Por Victor Ferreira , publicado no Portal Público –
Patrões das principais empresas alemãs e o mais poderoso sindicato germânico põem fim a braço de ferro com acordo que prevê jornada de 28 horas semanais e participação nos lucros das empresas.
À sexta foi de vez. O mais forte sindicato alemão, o IG Metall, chegou a um acordo com o patronato para um aumento salarial de 4,3% e um alívio no número de horas incluídas na jornada laboral. Depois de cinco reuniões sem sucesso, e uma série de greves de 24 horas que custaram 200 milhões de euros à economia alemã, a última ronda de negociações permitiu chegar a um pacote de medidas que ficam aquém das exigências iniciais daquele sindicato (pedia aumento de 6%), mas que deverá servir de referência para futuras negociações, incluindo noutros sectores da maior economia europeia.
A aplicação das medidas aceites pelo IG Metall (que representa 3,9 milhões de trabalhadores alemães) e pelo patronato vai estender-se por um período de 27 meses, segundo noticia a imprensa alemã nesta terça-feira. “Os trabalhadores vão ter mais dinheiro no bolso em termos reais; vão obter uma parte justa dos lucros das empresas; e isso vai impulsionar o consumo”, resumiu um dos negociadores daquele sindicato, Roman Zitzelsberger, citado pela Reuters, ao fim de 13 horas de negociações.
O acordo foi selado em Estugarda, sede de empresas importantes como a Daimler, abrangendo no imediato meio milhão de trabalhadores no sudoeste do país, mas acabará por se estender a outras regiões e sectores de actividade, “servindo de benchmark para milhões de trabalhadores” na Alemanha, sublinham analistas ouvidos pela mesma agência de notícias.
Numa base anual, o acordo representa um acréscimo salarial de 3,5%, segundo as contas de um analista do banco alemão Commerzbank, Eckart Tuchtfeld. O que significa que, para as empresas, haverá um aumento dos custos de produção acima do inicialmente previsto, mas, como refere outro analista do Barclays, “pelo menos este acordo traz garantias de maior certeza” para o patronato. Ainda na semana passada, uma greve de 24 horas paralisou empresas como a Airbus, a Daimler, BMW e Bosch, custando aos fabricantes de carros, empresas fornecedoras de bens e de engenharia qualquer coisa como 200 milhões de euros. E os sindicatos tinham ameaçado com mais greves e outras formas de luta, caso a reunião de segunda-feira não servisse para alcançar um acordo. O que acabou por acontecer, depois de se registarem cedências de ambas as partes.
Além de um aumento salarial de 4,3%, que começará a ser pago a partir de Abril, os trabalhadores abrangidos irão receber um pagamento único de 100 euros, relativo ao exercício fiscal do primeiro trimestre. É um valor extra, não repetível, que a partir de 2019 se converterá num pagamento único de 400 euros por cada ano, ao qual acrescerá outro pagamento anual extra correspondente a 27,5% do salário mensal de cada um. Porém, este montante pode ser convertido em menos horas de trabalho por quem preferir uma jornada laboral mais leve – o que acontecerá de qualquer forma, visto que uma das alíneas do acordo agora firmado prevê a redução das 35 horas de trabalho semanal para 28, para quem tiver filhos menores, familiares doentes ou idosos. Uma medida que será válida por um período de dois anos. Em compensação, as empresas poderão recrutar mais trabalhadores que estejam disponíveis para 40 horas de serviço semanal, o que será uma forma de criar “mais flexibilidade”, sobretudo em períodos em que seja necessário aumentar a produção para responder a aumentos na procura.
A notícia deste acordo surge no mesmo dia em que as bolsas europeias registaram índices a perder cotação, em resposta às perdas acentuadas verificadas em Wall Street, onde o Dow Jones Industrial caiu, pressionado pelo aumento das taxas das obrigações do Tesouro dos EUA. Um movimento que é justificado pelos dados dos custos salariais, que subiram na economia norte-americana, e que pôs os investidores à espera de uma subida das taxas de juro. O dia ainda traz outra boa notícia para a economia alemã, a de que as encomendas na indústria subiram 2,2% no último mês de 2017.
Todos estes factores conjugados apontam para um aumento da inflação na zona euro, empurrada pelo principal motor económico que é a Alemanha, fazendo a taxa aproximar-se dos 2%, meta do Banco Central Europeu (BCE). Mas será necessário aguardar para ver se isso de alguma forma pode acelerar a retirada dos estímulos que o BCE tem empregado para ajudar a economia da zona euro.