixeira.

O juiz não recebe qualquer instrução. Teixeira atua como réu e outros quatro observadores anotam o cumprimento das normas por todos os envolvidos — ao escrivão, por exemplo, cabe lançar os dados no Sistema de Audiência de Custódia (Sistac). A sessão, que vai da chegada à saída do preso, dura cerca de duas horas e meia. Ao fim, exibe-se vídeo com pontos a serem trabalhados.

Primeira do TRF5 a promover a simulação, a turma reuniu 16 juízes federais e dois estaduais recém-aprovados. Antes, o curso previa duas sessões de instrução e julgamento — a audiência de custódia substituiu uma delas. “O ideal é que cada colega faça mais de um papel. O juiz seja observador, o advogado seja promotor. Lamentamos a falta de tempo para mais”, conta Teixeira.

Falhas de condução foram reveladas. Mesmo primário e com endereço fixo, o réu foi mantido algemado em todas as sessões. Houve também rispidez de juízes com advogados e membros do Ministério Público, relata o coordenador. “São incidentes graves, que não passariam despercebidos. Podem ser alvo de representação na corregedoria local ou no próprio CNJ. Ficaram muitas lições”, diz.

Informações por Isaías Monteiro, da agência CNJ.

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