Aviso aos navegantes: a campanha presidencial de 2014 chegou àquele estágio no qual os candidatos dispensam enfeites. Esqueçam os cenários de novela, as fantasias, frases de efeito. O equilíbrio entre as candidaturas de Dilma Rousseff e Aécio Neves se encontra no mundo pós-publicidade. A disputa entre eles já não cabe no marketing, dispensa truques excessivos e armações muito sotisticadas. O eleitor indeciso, aquele porção em torno de 12% dos votos disponíveis, a quem o destino do país entregou os destinos da eleição, não quer muitas abstrações nem questões imaginativas. Quer saber como eles são, como pensam, como reagem, como se comportam. Os métodos convencionais de convencimento já não funcionam pela lógica tradicional dos confrontos de ideias e nem sempre aquilo que se vê é aquilo que mais importa.
Aécio Neves e seus aliados sairam felizes do debate do SBT. A equipe de Dilma Rousseff também, ainda que isso pareça fora do senso comum.
Enquanto Aécio acredita que pode ser recompensado pela agressividade, pelo fustigamento permanente da adversária, o publicitário João Santana saiu do encontro convencido de que o concorrente do PSDB passou da conta. A prova é que deixou indignado um grupo de senhoras de classes C e D que assistiram ao encontro num grupo de pesquisa qualitativa formado pelo PT. Elas consideraram que o candidato do PSDB foi duro demais com uma adversária que também é uma senhora de 67 anos. Um efeito semelhante, acredita-se, foi obtido com a lembrança de que certa vez Aécio Neves recusou-se a fazer o teste do bafômetro — atitude que causou forte impressão num segundo grupo de qualitativa, agora em versão masculina.
A revelação de que um irmão de Dilma foi empregado na prefeitura de Belo Horizonte, durante a gestão de Fernando Pimentel, não fez bem para a candidata do PT. A revelação de que Sérgio Guerra, então presidente do PSDB, recebeu propinas de Paulo Roberto Costa, o corrupto que se tornou delator premiado, não ajuda Aécio, que fez da Petrobras sua prioridade eleitoral.
A pergunta a ser respondida pelas pesquisas dos próximos dias é saber se o debate do SBT interrompeu o processo de crescimento de Dilma, que estava nítido até ali, num evento que analistas e militantes atribuem ao desempenho da candidata do PT no primeiro debate do segundo turno, na Band. Se em seu ultimo levantamento Ibope e DataFolha anunciaram que os dois se encontravam em empate técnico, com Aécio numa vantagem na margem de erro dois pontos, também se registrou um aumento da rejeição ao candidato tucano em todas as regiões do país.
Antes do debate de ontem, as pesquisas traking da equipe de Dilma diziam que ela estava na frente, por 52,2% contra 47,8%. Outros sinais iam na mesma direção. As visitas ao site da própria candidata tem crescido perto de 13% ao dia. Até a tarde de ontem, o vídeo de apoio gravado por Chico Buarque já tivera 43 000 compartilhamentos e fora visto por 4,3 milhões de pessoas. Em São Paulo, onde os petistas travam sua luta mais difícil, as mobilizações de rua animaram o último fim de semana, reunindo militantes do PT, simpatizantes de Dilma e adversários de Aécio em geral. Perto de 1500 pessoas se reuniram no Largo do Arouche. O Sindicato dos Engenheiros ficou lotado, enquanto, na Praça Roosevelt, ocorria um Churrasco dos Desinformados, numa referência irônica a mais recente frase de Fernando Henrique Cardoso sobre os eleitores de Dilma. Dias antes, na quadra do Sindicato dos Bancários, Luiz Inácio Lula da Silva fez um comício para 5 000 pessoas. Em Brasília, onde o candidato do PT não chegou ao segundo turno — como em São Paulo — há mais bandeiras de Dilma nos automoveis. Petistas pedem votos nos pontos de concentração do comércio.
Os estudiosos entendem que a mercadoria mais valiosa, no estágio atual da campanha, são denuncias novas. Aquilo que o eleitor indeciso conhece já foi contabilizado e esgotou sua capacidade de produzir mudanças. Mas aquilo que ele não sabia pode interferir em seu julgamento. Ao responder a cada acusação com a palavra “mentira” Aécio convence aqueles que julgam que sempre diz a verdade — mas nada diz para quem, justamente porque seu nome é indeciso, encontra-se em dúvida. Quando evita dizer quanto as emissoras de rádio de sua família embolsaram em publicidade oficial, durante os oito anos de seu governo, o candidato do PSDB permite ao leitor imaginar que os anúncios geraram uma soma considerável
O ponto politicamente mais relevante do debate de ontem envolveu a última questão, uma resposta de Dilma ao questionamento de Aécio sobre uma intervenção num debate anterior. A candidata do PT disse, na ocasião, que ninguém está acima da corrupção. O candidato do PSDB — com seu permanente sorriso de malícia nos lábios — queria saber se Dilma pretendia pedir desculpas pelo que dissera, insinuando que a presidente poderia ter feito uma espécie de confissão. Ouviu uma aula de ética política e democracia. Dilma esclareceu que ninguém está acima da lei e que pessoa nenhuma — nem ela, nem seu adversário, nem ninguém — está livre do risco de enfrentar casos de corrupção, devendo-se obrigar a manter uma postura de vigilância e cuidado permanente para dar combate, investigar e punir responsabilidades.
Uma afirmação bastante apropriada numa noite em que se revelou que o PSDB também recebeu recursos no esquema de Paulo Roberto Costa, não é mesmo?