Big tech de aplicativos para namoro mantém perfis de estupradores para continuar lucrando

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Segundo reportagem investigativa do Guardian, empresa proprietária do Tinder e Hinge poderia ter evitado agressões sexuais caso tivesse suspendido homens denunciados

Compartilhado de Opera Mundi




na foto: Yogas Design/Unsplash
Além de evitar prevenir novos casos de agressão sexual, Match Group não colaborou com investigações da Justiça norte-americana

“O Match Group sabe desde 2016 sobre usuários abusivos em seus doze aplicativos de namoro, mas deixa milhões de pessoas no escuro, escolhendo os lucros em vez da segurança”. Essa é a denúncia de uma reportagem investigativa publicada no jornal britânico The Guardian sobre a empresa norte-americana de tecnologia para serviços de namoro online, proprietária do Tinder e avaliada em US$ 8,5 bilhões (cerca de R$ 1,5 trilhões).

A reportagem, publicada na última quinta-feira (13/02), é resultado do projeto Dating Apps Reporting Project (Projeto de relatório de aplicativos de namoro, em tradução livre). A investigação realizada por 18 meses foi feita em parceria com a AI Accountability Network (setor de responsabilidade sobre Inteligência Artificial) do Pulitzer Center e as ferramentas de jornalismo investigativo Markup e CalMatters.

A publicação escrita pelas jornalistas Emily Elena Dugdale e Hanisha Harjani revela um caso de 25 de janeiro de 2023, quando uma jovem em Denver, no Colorado, que conheceu Stephen Matthews, um médico de 34 anos, por meio da Hinge, um dos aplicativos do Match Group, conglomerado que opera em 190 países do mundo, sendo 193 os reconhecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).

O encontro entre os dois resultou na mulher sendo drogada após ingerir uma bebida oferecida pelo cardiologista. Mesmo com a memória turva e sendo atacada fisicamente, ela conseguiu fugir do apartamento do homem em direção à sua casa, onde passou mal por horas devido à substância. Após acordar, relatou a agressão à Hinge.

Contudo, ela não sabia que havia acabado de encontrar um homem que já havia recebido denúncias de estupro feitas por outras mulheres no mesmo aplicativo, há anos, em uma prática iniciada em setembro de 2020. A última havia sido feita quatro dias antes, e após ela, houve mais uma, pouco mais de uma semana depois. Entre esse período, o Hinge não apenas permitiu que Matthews, um pagante de assinatura premium no aplicativo, continuasse na plataforma, mas promovia seu perfil com base em seu algoritmo.

A repetição de denúncias sem uma ação concreta contraria a própria política oficial de segurança do Match Group. Segundo a legislação da empresa, quando um usuário recebe uma denúncia de agressão “todas as contas associadas a esse usuário serão banidas de nossas plataformas”. Caso isso fosse respeitado, diversas mulheres não teriam sido violentadas pelo mesmo homem no Hinge.

Quando Matthews foi finalmente retirado dos aplicativos do Match Group não foi devido à ação da empresa, mas sim por ter sido preso após uma das vítimas denunciá-lo na polícia.

Mas até isso ser feito, “pelo menos 15 mulheres acabariam denunciando que Matthews as havia estuprado ou drogado. Quase todas elas o conheceram em aplicativos de namoro administrados pelo Match Group”, relata o Guardian.

Em 25 de outubro de 2024, um juiz de Denver sentenciou Matthews a 158 anos de prisão perpétua, condenado em 35 acusações relacionadas a drogas e agredir sexualmente 11 mulheres – violência que poderia ter sido evitada caso o Match Group tivesse aplicado sua política de segurança na primeira denúncia, em 2020.

Apesar da aguardada condenação, ela não aconteceu com ajuda do Match Group, muito pelo contrário. Segundo a investigação, promotores emitiram um mandado de busca contra Matthews para a empresa em julho de 2023. Os documentos solicitados pela Justiça norte-americana só foram concedidos em fevereiro de 2024.

“Por anos após receber relatos de agressão sexual, o Hinge continuou a permitir que Stephen Matthews acessasse suas plataformas e facilitou ativamente seu abuso”, considerou Laura Wolf, advogada da vítima que levou à prisão de Matthews.

“Inúmeras mulheres sofreram e continuarão a sofrer. O Hinge e outras plataformas de namoro não tomaram nenhuma medida para garantir a segurança do produto que estão vendendo, combinando mulheres desavisadas com predadores conhecidos sem pausa ou preocupação”, afirmou ainda

A investigação concluiu, assim que as conexões possibilitadas pelos aplicativos do Match Group também “facilitaram que pessoas que cometem abuso sexual alcançassem um número aparentemente infinito de alvos em potencial”.

Histórico de descaso da Hinge

Para além das denúncias contra o Matthews, documentos e fontes internas da Hinge mostram que o Match Group sabe “desde pelo menos 2016” quais usuários de seus aplicativos foram denunciados por drogar, agredir ou estuprar em seus encontros facilitados pela empresa.

As mesmas fontes apontaram ao Guardian que desde 2019, o banco de dados central da big tech para namoro online registra todos os usuários denunciados por estupro e agressão.

Em 2021, a empresa prometeu publicamente melhorar a segurança em suas plataformas, o que não foi cumprido.

Além disso, em fevereiro de 2020 membros do Congresso norte-americano pediram uma resposta da empresa sobre suas ações diante de relatos de violência sexual. Em 2023, essa solicitação foi novamente feita. Até agora, em fevereiro de 2025, a empresa não respondeu.

Além do histórico que evidencia a falta de mudança no Match Group, a investigação publicada pelo Guardian revela que caso um usuário chegue a ser banido em um dos aplicativos da empresa, ele migra para outra plataforma e consegue utilizar suas mesmas informações pessoais e continuar sendo um agressor.

Diante da investigação e denúncias, o Match Group foi contatado pelo Dating Apps Reporting Project, que recebeu uma nota protocolar em resposta:

“Reconhecemos nosso papel em fomentar comunidades mais seguras e promover conexões autênticas e respeitosas em todo o mundo. Sempre trabalharemos para investir e melhorar nossos sistemas, e buscaremos maneiras de ajudar nossos usuários a permanecerem seguros, tanto online quanto quando se conectam na vida real”, disse o comunicado fornecido por Kayla Whaling, diretora de comunicação do grupo.

A empresa disse ainda levar “todos os relatos de má conduta a sério”, que remove e bloqueia contas que violaram as regras do aplicativo, em contradição com o caso de Matthews.

(*) Com informações de The Guardian

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