Mais de cinco milhões de moradores do Rio foram afetados, de um jeito ou de outro, por eventos climáticos nos últimos dez anos
Por Edu Carvalho, compartilhado de Projeto Colabora
Na foto: Deslizamento de terra em Nova Friburgo
Experimente pegar o trem ou o metrô, subindo o Rio. Se não conseguir, tome um ônibus e você verá que o vale que corre para o Centro desce lá do Noroeste, passa pelo Norte, escorre pela Baixada e chega às regiões metropolitanas 1 e 2, onde coexistem a grande massa que fazem a cidade – e o Estado – ser uma das molas propulsoras do país. Nas rebarbas, ainda teremos a região Sul e Serrana, que desembocam na Baía da Ilha Grande.
Na viagem, você vai se deparar com os desafios de uma megalópole que, ao mesmo tempo, engrandecem e punem a população com o vazio das ações públicas nas mais diversas vertentes. Da saúde à educação, passando pela renda, com atravessamentos que percorrem a via que dá vida, a saúde; e mais: na área de justiça climática, onde o Rio finca seus dois pés quando o assunto é omissão e falta de planejamento para prevenir o que pode ser prevenido.
Vejamos: mais de 5 milhões de moradores do Rio de Janeiro, o estado responsável por ⅔ das mortes por desastres ambientais do país, foram afetados por eventos climáticos decorrentes das fortes chuvas nos últimos dez anos. O problema é geral e, também, regional: a Baixada Fluminense é uma das áreas com mais vítimas: 53% das moradias danificadas ou destruídas, de 2013 a 2022, estavam em municípios da região. Quem organiza estes dados da Defesa Civil é a Casa Fluminense — entidade que há 10 anos promove um debate honesto e sincero sobre políticas que visam a reduzir as desigualdades no Rio — e que em seu mais novo evento, o “Fórum Rio 2023: Clima é coisa séria!’’, enfatizaram a urgência da questão climática/ambiental como algo de importância, sobretudo, nas periferias.
Objeto de cauda longa, a organização lançou conjuntamente o “Guia Para Justiça Climática’’, com objetivo de tornar as boas experiências (feitas por fluminenses comuns), algo sistematizado como método, em que soluções e tecnologias sociais e também ancestrais ajudaram a salvar bairros e favelas espalhadas pelo estado.
Para a elaboração do guia, a Casa Fluminense rodou por 22 municípios do Rio de Janeiro, onde reuniram 15 tecnologias calcadas em um princípio básico: a sobrevivência ao racismo ambiental que amplia o desastre com as chuvas, aumenta o calor, multiplica a poluição e, também, aspectos como a fome. “As tecnologias ancestrais e sociais que identificamos no processo de construção do Guia são fruto de uma resposta à ausência do poder público nos territórios da RMRJ. Esses projetos apresentam exemplos de resiliência, adaptação e mitigação das condições adversas provocadas pelas injustiças climáticas presentes no cotidiano de muitas pessoas. Essas iniciativas são excelentes exemplos de tecnologias que se tivesse algum tipo de incentivo ou investimento público poderiam não só melhorar as condições ambientais, mas também gerar emprego e fomentar a produção tecnológica no setor energético, por exemplo’’, explicita Claudia Cruz, coordenadora de informação da Casa Fluminense.
Ao todo, mais de 400 km foram percorridos para encontrar onde a ação da sociedade civil tem atuado de maneira mais eficiente. E não porque apenas pode, mas porque precisa.
Como os projetos Teto Verde, que cria telhados verdes para reduzir o calor nas casas; o Revolusolar, que instalou painéis solares na comunidade, possibilitando a diversas famílias gerar sua própria energia, além de profissionalizar a população nesse ramo; e o Instituto EAE, que realiza uma série de plantios de vegetação nativa de Mata Atlântica numa área de preservação ambiental afetada por queimadas.
A publicação surge em caráter de alerta elevado à enésima potência, em uma atitude que requer mobilização e engajamento dos atores políticos, bem como daqueles que não são afetados – diretamente – por estas faltas. ‘’Acreditamos que haverá uma ampliação da rede de pessoas engajadas nos diferentes territórios visitados, ampliando o enfrentamento ao racismo ambiental. Com isso, teremos mais pessoas engajadas e informadas sobre como cobrar respostas do poder público, participando ativamente do acompanhamento das políticas públicas vigentes e da elaboração de novas políticas públicas que respondam às demandas represadas’’.
A lista de afazeres é grande e o tempo, curto. É preciso reparar e dar suporte para aqueles que já estão fazendo, na criação de dispositivos que, se não forem colocados em vias de ação pública, necessitam de aporte financeiro para a continuidade desses trabalhos.
Será preciso arregaçar as mangas logo para termos um projeto de um estado possível. E para todos. E por quê? Como diria meu amigo André Urani, “é o Rio, ora bolas!”.