Para organizadores de lista, país precisa implementar políticas públicas para combater o declínio das populações e reduzir o risco de extinção de espécies
Por Bibiana Maia, compartilhado de Projeto Colabora
na foto: Mais de 700 mil hectares do Pantanal foram consumidos pelo fogo apenas nos primeiros seis meses de 2024, tornando este ano um dos oito piores já registrados para o bioma. Foto Gustavo Basso via AFP
O país mais biodiverso do mundo não está entre os dez mais bem colocados no Natural Conservancy Index (NCI). Na realidade, entre os 180 países avaliados, o Brasil ocupa a trigésima posição, com uma pontuação de 62.1. O índice aponta para desafios do país, que participa até a próxima semana da COP16, em Cali, na Colômbia. A conferência para biodiversidade acontece a cada dois anos e vai reunir lideranças de 197 países até o dia 2 de novembro. E, assim como outros 164 países, o Brasil não submeteu sua nova Estratégia e Plano de Ação Nacionais para a Biodiversidade (EPANB).
O NCI teve sua primeira edição lançada este ano para avaliar mundialmente os esforços na conservação da biodiversidade. O ranking é uma colaboração entre a instituição israelense Ben-Gurion University of the Negev e o site BioDB. Quem lidera a lista é Luxemburgo e os únicos países do Sul Global entre os dez primeiros são o Zimbábue e a Costa Rica. A metodologia usada envolve 25 indicadores divididos por quatro pilares: gestão territorial, ameaças à biodiversidade, capacidade e governança, e tendências para o futuro. Esses indicadores vão de 0 a 100 e são baseados em dados públicos e pesquisas científicas.
Desta forma, um país pode ter boas notas em indicadores como áreas protegidas e ainda assim ir mal em outra área relacionada, como legislação de conservação. Este é o caso do Brasil que tem 100 e 54 pontos em cada um dos indicadores, respectivamente. “Isto ajuda a reconhecer que ter áreas protegidas é importante, mas é igualmente importante ser capaz de cumprir as leis que fazem as áreas protegidas serem efetivas”, explica Alex Slavenko, um dos pesquisadores do NCI.
Este não é o único índice que rastreia como anda a conservação da biodiversidade no planeta. O Environmental Performance Index, da Universidade de Yale, na Inglaterra, tem a categoria “biodiversidade e habitat”, que é composta por 12 indicadores. Os dados de 2024 mostram algumas semelhanças e diferenças com o NCI. Luxemburgo continua entre os primeiros, atrás apenas de Botswana. O Zimbábue está distante, no 18º lugar, e a Costa Rica ainda mais longe do top dez, no 38º. O Brasil só aparece em 41º.
Desafios para conservar a biodiversidade
Segundo o NCI, o calcanhar de Aquiles do Brasil está no pilar de ameaças à biodiversidade. Para Slavenko, isto aponta para a necessidade de implementação de políticas públicas para a recuperação das espécies com o objetivo de combater o declínio das populações e reduzir o risco de extinção, sejam animais ou plantas. O pesquisador destaca o reino marinho, onde a pesca é superexplorada e está em colapso. Em terra firme, o principal problema é a perda de habitat, então a melhor estratégia é criar e garantir a efetividade das áreas protegidas.
Karen Oliveira, diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy Brasil (TNC), também avalia que no caso brasileiro é “fundamental aumentar a porcentagem de áreas protegidas, melhorando sua gestão”. Ela ainda afirma que é preciso aumentar a implementação de serviços baseados na natureza. Oliveira também reforça que existem dificuldades de o governo controlar os incêndios ilegais “que queimam, literalmente, os investimentos feitos na restauração, recuperação e proteção de áreas”.
O tópico ainda não faz parte do ranking do NCI. Slavenko explica que depende de acesso a dados de qualidade para uma análise imparcial. “Especificamente, as questões de incêndios florestais e desmatamento são complicadas, pois também dependem dos habitats nativos de cada país – países em regiões áridas, ou em ecossistemas propensos e adaptados ao fogo, terão diferentes linhas de base do que é considerado sustentável. Então, isso ainda é um trabalho em andamento”.
Maioria dos países não apresentou suas metas
As áreas protegidas são uma estratégia do Kunming-Montreal Global Biodiversity Framework, ou Marco Global da Biodiversidade Kunming-Montreal, em português. Elas são citadas na meta três, para conservar 30% de áreas marinhas e terrestres. O documento foi adotado na COP 15, em 2022, após quatro anos de negociações, e tem quatro objetivos para 2050 e 23 metas para 2030. Com isso os países – ou, as partes – se comprometeram a estabelecer metas nacionais para cumpri-lo.
Na COP 16, o objetivo era fazer um balanço dessas metas. O problema é que apenas 32 submeteram até este domingo (20/10) suas National Biodiversity Strategies and Actions Plans (NBSAP) ou, em português, Estratégia e Plano de Ação Nacionais para a Biodiversidade (EPANBs). O Brasil não faz parte desse grupo. Na última quinta-feira, em evento para a imprensa, a secretária de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima Rita Mesquita defendeu que o processo tem desafios em um país continental e que não apresentar a EPANB na COP 16 não significa que o país não está trabalhando para implementar os compromissos que assumiu.
Para a The Conservation Nature Brasil, houve um esforço do governo brasileiro em fazer um processo amplo de consulta pública para a EPANB, mas criticou a falta da entrega: “Faltou, porém, vontade política para concluir a nova Estratégia Nacional a tempo de ser apresentada na COP16 e, com isto, o Brasil perde a oportunidade de ser um protagonista nessa agenda”. Ela ainda explica que a implementação da EPANB vai demandar mudanças na legislação, o que pode ser um processo lento.
A EPANB é frequentemente comparada à National Determined Contribution (NDCs), traduzida como Contribuição Nacionalmente Determinada, das conferências do clima. As semelhanças entre as COPs não são à toa. Elas são reuniões de três convenções que têm sua origem no Brasil e são chamadas de “Convenções do Rio”, por terem surgido na Eco 92: a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a Convenção da Biodiversidade e a Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação.
O embaixador André Corrêa do Lago declarou que chegou o momento em que as agendas de biodiversidade e clima precisam se complementar, durante evento com a imprensa, na quinta-feira. Ele lembrou que os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável também são fruto do Rio por surgirem na Rio+20 e frisou que a Cúpula do G20 este ano, que será no Rio, incluiu a discussão sobre bioeconomia: “Nós estamos assistindo a um retorno ao Rio a caminho de Belém”.