Com IDH verde, Brasil melhora posição no ranking de desenvolvimento

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Por Liana Melo, compartilhado de Projeto Colabora – 

PNUD ajusta o IDH, acrescentando a pegada ecológica, mas Bolsonaro coloca em risco posição conquistada com vantagem ambiental brasileira

Fogo e desmatamento na Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará: Brasil tem posição melhor em ranking de IDH que considera pegada ambiental (Foto: Marizilda Cruppe/Amazônia Real/Amazon Watch – 17/09/2020)

E se o Brasil fosse analisado pela ótica dos seus recursos naturais? Dono da maior floresta tropical do mundo, o país, que ocupa um lugar vergonhoso no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas, ganharia na comparação. A análise promoveria uma dança das cadeiras que deixaria os países desenvolvidos envergonhados. Ou melhor, “seria o vexame dos países ricos”, como escreveu o economista Pedro Fernando Nery.




Ao promover um ajuste no IDH, incluindo o que chamou de “pressão planetária”, o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD, na sigla em inglês) fez o Brasil avançar dez casas no ranking do IDH-P: o Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado às Pressões Planetárias. No IDH verde, o Brasil saiu da 84ª posição para o 74º lugar. Alguns vizinhos da região avançaram ainda mais: Chile subiu 14 posições; Argentina, 20, e Peru, 28.

Ainda experimental, o IDH-P é, segundo explicação do PNUD, “o desenvolvimento humano ajustado pelas emissões de dióxido de carbono por pessoa e pegada ambiental per capita para compensar a pressão excessiva no planeta”. É um “incentivo à transformação”, como defende a instituição. “Este é, muito provavelmente, o primeiro de outros índices que podem surgir como o objetivo de medir a pressão das atividades humanas sobre o planeta”, comenta Betina Barbosa, coordenadora da Unidade de Desenvolvimento Humano do PNUD.

De acordo com o documento, nenhum país alcançou ainda um desenvolvimento humano muito alto sem colocar imensa pressão sobre o planeta. A expectativa é que a atual seja a primeira geração a corrigir esse erro na que é considerada “a próxima fronteira para o desenvolvimento humano”. O relatório argumenta que à medida que as pessoas e o planeta entram numa época geológica totalmente nova, o Antropoceno ou Idade dos Seres Humanos, é momento de todos os países redesenharem os caminhos para o progresso.

Apesar de o Brasil ter melhorado sua posição no ranking do IDH-P, o país ainda está muito mal na foto. Na nova métrica, o índice do Brasil cai de 0,765 para 0,710. Este número, entretanto, leva o país a subir 10 posições no ranking – países com mais emissões de dióxido de carbono e a pegada ambiental mais crítica tiveram queda maior.

O IDH-P é o IDH de cada país corrigido pelas pressões planetárias, estimadas como uma média aritmética das emissões de dióxido de carbono per capita e da pegada ecológica das matérias (biomassa, metais, carbono etc.) usadas nos processos produtivos. Mostra a pressão na biosfera resultante das atividades econômicas, como uso da terra, perda da integridade dos ecossistemas, composição de fontes de energia. Por isso, apesar de subir no ranking, o IDH verde brasileiro é menor que o IDH.

Se as emissões aumentarem, pressionando o planeta, a lógica do IDHP é de redução. Então podemos dizer que o resultado do novo índice do Brasil é melhor do que o do IDH, mas a tendência não é boa não

Pedro Fernando Nery
economista

Do ponto de vista ambiental, corremos o risco de perder a corrida e começar a cair também neste ranking – no último IDH tradicional, o Brasil caiu de 79º para 84º lugar. Na Cúpula do Clima, quando Bolsonaro fez um discurso recheado de promessas, ficou evidente que o país corre o risco de perder a vantagem captada pelo IDH-P. Sem mostrar compromisso e nem apresentar metas, o Brasil continua com alto passivo ambiental expresso nas taxas de desmatamento da Amazônia. O “avanço” do Brasil no IDHP, complementa Nery, está relacionado ao histórico do país e não a gestão atual. “Se as emissões aumentarem, pressionando o planeta, a lógica do IDHP é de redução. Então podemos dizer que o resultado do novo índice do Brasil é melhor do que o do IDH, mas a tendência não é boa não”.

O desenvolvimento humano ajustado pelas emissões de dióxido de carbono por pessoa e pegada ambiental per capita para compensar a pressão excessiva no planeta é um ‘incentivo à transformação’

É fato que a pandemia colocou em xeque diferentes dimensões do desenvolvimento humano mundo afora. A renda foi atingida em cheio, sofrendo uma retração econômica global que fora vivenciada nos anos 1930, durante a Grande Depressão. A saúde expôs o flagelo da desigualdade. O Brasil atingiu a marca de  400 mil mortos no final de abril, um ano e um mês depois de a pandemia ter sido decretada. A educação empurrou 24 milhões de crianças e adolescente para fora das escolas. A covid-19 desencadeou uma crise tripla: sanitária, social e econômica.

Pode parecer pouco, mas o acréscimo do P no IDH não representa apenas uma mudança apenas cosmética. Ela retrata a necessidade de olhar os países sob a ótica da emergência climática, o impacto ambiental em cada sociedade e a pressão sobre os recursos naturais.

A Noruega, exemplo de qualidade de vida no IDH ao unir renda, educação e saúde, despenca no novo índice, protagonizando uma queda livre de 15 posições. Saiu do 1º para o 16º lugar. Maior produtor de petróleo da Europa Ocidental, o combustível fóssil é o principal responsável por manchar a pontuação da Noruega no IDH verde.

Os Estados Unidos ficaram numa posição ainda mais vexaminosa: o país despencou 45 posições no IDHP, saindo do 17º lugar no IDH para 62º quando o país é analisado sob a ótica da pressão planetária. O fato de os EUA serem, depois da China, os maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta, ajudou a derrubar a posição do país na reclassificação.

Pelo IDH-P, mais de 50 países sairiam do grupo de desenvolvimento humano muito alto, refletindo sua dependência de combustíveis fósseis e sua pegada ambiental – o IDH considera muito alto a partir de 0,8. Com esses ajustes, países como Costa Rica, Moldávia e Panamá sobem em pelo menos 30 lugares no ranking, reconhecendo que é possível uma pressão mais leve sobre o planeta.

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