Cinema de portas fechadas testemunha repressão de Milei aos aposentados

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Congresso manteve veto à lei com aumento de 8,1%  às aposentadorias. Manifestantes foram reprimidos com gás pimenta e balas de borracha.

Por Maíra Vasconcelos, compartilhado de Jornal GGN




Às 14 horas, interromperam as sessões dos filmes em cartaz e baixaram as portas de aço. Depois, entraria ali apenas o gás pimenta da operação policial. Com as portas fechadas, do lado de dentro do Cine Gaumont, na Avenida Rivadavia, localizado nos arredores do Congresso, o trabalhador da segurança Leonardo Lorenzo Abal, junto com todos os demais funcionários do cinema, testemunhou e filmou a repressão sofrida pelos manifestantes que protestavam em frente ao parlamento. Na última quarta-feira, 12, a maioria dos deputados do recinto manteve o veto do presidente Javier Milei à lei que previa aumento de 8,1% na aposentadoria. Ao todo, 87 deputados apoiaram a posição do governo. A decisão presidencial foi mantida, pois não atingiu os dois terços necessários para ser rejeitada.

“Foi um momento de muito nervosismo, mas graças ao trabalho da equipe de segurança e de todos os funcionários, não tivemos nenhum incidente dentro do cinema, apenas entrou um pouco de gás” contou Abal, no dia seguinte à aprovação do veto presidencial, quando a reportagem do Jornal GGN voltou ao cinema em busca de imagens e vídeos que os próprios funcionários pudessem ter feito durante os protestos. Participaram das manifestações os movimentos sociais, partidos de esquerda, alguns sindicatos e sociedade civil autoconvocada.

Até a decisão final de ser mantido o veto presidencial sobre os aumentos da aposentadoria, foram vários os dias em que grupos de aposentados foram protestar em frente ao Congresso. Quando também foram reprimidos e entraram em confronto com a polícia. Os preços dos medicamentos mais usados pelos aposentados aumentaram 166%, desde que Milei venceu as eleições em novembro passado, mais de 20 pontos acima da inflação.

“Acho injusto vetar o aumento aos aposentados. Acho que o governo nacional não leva em consideração os mais vulneráveis, eles só olham se o Excel está bom ou não, na hora de analisar o déficit fiscal. No final das contas, nós todos somos a casta e eles estão ajustando é a gente”, disse Abal, que trabalha como segurança no Cine Gaumont, desde abril deste ano. A depender da magnitude da convocatória das manifestações, por medida de segurança e segundo o protocolo, o cinema permanece fechado durante quase toda a jornada.  

A política de repressão do governo Milei foi posta em prática, mais uma vez, em uma operação policial desmedida, comandada pela ministra de Segurança Patricia Bullrich. A Polícia Federal Argentina chegou a jogar spray de pimenta em uma menina de 10 anos. Apesar da evidência das imagens, que circularam em vários meios da imprensa local, a ministra negou o acontecido.

Em pouco mais de seis meses de governo de ultradireita, a repressão policial tem sido regra para conter manifestações, política que também faz parte da batalha cultural encampada pelo novo governo. Reprimir para disciplinar movimentos sociais, sindicatos e uma sociedade caracterizada pela ocupação das ruas como forma de luta pelos direitos sociais.  

Milei defende e mantém a política de  ajuste fiscal, a maior da história do país, em prol do superávit fiscal. O ajuste de 5,4 pontos do Produto Interno Bruto (PIB) nos gastos públicos está representado, principalmente, no corte das pensões, subsídios das tarifas de transporte público e transferência de verba para as províncias.

O Cine Gaumont – Espaço INCAA e a motosserra de Milei

O Cine Gaumont é gerenciado, desde 2003, pelo Instituto Nacional de Cine e Artes Audiovisuais (INCAA), um organismo do Estado. O INCAA é uma das empresas estatais que foi retirada da lista de privatizações da chamada “Lei de Bases”, principal megaprojeto do governo Milei, aprovado em junho deste, após várias modificações e retirada de inúmeros artigos. No entanto, o INCAA não deixou de sofrer com o corte de pessoal. Após a chamada reestruturação, anunciada pelo governo de Javier Milei e divulgada no Boletim Oficial, foram extintas várias áreas de gerência.

Maíra Vasconcelos é jornalista e escritora, de Belo Horizonte, e mora em Buenos Aires. Escreve sobre política e economia, principalmente sobre a Argentina, no Jornal GGN, desde 2014. Cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina (Paraguai, Chile, Venezuela, Uruguai). Escreve crônicas para o GGN, desde 2014. Tem publicado um livro de poemas, “Um quarto que fala” (Urutau, 2018) e também a plaquete, “O livro dos outros – poemas dedicados à leitura” (Oficios Terrestres, 2021).

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