De acordo com Carla Beni, “subir a Selic não faz chover e subir a Selic não apaga incêndio”
“Eu sempre repito essa frase e vou repetir: ‘Subir a Selic não faz chover e subir a Selic não apaga incêndio’”, afirma Carla Beni Menezes de Aguiar, em um vídeo promocional do portal ICL Notícias. Ela é economista e professora FGV (Fundação Getúlio Vargas), além de comentarista Econômica e conselheira do CORECON-SP (Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo).
Nessa “métrica”, existem “dois dados importantes”, prossegue: “O IPCA [Índice de preços ao consumidor] do ano passado fechou em 4,83%“, enquanto “a inflação de alimentos fechou em 8,23%“. Isso fez com que os alimentos ficassem “mais caros que roupa, que sapato, que tudo na média”.
Carla Beni cita um trabalho realizado pela Unesp (Universidade Estadual Paulista), apontando que desde 2007 está ocorrendo a “internacionalização da nossa pauta da agricultura“.
“Isso está provocando uma inflação aqui dentro”, diz. “Quando você pega os dados do ano passado, você vai ver aqui um dado bem interessante: 89% do aumento dos preços da alimentação no domicílio foram em três grupos: primeiro, carnes bovinas; depois, bebidas e infusões, incluindo o café, que é o que a gente está escutando o tempo todo; e leite derivados“.
“Ou seja, quando a gente tem uma estrutura direcionada para exportação, a gente acaba tendo um efeito colateral aqui dentro, inclusive a área nossa plantada para arroz e feijão, que é aquilo que a gente consome no dia a dia, tem se reduzido“, afirma a professora da FGV, destacando, em seguida, a necessidade de repensar várias questões.
Assista e leia mais a seguir:
Carla Beni: Agro voltado para exportação provoca inflação de alimentos para o brasileiro desde 2007
— ICL Notícias (@ICLNoticias) March 17, 2025
Com Deborah Magagna (@demagagna_)
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O professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp, campus de Jaboticabal, engenheiro agrônomo e economista José Giacomo Baccarin, está à frente de um projeto de pesquisa que acompanha os impactos da internacionalização da agricultura brasileira sobre os preços dos alimentos ao consumidor.
Em entrevista ao Jornal da Unesp, em janeiro, ele chama a atenção para o fato de que muitos dos alimentos que mais experimentaram a subida de preços estão entre os principais destaques na pauta de exportação do Brasil, como o café e a carne bovina.
A inflação alimentar de 2024, destacada no debate público em 2025, atingiu 7,69%, contra 4,83% do IPCA, com alimentos consumidos em domicílio subindo 8,2%. Especialistas atribuíram o aumento a eventos climáticos, mas José Baccarin contesta essa visão, apontando fatores estruturais como causas principais, que são as exportações e o câmbio. Produtos exportados, como carne bovina, café e lácteos, tiveram preços elevados internacionalmente, refletidos no mercado interno.
A desvalorização do Real (27% em 2024) ampliou o impacto, especialmente no final do ano. Carnes, responsáveis por 63% da inflação alimentar, subiram 23% entre setembro e outubro.
Outro problema para a inflação dos alimentos é a dinâmica global. A alta internacional de commodities, como o café e a carne, e importações caras, como o leite, pressionaram os preços, sem relação direta com a produção nacional.
Baccarin destaca que produtos não exportados, como o feijão, a mandioca e o tomate, não sofreram alta significativa, indicando que problemas climáticos não foram determinantes. Por exemplo, o arroz, apesar das enchentes no Rio Grande do Sul, subiu apenas 8,2%.
A reação do governo sobre o tema foi tardia e provocou um “estresse exagerado” diante de um problema concentrado em poucos itens, diz Baccarin, sugerindo diálogo com frigoríficos e monitoramento cambial para evitar especulação. Como medidas estruturais, o economista cita o incentivo à produção de alimentos não exportados, como feijão, arroz e mandioca, por meio da agricultura familiar, estoques reguladores e política cambial mais controlada.
Impacto social
A inflação alimentar afeta desproporcionalmente os mais pobres, que gastam até 40% da renda com comida. Enquanto a agricultura prospera, a insegurança alimentar persiste, evidenciando a contradição entre sucesso agroexportador e acesso interno, destaca Baccarin, concluindo que a solução requer equilibrar mercado internacional e abastecimento interno, com políticas que priorizem a segurança alimentar e reduzam a volatilidade cambial.