Por Aydano André Motta, compartilhado de Projeto Colabora –
Prefeitos e vereadores oriundos de minorias viram campeões de voto e mudam um pouco a cara tradicionalmente heterossexual, masculina e branca da política brasileira
A eleição morna de domingo, da abstenção recorde e do tombo no bolsonarismo, também ofereceu brisa alentadora na sempre urgente agenda da diversidade. O país da política masculina, heterossexual cis, branca ganhou, ainda que timidamente, novos personagens, cores, tendências, pensamentos, convicções, escolhas em prefeituras e câmaras de vereadores país afora. Se em 2018 foi da “nova política” de contornos totalmente antediluvianos, agora, desabrocharam novidades verdadeiramente promissoras.
De Niterói (RJ) a Cavalcante (GO); do Oiapoque (AP) a Cruz Alta (RS); de São Gabriel da Cachoeira (AM) a Ilheus (BA); de Pesqueira (PE) a Campinas (SP) – passando por Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza -, indígenas, transexuais, travestis, quilombolas, ativistas, mulheres negras, gays, deficientes, lésbicas e mandatos coletivos ocupam espaço no cenário político. Novas formas de pensar e se comportar se aproximam do poder.
Só de transexuais, foram pelo menos 26 eleitos, inclusive os dois primeiros a ocupar a Câmara paulistana – Erika Hilton e Thammy Miranda – e as professoras Duda Salabert e Linda Brasil, as mais votadas entre todos os candidatos de Belo Horizonte e Aracaju, respectivamente. A mineira bateu o recorde de votos para a Câmara da cidade. Na luta pela igualdade de gênero, todas as capitais brasileiras elegeram mulheres.
“Minha principal causa é a educação, que piorou em Belo Horizonte segundo o Ideb”, avisa Duda, professora há 20 anos, que pretende conciliar as aulas com a rotina parlamentar. “Teremos uma Câmara com mais mulheres. Todos os espaços legislativos que têm mais mulheres resultam na melhoria de políticas sociais”.
“Estou representando uma comunidade que sempre foi excluída. É muito importante que a gente ocupe esses espaços, não ocupar por ocupar, mas para provocar transformações importantes nessa política”, festeja Linda Brasil, em entrevista ao G1. Ela manterá o trabalho direcionado aos Direitos Humanos, em especial para pessoas trans e travestis.
A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) contabiliza expressivos 57 ocupantes desses territórios tradicionais vitoriosos na votação de domingo (14 somente no Maranhão). E oito cidades escolheram prefeitos indígenas, já no primeiro turno.
O #Colabora apresenta alguns responsáveis por tornar a política brasileira mais plural.
INDÍGENAS
Clóvis Curubao (PT) – Aos 48 anos, foi reeleito prefeito de São Gabriel da Cachoeira, o maior município indígena do Brasil, com votação superior à da primeira vitória. A vice eleita, Professora Eliane Falcão (PT), também é indígena.
Marquinhos Xukuru (Republicanos) – O povo foi às ruas de Pesqueira, em Pernambuco, comemorar a eleição do cacique que, apesar do partido, exibe fotos orgulhosas com Lula em suas redes sociais (ainda é a política brasileira, lembrem-se). A candidatura dele está em julgamento pelo TSE.
Jair Xakriabá (Republicanos) – Aos 37 anos, bateu adversário da mesma etnia, filiado ao PT, em São João das Missões (MG).
Selma Tuxá (PCdoB) – Vereadora em Rodelas (BA), é viúva e tem 51 anos.
Tuxaua Benisio (Rede) – Do povo Macuxi, foi eleito prefeito de Uiramutã (RR). Aos 52 anos, é tuxaua (chefe temporal) da Comunidade Pedra Branca, localizada na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Lennon Corezomaé (Podemos) – Aos 30 anos, da etnia Umutina Bala Tiponé, será vereador em Barra do Bugres (MT). Foi, aos 24, o primeiro indígena a cursar mestrado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Lilia Karipuna (Republicanos) – Eleita vereadora em Oiapoque (AP), tem 30 anos e, é formada em Licenciatura Intercultural Indígena pela UNIFAP.
Geovani Krenak (PSD) – Ativista do povo que carrega no sobrenome, 32 anos, elegeu-se vereador em Resplendor (MG).
GAYS E LÉSBICAS
Biga Kalahare (PT) – Youtuber de Santarém (PA), 29 anos, será o primeiro vereador assumidamente gay da cidade.
Bia Caminha (PT) – Negra, 21 anos, é a vereadora mais jovem da história de Belém. Vai à Câmara defender a juventude negra, as mulheres e a comunidade LGBTQIA+.
Paolla Miguel (PT) – Nascida na periferia de Campinas há 29 anos, formada em Engenharia de Computação, é negra e lésbica. Fundou o coletivo de comunicação alternativa Bonde Mídia.
Vinicius Castello (PT) – Advogado e ativista dos Direitos Humanos, 25 anos, negro, primeiro de sua família a concluir o ensino superior, elegeu-se para a Câmara de Olinda.
Carla Ayres (PT) – Aos 32 anos, defensora dos Direitos Humanos, será vereadora em Florianópolis.
QUILOMBOLAS
Vilmar Kalunga (PSB) – Primeiro prefeito quilombola de Cavalcante (GO), na região da Chapada dos Veadeiros, vive no maior território do tipo no país. Tem 40 anos.
Domingas Quilombola (Solidariedade) – Moradora do Quilombo Urbano João Borges Vieira, em Uruaçu (GO), filha de lavradores, é professora de saberes tradicionais e tem 50 anos.
