Brasil já responde por quase um terço dos óbitos diários no mundo

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Por José Eustáquio Diniz Alves, compartilhado de Projeto Colabora – 

País já responde por quase um terço dos óbitos diários no mundo pelo coronavírus e segue subindo

Vista aérea do cemitério de Nossa Senhora Aparecida, na Taruma, em Manaus, onde dezenas de vítimas da covid-19 são enterradas diariamente. Foto Michael Dantas/AFP

O Brasil bateu o recorde de mortes pela covid-19 ontem (02/06). Foram 1.262 falecimentos registrados em um dia, o que significa, em média, 53 mortes por hora ou quase 1 óbito por minuto. Desde o dia 17 de março, quando ocorreu a primeira perda para o coronavírus, já foram mais de 31 mil vidas ceifadas antes da hora.




Contudo, neste dia de luto, o presidente Jair Bolsonaro disse: “A gente lamenta todos os mortos, mas é o destino de todo mundo”. Esta horripilante frase, além de ser uma fala insensível e zombeteira, é totalmente equivocada, pois se a morte é um fenômeno natural inexorável, a morte evitável não é destino. O falecimento intempestivo em massa reflete a incapacidade do poder público de conter uma epidemia e confirma que um Ministério da Saúde, ocupado por militares néscios nas ciências médicas, não está conseguindo salvar vidas. O capitão Bolsonaro age como se fosse um marinheiro que se recusa a salvar um náufrago, com o argumento de que a morte é o “destino de todo mundo”.

Uma das maiores conquistas do progresso socioeconômico histórico foi, exatamente, a capacidade científica de aumentar a sobrevida das pessoas. Segundo o grande historiador econômico britânico, Angus Maddison (1926-2010), a esperança de vida ao nascer da população mundial estava em torno de 23 anos em 1800 e passou para algo perto de 30 anos em 1900. Mas com o desenvolvimento humano e o avanço das transições demográfica e epidemiológica, no século XX, a esperança de vida ao nascer global chegou a 66 anos no ano 2000. Ou seja, o tempo médio de vida das pessoas mais que dobrou em 100 anos, fato absolutamente inédito e que mostra a dimensão desta conquista civilizatória. Segundo a Divisão de População da ONU, a esperança de vida ao nascer do mundo chegou a 73 anos em 2020. A esperança de vida ao nascer no Brasil estava em torno de 50 anos em 1950 e, apesar da morte ser “o destino de todo mundo”, a esperança de vida brasileira atual passou para 76 anos em 2020.

Enquanto o Brasil chora os seus mortos, o presidente Jair Bolsonaro segue celebrando com seus seguidores em manifestações cotidianas em Brasília. Foto Evaristo Sá/AFP
Enquanto o Brasil chora os seus mortos, o presidente Jair Bolsonaro segue celebrando com seus seguidores em manifestações cotidianas em Brasília. Foto Evaristo Sá/AFP

O presidente Bolsonaro deveria aprender com as conquistas da Costa Rica, que conseguiu reduzir a mortalidade infantil para menos de 10 falecimentos precoces por mil nascimentos, aumentou a esperança de vida ao nascer para mais de 80 anos e conseguiu manter as mortes da covid-19 em não mais do que uma dezena, ou 2 óbitos por milhão de habitantes (enquanto o Brasil tem 150 mortes por milhão). Talvez esta declaração presidencial desumana e sem compaixão seja uma tentativa de contornar uma possível acusação de crime de genocídio, crime de lesa-pátria e crime de lesa-humanidade.

Na verdade, o presidente da república pouco fez para evitar a propagação do vírus no território nacional, não conseguiu realizar os testes necessários para identificar as pessoas infectadas, não rastreou ou monitorou os doentes, não preveniu e não remediou adequadamente, não consegui nem eliminar e nem achatar a curva e não evitou que o Brasil ocupasse um destaque negativo no triste ranking global da pandemia. De fato, as ações e as declarações presidenciais só atrapalharam e continuam atrapalhando. O Brasil segue batendo recordes atrás de recordes como se o fracasso fosse um destino inevitável.

O panorama nacional

O Ministério da Saúde informou, na tarde de terça-feira (02/06), que o país atingiu 555.383 casos e 31.199 óbitos pela covid-19, com uma taxa de letalidade de 5,6%. O número diário de pessoas infectadas foi de 28.936 casos e o número diário de vítimas fatais foi de 1.262 óbitos. Os números diários brasileiros foram os maiores do mundo, pois os Estados Unidos tiveram 21,9 mil casos e 1,1 mil mortes. Em número de óbitos, o Reino Unido ficou em terceiro lugar (324 mortes) e o México em quarto lugar (237 mortes) no dia 02 de junho.

O gráfico abaixo mostra os valores diários das variações dos casos e das mortes no Brasil de 01 março até o dia 02 de junho de 2020. Nota-se que todas as baixas acontecem nos fins de semana e as elevações nos dias úteis. Mas as linhas (pontilhadas) de tendência polinomial de terceiro grau apresentam uma suavização das oscilações sazonais e indicam uma extrapolação para os próximos 7 dias.

O importante a observar é que existe de fato uma tendência ao aumento diário dos casos e das mortes e a perspectiva de que estes valores elevados de ontem (02/06) devam se repetir ao longo da semana e devam bater novos recordes, pois o pico da pandemia ainda não está à vista.

O panorama global

O mundo atingiu 6,5 milhões de pessoas infectadas pela covid-19 no dia 02 de junho de 2020 e a 381,9 mil vidas perdidas, com uma taxa de letalidade de 5,9%. Nas duas últimas semanas houve um aumento do número de casos de tal forma que a tendência de declínio se inverteu e começou a subir. Porém, houve até uma aceleração do declínio do número de óbitos e claramente o mundo já ultrapassou o pico da curva dos falecimentos e já começou o declínio.

A diferença entre a curva de óbitos dos dois gráficos é contrastante. A curva brasileira aponta para números diários acima de 1,2 mil vidas ceifadas em média, enquanto a curva global aponta para um número entre 2 mil e 3 mil. Assim, o Brasil, respondeu no dia 02/06, por 27% dos óbitos do mundo por covid-19 e deve manter um alto percentual global no restante do mês.

Os dados acima mostram que o número médio de óbitos já está caindo no mundo, mas está subindo no Brasil. Neste quadro, é preocupante a perspectiva de flexibilizar a quarentena antes do pico da pandemia e sem uma boa estratégia para o fim do isolamento social. O Brasil não fez uma barreira sanitária, não fez exames suficientes, não rastreou e não monitorou as pessoas infectadas. Liberar a abertura das atividades econômicas, nesta conjuntura, pode simplesmente aumentar o sofrimento e a mortandade.

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