Por Samuel Lourenço, publicado no Jornal GGN –
Recebi por contatos diversos, o mesmo vídeo que tem um depoente falando sobre o Auxílio-Reclusão. Na película amadora, o interrogante conduz o depoimento com maestria e o cabrito vai respondendo tudo numa boa. Embora sua situação jurídica não esteja muito clara, assim como toda a entrevista, me parece que o cara estava em semiaberto e depois passou pelo monitoramento, não deixando claro se estava monitorado no regime semiaberto ou em Prisão Albergue Domiciliar, no regime aberto. Mas enfim…
Fiquei surpreendido com tudo que vi no vídeo, em especial sobre a parte que ele fala sobre o Auxilio-Reclusão, dizendo receber 4 mangos por mês. Isso mesmo: R$ 4.000, por ser vagabundo. Se cada preso custa aos cofres públicos quase R$ 2.000,00, imagine somar o preso mais o auxílio? Tô começando a reavaliar esse treco de “tá com pena leva pra casa” e “adote um bandido!”. Gente, o vagabundo recebe 4 mil golpinhos e tem um custo a mais de 2 mil reais por mês. Fazer uma Parceria Público Privada e assumir esse meliante em casa, deve ser uma vantagem.
Ironias a parte, pois na era do tribunal virtual é sempre bom destacar: é ironia! Mas queria destacar que estou escrevendo tudo isso por já ter ficado preso um dia, logo, sou classista. E saio em defesa do meu povo, dos meus amiguinhos que estão naquele lugar, para dizer que, dos 9 anos que fiquei trancafiado, não me lembro de um auxílio tão farto. É mais que o auxilio moradia do Moro. Ser bandido com bolsa é melhor que ser juiz com auxilio-moradia?
Fiquei agarrado um bom tempo. Só numa cadeia que fiquei agarrado uns 3 anos éramos mais de 1.800 presos. Multiplica isso por 4 mil! Que horror! Contudo, todavia, mas, porém e INFELIZMENTE, não são todos os presos que recebem tal auxílio. Para receber o auxílio-reclusão, que recebe a alcunha de “bolsa bandido” (esse povo coloca vulgo no bandido, nas esposa do bandido e no auxilio do bandido ), é necessário estar em condições de assegurado pela Previdência Social, tem que ter tempo de contribuição, tem um tempo limite de assegurado, tem limite de salário, ou seja, quem recebe uns dois ou três salários por mês, quando roda e o familiar vai requerer auxílio, acaba não recebendo por conta dos “altos rendimentos”.
E falando em mulher de preso, cabe aqui um destaque. Quem recebe o auxílio não é o bandido, é a mulher do bandido, se filho tiver, do contrário, a mulher do bandido também fica de fora. Ou algum outro dependente, pai ou mãe que comprove a condição de dependente. O bandido não recebe grana, mas sim os que dele dependiam.
E vem cá: as biqueiras, os donos dos esticas, das bocas de fumo, assinam carteira ou pagam a autonomia de seus funcionários? Bandido tem carteira assinada? E o Lula, será que o Lula recebe auxílio-reclusão?
Da minha época de prisão vi poucas pessoas requererem o benefício, os que cogitavam terem direitos, não possuíam todos os documentos. Mas alguns recebiam sim, o máximo que vi foi um rapaz, cuja mãe de seu filho recebia uns 900 reais, quase mil. Na época era quase isso, e o valor era alto por conta do retroativo, depois voltou para uns R$ 780,00.
Quando o preso chega no semiaberto e passa a trabalhar, com carteira assinada, o auxilio é suspenso. Quando sai no regime aberto, a bolsa é suspensa. Me soa estranho o cara receber a quantia declarada no vídeo. Me parece que o cinegrafista, que também toma o depoimento, a “oitiva informal”, quer se beneficiar muito mais com o Auxílio, mas não no sentido financeiro e sim político.
Já que são poucos os bandidos que recebem auxílio-reclusão, fico tentando entender quem ganha com essa propagação de informação. Façam um levantamento de quantos presos recebem a bolsa-vagabundo e quantos estão de fato cadastrado no sistema como beneficiário. Pesquisem o custo do auxílio no bojo previdenciário. Busquem refletir sobre quem deseja extrair vantagens da temática: se é o dependente do segurado ou se é um específico grupo político e de cidadãos de bem, visando o sensacionalismo com ares de paladino da moral, para fins eleitoreiros.
Ah! Pode até jogar pedra no autor do texto, mas do tempo que fiquei preso, apesar de assegurado, sim eu trabalhava com carteira assinada antes da prisão, não fui beneficiado com a bolsa-bandido. Fiquei chateado, pois fiquei na cadeia, coloquei camisa na cara, falei “coé dotô”, mas nem como vagabundo, digno de um auxílio, fui reconhecido. Triste fim de Samuel Lourenço, pois com a forçação de barra, também confesso: “esse não é o pais que eu quero pros meus filhos”…
Samuel Lourenço – Cronista, palestrante, egresso do Sistema Prisional, aluno de Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social -UFRJ