Jhonatas Monteiro (PSOL) – Vereador mais votado da história de Feira de Santana (BA), o Rasta tem 33 anos e é ativista pelos povos quilombolas.
TRANSEXUAIS E TRAVESTIS
Benny Briolly (PSOL) – Travesti, negra, foi a quinta mais votada para a Câmara de Niterói (RJ). “Precisamos derrotar o bolsonarismo no Brasil inteiro”, convocou, após a vitória.
Titia Chiba (PSB) – A transexual foi a campeã de votos, na corrida pela Câmara de Pompéu (MG).
Erika Hilton (PSOL) – A primeira vereadora transexual e negra da história de São Paulo elegeu-se aos 27 anos. Teve a maior votação entre as mulheres – mais de 50 mil votos.
Regininha (PT) – Primeira transexual vereadora em Rio Grande (RS), assumiu como suplente em 2018 e elegeu-se agora, aos 41 anos. Vitória numa vida de luta, que teve violência na adolescência e prostituição por mais de dez anos.
Thabatta Pimenta (PROS) – Radialista de 28 anos, é a primeira mulher trans vereadora no Rio Grande do Norte. Ela garantiu uma das nove vagas na Câmara de Carnaúba do Dantas, onde defenderá, além dos LGBTQIA+, os portadores de deficiência.
Kará (PDT) – A pequena Natividade (RJ) elegeu a primeira mulher trans para a Câmara de Vereadores. Kará, 40 anos, é cabeleira e dançarina.
DEFICIENTES
Luciana Novaes (PT) – Tetraplégica e dependente de ventilação mecânica desde que foi atingida por uma bala perdida, em 2003, foi a primeira vereadora do Rio na sua condição, eleita em 2016. Agora, aos 37 anos, conquistou novo mandato.
Isabelle Dias (PSB) – Surda e professora de Libras, vai trabalhar por igualdade e inclusão de deficientes na Câmara de Paranaguá (PR).
Talita Cadeirante (PSB) – Professora, ficou no segundo lugar entre os mais votados para a Câmara de Taubaté (SP).
PREFEITAS PIONEIRAS
Eliene Liberato Dias (PSB) – A professora é a primeira prefeita de Cáceres (MT).
Professora Denise (PV) – Primeira prefeita negra da história de São Gotardo (MG).
Elenice Delgado (PT) – Primeira mulher eleita para comandar o município de Lima Duarte (MG). Tem 61 anos.
Dona Nilda (PCdoB) – Ex-primeira dama, é a primeira prefeita de Poções, no sudoeste da Bahia.
LIDERANÇAS NEGRAS
Aline Flausino (PCdoB) – Primeira vereadora negra e sem terra de Goianá (MG), foi a mais votada na cidade.
Maiara Felício (PT) – Ativista e influenciadora digital, 26 anos, é a primeira negra eleita para a Câmara de Nova Friburgo (RJ). “O povo tem voz e agora está no poder”, festejou.
Romário Régis (PCdoB) – Consultor em comunicação, empreende longeva cruzada nas redes sociais pela valorização de São Gonçalo (RJ). Aos 31 anos, vai estrear na Câmara da segunda cidade fluminense em população.
Dandara Tonantzin (PT) – Ativista do movimento negro, 26 anos, foi a mais votada entre todos os candidatos de Uberlândia (MG) para seu primeiro mandato como vereadora. A cidade terá oito mulheres no Legislativo, um recorde.
Ana Lúcia Martins (PT) – Professora e servidora aposentada, é a primeira vereadora negra da história de Joinville (SC).
Marlina Oliveira (PT) – A doutora em Educação é a primeira vereadora negra nos 137 anos de Brusque (SC) e vai preencher seu mandato com pautas de inclusão social. Avanço para a cidade de Luciano Hang, mais conhecido como Veio da Havan.
Divaneide Basílio (PT) – Dona da maior votação de uma mulher para a Câmara de Natal, foi reeleita. É autora do projeto Transcidadania, que concede formação profissional para população LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade.
AMBIENTALISTAS
Marquito (PSOL) – Engenheiro agrônomo e mestre em agroecossistemas, 40 anos, foi reeleito em Florianópolis. Realizado trabalho ligado à produção de alimentos, à segurança alimentar, às hortas urbanas e comunitárias.
Iasmin Roloff (PT) – Filha de agricultores, tem apenas 23 anos e é formada em agroecologia. Mais jovem vereadora da história de Canguçu (RS), defenderá a agricultura familiar e a igualdade de gênero em seu mandato.
MANDATOS COLETIVOS
Pretas por Salvador (PSOL) – Laina Crisóstomo, Cleide Coutinho e Gleide Davis são três feministas negras, duas de religiões afro-brasileiras e uma evangélica, em defesa das mulheres e pelo direito à cidade de negros e negras.
Coletivo Lélias (PT) – Nascido no movimento “Ele não”, da eleição de 2018, o coletivo de oito mulheres que teve Stefany Carli como nome na urna ocupará uma cadeira na Câmara de Cataguases (MG).
Nós (PT) – Formado por seis militantes da periferia de São Luís, o coletivo será o primeiro no Legislativo da capital maranhense.
Permacultural (Rede) – Duas mulheres e dois homens apresentam visão holística para mudar Alto Paraíso (GO). Ligado à luta ambiental, o grupo se inspira nos preceitos da permacultura – forma sistêmica de pensar e conceber princípios ecológicos que podem ser usados para projetar, criar, gerir e melhorar todos os esforços no sentido de um futuro sustentável.
Teremos Vez (PT) – Coletivo com cinco mulheres negras e periféricas de Viamão (RS), que lutará por inclusão e igualdade na câmara da cidade na região metropolitana de Porto Alegre.