Cobranças e protesto contra o governo Bolsonaro na COP25

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Ministro do Meio Ambiente faz aparição em reunião com ambientalistas, parlamentares e indígenas. Assassinato de líderes da etnia guajajara é denunciado em Madri

(Madri, ES) – Se, para alguns, foi um sinal de abertura de diálogo; para outros, a participação relâmpago do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, num encontro com ambientalistas, parlamentares, representantes do setor privado e indígenas na Conferência do Clima, a COP25, foi mais do mesmo. Ele ficou menos de 15 minutos, falou pouco e, praticamente, não ouviu ninguém. Alegando compromissos de agenda, retirou-se antes de ouvir as críticas das ex-ministras da pasta Marina Silva e Izabella Teixeira, e não ficou para levar o puxão de orelhas do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, que mandou recado, lembrando ao governo o compromisso do país com o Acordo de Paris. E o pior, Salles se recusou a dar as mãos quando o coordenador da ONG Saúde e Alegria, Caetano Scannavino, pediu um minuto de silêncio em homenagem aos indígenas cruelmente assassinados da etnia guajajara. Hoje, terça 10, está prevista uma nova fala do ministro, só que, desta vez, no segmento de alto nível da COP25. É que, a partir desta semana, a conferência entra em uma nova fase, mas, como ocorre todos os anos, os principais entraves da negociação ainda não foram resolvidos.




E assim começou o dia do governo brasileiro na segunda semana da Conferência do Clima, a COP25, que vai até sexta 13, em Madri. E terminou com o governo Bolsonaro sendo alvo de protestos em praça pública contra, justamente, o assassinato dos guajajaras no último final de semana, no Maranhão. Cerca de 20 indígenas participaram da manifestação. Por representar 5% da população mundial, mas ser responsável pela proteção de 82% da biodiversidade do planeta, a líder indígena Sônia Guajajara denunciou que “Bolsonaro não é apenas uma ameaça para o Brasil, mas também para o planeta”. Conclamando a todos para aderir ao movimento Dezembro Vermelho – um série de atividades da campanha “Sangue Indígenas, nenhuma gota a mais”, que teve início com o Janeiro Vermelho –, Sônia instou os consumidores europeus, americanos e asiáticos a boicotar produtos brasileiros “regados com sangue indígena”.

Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na COP25. Foto de divulgação
Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na COP25, em reunião com ambientalistas, parlamentares, ONGs e indígenas. Foto de divulgação

No pouco tempo em que Salles ficou no encontro, o ministro não se referiu aos assassinatos de indígenas, não pediu desculpas às ONGs pelo cerco de que estão sendo vítimas no atual governo e nem se mostrou indignado com os ataques sofridos pela ONG Saúde e Alegria, acusada de incentivar incêndios em Alter do Chão. Disse que é preciso “achar pontos de convergências para avançar” na luta pela preservação da floresta, mas não ficou para ouvir as propostas. Defendeu a “monetização dos recursos ambientais” e reafirmou que veio à COP25 pedir dinheiro: “Temos que conseguir achar uma forma para que os maiores emissores de gases-estufa se responsabilizem pelo que produziram, pelas florestas que suprimiram, pelos combustíveis fósseis que queimaram”.

Para a ex-ministra Izabella Teixeira, “a COP25 não é lugar de barganha e nem de bravatas”. Ela criticou o governo por não implementar o Código Florestal e não cumprir o compromisso assumido com o Acordo de Paris. Marina Silva disse que “é a primeira vez que um governo nomeia um anti-ambientalista para a pasta do Meio Ambiente”. E disse que o país, mesmo que consiga zerar o  desmatamento na Amazônia, não cumprirá a meta de redução do desmatamento estipulada pelo Congresso em 2010 – a proposta era chegar até 2020 com o desmatamento para menos de 3,9 mil km2.

É a primeira vez que um governo nomeia um antiambientalista para a pasta do Meio Ambiente

Marina Silva
ex-ministra do Meio Ambiente

Para o coordenador de políticas públicas do Greenpeace, Marcio Astrini, o lado bom da reunião com o ministro foi o compromisso assumido por Alcolumbre. Apesar dos inúmeros retrocessos na área ambiental, mas os maiores deles dependem da aprovação do Congresso Nacional. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já avisou que não colocará em votação nenhum projeto que venha piorar o quadro ambiental para além do já está, mas é a primeira vez que o presidente do Senado toma partido e entra na trincheira contra o governo na área ambiental. A seu ver, essa posição do senador Alcolumbre é extremamente importante: “Congresso vai fazer, na prática, o que o governo não faz, ou seja, colocar um pouco de razoabilidade à mesa”.

Congresso vai fazer, na prática, o que o governo não faz, ou seja, colocar um pouco de razoabilidade à mesa

Márcio Astrini
coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace

Enquanto o governo brasileiro vai perdendo protagonismo e liderança na COP25, o setor privado não tem mais dúvidas de que um dos principais vetores de riscos e oportunidades para os negócios é justamente a emergência climática. Essa é a conclusão que o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds) chegou na pesquisa “Como as empresas vêm contribuindo para o Acordo de Paris”, que será lançado na COP25. Nos últimos 4 anos, empresas com operações no Brasil tiveram uma redução de emissões equivalente a 29,3% do objetivo climático brasileiro para 2025 junto ao Acordo de Paris.

Feito em parceria com o WWF-Brasil e CDP (Carbon Disclosure Program) América Latina, a pesquisa ouviu 61 empresas brasileiras e multinacionais com operações no país, que, juntas, respondem por  90% do capital comercializado em bolsa de valor no Brasil. Em 2018, esse conjunto de empresas reportou oportunidades que a mudança do clima gera que gera impactos financeiros positivos de US$ 123,7 bilhões, com um investimento necessário para materializá-las de US$ 17,5 bilhões. Enquanto os riscos apresentaram impactos negativos de US$ 45 bilhões.

“Ou seja, há uma justificativa empresarial clara para investimento em soluções que contribuam
para a descarbonização da economia”, comentou Marina Grossi, presidente do CEBDS. Em 2018, as empresas investiram US$ 7,7 bilhões em projetos de pesquisa e desenvolvimento de soluções em baixo carbono.  “O estudo mostra também um entendimento crescente das empresas de que a crise climática ameaça a estabilidade financeira dos negócios”, comentou Alexandre Prado, diretor de Economia Verde do WWF-Brasil.

O mesmo caminho vem sendo trilhado por um grupo de 631 investidores internacionais, que, juntos, administram um montante de US$ 37 trilhões. Ao assinarem a Declaração de Investidores Globais aos Governos sobre Mudança Climática, esses investidores se comprometeram alcançar os objetivos do Acordo de Paris. O grupo pede aos governos a eliminação gradual das térmicas a carvão, a precificação das emissões de carbono, o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis e atualização das contribuições nacionalmente determinadas (NDC, na sigla em inglês) para cumprir as metas do Acordo de Paris.

*A repórter viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade (ICS)

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