Brasil mantém o viés de alta da pandemia

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Por José Eustáquio Diniz Alves, compartilhado de Projeto Colabora – 

Em uma semana, número de casos aumentou 100% e o número de óbitos cresceu 55%

Voluntários usando máscaras e viseiras esperam enquanto um homem assina antes de votar durante o segundo turno das eleições municipais na Rocinha, no Rio de Janeiro. Foto André Coelho/AFP – Novembro de 2020

O Brasil apresenta tendência de alta da pandemia pela terceira semana seguida. O número de casos aumentou 100% e o número de óbitos aumentou 55%. Até o Ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, reconheceu que existe uma aceleração e um repique da doença, embora ele negue se tratar de uma 2ª onda. Ao mesmo tempo, o governador gaúcho, Eduardo Leite, disse que o Rio Grande do Sul está vivendo uma segunda onda da covid-19. As autoridades de vários estados estão tomando medidas preventivas contra o novo surto. Porém, pouco importa o nome do fenômeno, pois o fundamental é reconhecer o desafio colocado à saúde pública, já que a tendência de declínio das curvas epidemiológicas foi interrompido no início de novembro e os números voltaram a apresentar uma média diária acima de 33 mil de casos e uma média de mortes acima de 500 óbitos diários.




Embora o incremento não esteja ocorrendo simultaneamente em todas as unidades da federação, os últimos dados configuram uma realidade preocupante para um país que já ocupa o terceiro lugar global do número acumulado de pessoas infectadas pelo SARS-CoV-2 e o segundo lugar global no número acumulado de vidas perdidas. No Rio de Janeiro, a ocupação de leitos de UTI para pacientes com Covid-19 atingiu 94% na rede SUS e mais de 90% nos hospitais privados. Mais de 270 pacientes infectados pelo novo coronavírus esperavam por uma vaga nos hospitais públicos do Rio na última sexta-feira, segundo a Secretaria Estadual da Saúde. Vários estados estão tomando medidas restritivas para conter a pandemia. Não há como negar que os números estão novamente em alta no Brasil. Mas, evidentemente, ninguém é capaz de estimar com precisão a dimensão e a extensão futura deste repique ou desta segunda onda. Desta forma, vale aplicar o princípio da precaução, pois é melhor prevenir do que remediar.

Internacionalmente, depois de todo o sofrimento do primeiro semestre, a Europa e a América do Norte voltaram a viver um pesadelo com o agravamento da doença. O continente europeu tem apresentado uma média diária de mais de 250 mil casos e de mais de 5 mil vítimas fatais. Os Estados Unidos, depois das eleições presidenciais, chegaram a apresentar o recorde de cerca de 200 mil casos por dia e voltaram a registrar mais de 2 mil mortes em 24 horas. O Canadá e o México também apresentam tendência de alta. Há também um repique no Norte da África e no Oriente Médio. Os números globais da pandemia bateram os recordes de 747 mil pessoas infectadas e 13,3 mil vidas perdidas, em 24 horas, no dia 28 de novembro, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A esperança de uma vacina disponível ainda no corrente ano não se realizou e as congratulações de Natal e do Réveillon terão que ser moderadas. Até mesmo as reuniões familiares no final de dezembro terão que ser restringidas diante da ameaça de propagação descontrolada do coronavírus. O amargo ano de 2020 está quase terminando, mas a agrura não passou e deve continuar afetando a comunidade internacional em 2021.

O panorama nacional

O Ministério da Saúde divulgou, no sábado (28/11), que o Brasil chegou a 6.290.272 pessoas infectadas e 172.561 vidas perdidas, com uma taxa de letalidade de 2,7%. Foram 51.922 novos casos e 587 mortes nas últimas 24 horas. O Brasil continua em 3º lugar no ranking global de casos (atrás apenas dos EUA e da Índia) e no 2º lugar no número de mortes (atrás apenas dos EUA). Existe um indiscutível repique da pandemia. Há evidências claras que se trata de uma 2ª onda, mas para ter certeza será preciso acompanhar os dados ao longo do mês de dezembro.

O gráfico abaixo mostra a variação média diária do número de casos nas diversas semanas epidemiológicas. Na 13ª SE (22 a 28/03) o Brasil teve 397 casos diários em média e os números subiram continuamente até o pico de 45,7 mil casos diários na 30ª SE (19 a 25/07). A partir do final de julho o número médio de casos, com algumas oscilações, caiu até o mínimo de 16,8 mil casos na 45ª SE (01 a 07/11). Mas nas duas semanas seguintes o número médio de casos ficou em torno de 28 mil, chegando a 33,9 mil casos na semana passada (48ª SE). Houve uma variação do número de pessoas infectadas de mais de 100% entre os dias 06 e 28 de novembro.

