Por José Bulcão
“Eu estava evitando escrever sobre essa celeuma PT versus PSOL em São Paulo, mas mudei de ideia. Vejo muita gente defender a ideia de apoio incondicional do PT à candidatura Boulos/Erundina por pragmatismo. Alegam que Tatto não decola e que o apoio do PT seria fundamental para ajudar Boulos a ir para o segundo turno.
Como o PT mantém sua candidatura própria, recebe todo o tipo de ataques da militância facebookiana do PSOL, reforçados pelos oportunistas de plantão, começando com a velha história de que o PT é “goela larga”, que quer ser hegemônico dentro da esquerda, que é impositivo, etc, etc. A mesma ladainha chata de sempre e que ouvimos dia sim, outro também.
O que me causa estranheza é que, falando do Rio, não vejo essa mesma militância exigir de sua candidata Renata Souza, com apenas 3% de intenção de votos, a transferência de seus votos para Benedita que tem 8% e que precisa também de todo apoio para ter chances de bater Marta Rocha e chegar ao segundo turno, caso a candidatura de Crivella seja impugnada ou sofra um revés que a faça perder força.
Lembremos que o Rio de Janeiro é o território fértil onde a escória miliciana bolsonarista age livremente e de braços dados com a corja de vendilhões do templo que andam com a bíblia numa mão e a maquininha de cartão na outra.
O Rio é a segunda megalópole brasileira, mas está a tal ponto imprensada entre o poder das milícias, o poder do tráfico e o poder crivelino, que abençoa os dois primeiros, que é tão ou mais importante garantirmos uma vitória do campo da esquerda aqui quanto é em São Paulo e várias outras capitais e municípios estratégicos.
Lembro também que foi no Rio que o PT, junto com o PCdoB, fechou questão e apresentou apoio incondicional, de primeira hora, sem exigir contrapartidas, à pré-candidatura de Marcelo Freixo (o mesmo que no auge do golpe se recusou a subir no palanque com Lula). Em uma manobra até hoje inexplicável e publicamente mal-explicada, Freixo simplesmente retirou sua pré-candidatura e deixou o Rio nessa difícil situação.
Ninguém do PT, pelo menos nenhuma liderança de peso e nem ninguém da militância saiu por aí fazendo acusações sobre irresponsabilidade de Marcelo Freixo ou apontando o dedo para o PSOL para reclamar de intransigência por manter no páreo Renata Souza, uma candidata sem a menor chance, mas que disputa um espaço importante com Benedita.
Simpatizo bastante com a dupla Boulos/Erundina, certamente até mais que com Jilmar Tatto, cuja trajetória política eu pouco conheço, mesmo sendo do PT. Também não tenho nenhuma antipatia por Renata Souza no Rio, muito pelo contrário! Mas o ponto é que política não é um jogo de preferências pessoais.
Política é um jogo de estratégia, uma espécie de jogo de xadrez em que o cenário muda a cada jogada. Nem toda a jogada nesse tabuleiro resulta em acerto e nem toda jogada aparentemente pouco inteligente, assim de imediato, significa um erro estratégico.
Política é também trabalho, construção. Quem sabe fazer bem a anti-política, de destruição, traição e utilitarismo, é a direita. Se a militância do PSOL quer ter sucesso, então que siga o exemplo do que fez o PT desde 1980 e construa representatividade com seu projeto.
Eu torço para que, mesmo que haja divergências, possamos estar juntos nas lutas mais importantes e nos encontrarmos na plenitude de um projeto de país com justiça social, sem essa desigualdade gritante, onde haja espaço para o trabalho, a criatividade, o gozo e o bem-viver de todos.
No mais, pode ser que erros estejam sendo cometidos, certamente estão e de todas as partes, entenda-se partes como todos partidos políticos.
Voltanto à analogia com o jogo de xadrez, esse tabuleiro vai se reconfigurando a cada jogada, em cada município, a cada dia e cada vez mais freneticamente com a aproximação da data do pleito.
No entanto, uma coisa é certa. Assim como no xadrez, quem determina a próxima jogada não é o próximo jogador, mas sim a jogada já feita pelo adversário.
Portanto, gente querida, vamos ficar de olho em nossos verdadeiros inimigos.”