O gráfico abaixo mostra a variação da média diária do número de óbitos nas diversas semanas epidemiológicas. Na 13ª SE (22 a 28/03) o Brasil teve, a cada 24 horas, somente 13 vítimas fatais pela covid-19. Este número subiu para 1.014 óbitos na 23ª SE e atingiu o pico de 1.097 na 30ª SE (19 a 25/07). Nas semanas seguintes, com pequenas oscilações, os números foram caindo até 343 óbitos diários na 45ª SE (01 a 07/11). Contudo, nas duas semanas seguintes os montantes voltaram a subir para a casa de 480 mortes diárias e, na 48ª SE (22 a 28/11), o número de vidas perdidas ficou em 510 óbitos diários. Um aumento de 55% entre os dias 11 e 28 de novembro.

O panorama global

O mundo chegou a 62,5 milhões de pessoas infectadas e a 1,45 milhão de vidas perdidas pela covid-19 no dia 28 de novembro de 2020, com uma taxa de letalidade de 2,3%. O mês de novembro deve terminar com mais de 17 milhões de pessoas infectadas e 275 mil vidas perdidas. Para efeito de comparação, no mês de junho foram 4,3 milhões de casos e 140 mil mortes.

O gráfico abaixo mostra a evolução da média diária dos casos da covid-19 no mundo, desde o início de março. Nota-se que o número de infecções diárias passou de 3 mil casos diários entre 01 e 07 de março para 77 mil casos, quatro semanas depois. Até o final de maio o número de novas infecções ficou abaixo de 100 mil casos diários. Mas em agosto já tinha ultrapassado 250 mil casos diários, pulou para 493 mil casos na semana de 25 a 31/10, avançou para 555 mil casos diários na semana seguinte e alcançou o pico de 593 mil casos na semana de 15 a 21/11. Na semana passada houve um pequeno recuo para 583 mil casos. Mas no mês de novembro a média de pessoas infectadas deve ficar em impressionantes 575 mil casos diários e a média de mortes deve ficar em espantosos 9,1 mil óbitos diários.

O gráfico abaixo mostra a evolução do número diário de óbitos no mundo nos 9 meses da série. Na primeira semana de março houve menos de 1 mil mortes diárias, mas na semana de 29/03 a 04/04 já tinha saltado para 5,2 mil óbitos diários. O primeiro pico aconteceu na semana de 12 a 18 de abril com 7,1 mil mortes diárias. Nas 26 semanas seguintes os números variaram, mas foram sempre menores do que o pico de abril, atingindo 6,5 mil na última semana de outubro. Todavia, nas seguidas semanas de novembro bateram recordes sucessivos. Na primeira semana de novembro foram 8 mil mortes diárias, na segunda 8,8 mil mortes, na terceira 9,8 mil e na quarta semana chegou ao pico de 10,2 mil mortes diárias. A pandemia não mostra sinais de trégua no mundo.

O gráfico abaixo mostra o número de testes por milhão de habitantes para os 8 países com maior número de casos. Os Estados Unidos com 13,6 milhões de casos realizou 576 mil testes por milhão de habitantes, enquanto a Índia com 9,4 milhões de casos realizou apenas 99,8 mil testes por milhão de habitantes. A maior proporção de testes foi realizada no Reino Unido (UK) e o Brasil apresentou 102,7 mil testes por milhão de habitantes, bem próximo da taxa da Índia.

A baixa proporção de testes realizados no Brasil dificulta o rastreamento das pessoas infectadas pelo SARS-CoV-2. Isto se torna mais grave exatamente neste momento em que o monitoramento feito pelo Imperial College de Londres, no Reino Unido, mostrou que a taxa de transmissão (Rt) do novo coronavírus voltou a subir no território nacional. O relatório, divulgado no dia 24 de novembro, mostrou que o índice subiu para 1,30, o que significa que cada grupo de cem pessoas contaminadas transmitem o vírus para outras 130 pessoas. A última vez que a taxa de transmissão esteve tão alta no Brasil foi na semana de 24 de maio, quando atingiu 1,31.

Nesta situação, realizar testes em massa para localizar os focos de transmissão do coronavírus deveria ser uma tarefa essencial e urgente. Contudo, a imprensa informou que o Ministério da Saúde tem armazenado em São Paulo um estoque de 7 milhões de testes que não estão sendo usados e podem perder a validade nas próximas semanas e nos próximos meses. Ou seja, o ministério comete um erro de logística inaceitável diante do repique da covid-19 no país. Assim, é preciso repensar as prioridades. Ao invés de negar a gravidade da situação, os gestores das políticas públicas deveriam promover um mutirão nacional para evitar a propagação da 2ª onda.

A questão da vacinação é outro ponto de dúvida e questionamento da atuação do Ministério da Saúde. No dia 24/11, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), concluiu seu voto na ação que obriga o governo a apresentar em 30 dias um plano de vacinação contra a Covid-19. O julgamento, em plenário virtual, começará em 4 de dezembro. Já existem países que vão começar a vacinação antes do final do ano. Sem dúvida, o Brasil precisa imunizar os seus 210 milhões de habitantes e não se pode compactuar com a ignorância e a inação. O país que realizou eleições em todos os municípios em primeiro turno e acaba de concluir a votação em segundo turno não deveria vacilar na proteção efetiva de sua população.

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